O maior desafio de Frederico Varandas é não permitir que o Sporting regresse ao antigamente.

Ponto final, parágrafo.

O Sporting, recorde-se, foi durante muito tempo o único dos grandes que recebia as derrotas, e os maus resultados de uma forma geral, com tristeza. Alguma surpresa, e muita tristeza.

Provavelmente como consequência de anos a fio sem ganhar, numa espiral de deceções que foi crescendo com o tempo, o clube leonino habituou-se a deixar cair os ombros e a engolir em seco: as derrotas enchiam Alvalade de infelicidade, melancolia e desalento.

Bruno de Carvalho mudou um pouco isso.

Com mil defeitos, é verdade, o antigo presidente conseguiu pelo menos aquilo que é essencial num clube grande: que as derrotas não sejam recebidas com tristeza. Que sejam recebidas, sim, com revolta. É no fundo a diferença entre a surpresa e a incredulidade.

É certo que Bruno de Carvalho não o fez da maneira mais correta.

No fundo conseguiu que Alvalade aumentasse os padrões de exigência aproximando o Sporting da personalidade dos rivais: um clube que grita, que estrebucha, que suspeita, que ameaça, que odeia, que se vitimiza. Conseguiu-o tornando o Sporting, portanto, num clube menos sportinguista.

E esse foi o problema. O Sporting não precisa de deixar de ser ele próprio para vencer.

Não deve, aliás, deixar de ser ele próprio para fomentar uma cultura de vitória que lhe permita ficar mais perto do sucesso. No dia em que o fizer, perde a essência que o define como clube.

Nesta altura vale a pena sublinhar, como tanta gente o faz, que o futebol é muito mais que um jogo.

Os lançamentos longos, a basculação, o jogo entre linhas, as bolas paradas não são o que de facto prende um adepto a um clube. Esse laço é muito mais difícil de identificar, e por vezes de explicar.

Tem a ver com aspetos coletivos como ligações sociais, políticas ou regionais, e com aspetos individuais como a infância, a saudade ou a experiência pessoal. É algo, portanto, que está na nossa essência. No nosso ser mais profundo, na nossa forma de ver o mundo e de nos vermos no mundo.

Por isso é importante não se pisar a própria personalidade, não desrespeitar o carácter, não profanar o perfil. Porque isso significa mexer no que de mais sensível existe: na alma e no coração que um clube adquire enquanto fenómeno de massas. No furor, enfim, das pulsões inexplicáveis.

Frederico Varandas parece saber ter esse respeito pela natureza do que é o Sporting.

É importante que assim o seja. O Sporting não tem de ser um clube igual a todos os outros para ganhar. Tem, isso sim, de ganhar sendo um clube diferente de todos os outros.

Como é que isso se faz? Antes de mais criando uma cultura de exigência.

Alvalade não precisa de ficar surpreso com cada derrota: precisa de ficar incrédulo e revoltado. Os maus resultados devem ser uma coisa trágica.

Ruidosa. Aterradora.

Manter esta cultura de exigência e devolver o Sporting à sua individualidade é no fundo o grande desafio que se coloca a Frederico Varandas.

«Box-to-box» é um espaço de opinião da autoria de Sérgio Pereira, editor do Maisfutebol, que escreve aqui às terças-feiras de quinze em quinze dias