«A partir do momento em que deixamos de jogar, o nosso empresário borrifa-se para nós, ninguém se preocupa»

Jorge Cadete, atualmente com 45 anos, revelou a sua situação precária numa reportagem da SIC. O ex-avançado perdeu toda a fortuna acumulada ao longo da carreira e chegou ao ponto de requerer o Rendimento Social de Inserção, apoiando-se em 189 euros por mês.

Esta é a apenas mais uma história entre tantas outras, com responsabilidades divididas entre várias partes.

No caso de Cadete, entre o enorme aplauso pela confissão pública (ao contrário de vários jogadores da sua geração), não deixo de criticar a necessidade de recurso ao RSI e a constatação tardia que surge no topo deste artigo de opinião.

Infelizmente, qualquer jogador tem de perceber na altura certa que ninguém se vai preocupar consigo após o final da carreira (enfim, passa a ser como um de nós). Ou melhor, ninguém que tenha surgido na sua vida quando a riqueza proliferava. São raras as exceções.

Acima de tudo, o jogador deve ter respeito por si próprio e por quem o rodeia nos momentos críticos. Fazer as escolhas certas, pensando a médio ou longo prazo.

Fui conhecendo vários casos do género ao longo dos últimos anos. Em muitos deles, o divórcio é o primeiro passo para o vazio, a depressão e a falência. A culpa não morre solteira.

O homem centra a sua vida em três pontos: treino, descanso, jogo. Tudo o resto fica ao encargo da mulher, alguém que normalmente interrompe a sua carreira e passa a viver em função de outrem, dependendo financeiramente deste. Habituam-se, um e outro, ao luxo. Quando a carreira no futebol termina, chega o vazio e uma mudança abrupta na relação. O princípio do fim.

Entre os jogadores mais consagrados, o cenário de dependência não se esgota na cara-metade. São grupos, três, cinco ou sete pessoas a alimentar-se de uma fonte que vai secar.

Os reformados mais recentes do nosso futebol começam a ter consciência dessa realidade. Preparam-se para a mudança de vida e aceitam esse desígnio, embora nem sempre consigam encontrar forma de entrar no mundo de trabalho sem formação académica, perdida pelo caminho.

Aqueles que demonstram humildade e procuram emprego fora do futebol ficam geralmente limitados a funções comerciais, sem rendimento fixo. Outros recusam-se, agarram-se aos investimentos normalmente catastróficos feitos ao longo da carreira. Sobretudo, querem manter o status quo. A pose, o estilo. A ilusão. Para esses, a queda será ainda mais abrupta.

Esta é uma realidade que afeta todo o desporto. Em 2009, a Sports Illustrated escreveu que 78 por cento dos antigos jogadores na NFL chegam a situações de bancarrota ou stress financeiro dois anos após o final da carreira. Para 60 por cento dos ex-atletas da NBA, a falência chega ao fim de cinco anos.

Tudo muda num instante, nada é eterno. Convém ter isso em conta e arrepiar caminho. Como qualquer um de nós.