O bichinho do futebol está-lhe no sangue. Talvez herdado de um tio que jogou na II Liga, ao serviço do Trofense, e outro que também foi jogador, mas andou por um nível mais abaixo. Nenhum foi ponta-de-lança. O resto veio com naturalidade e um certo efeito bola-de-neve.

«Andei de bola na mão desde pequenino, sempre atrás dela. Jogava na rua, claro, toda a gente joga. Íamos para um rinque, num grupo de amigos. Na altura, eu dizia que era o Ronaldo, o Fenómeno. Mais tarde, passei a admirar o Ibra, quando passei a ser ponta-de-lança. Antes, era defesa-direito...»

O nosso entrevistado nem termina a fase. «Defesa-direito?», indagámos. «Sim, até aos 12 anos, fui lateral-direito, até partir a perna...» Cada tiro, cada melro. Uma perna partida aos 12 anos? «A dois dias da morte do Fehér, veja bem! Nunca mais me esqueço. Morreu a 26 de Janeiro, eu parti a perna a 24. Estive um ano sem jogar.»

Mas falemos de coisas bem melhores, como cantam os Rio Grande. «Há males que vêm por bem. O meu tio era treinador de guarda-redes, lá do Esposende, quando voltei, e estavam com falta de pontas-de-lança no plantel. Então, como me conhecia, disse-me que tinha qualidade para o lugar. Treinei e ele achou que eu estava bem ali», desvenda.

«Foi ai que comecei a minha carreira como avançado-centro. Logo no primeiro ano, estava o Esposende no Nacional de juvenis ou iniciados, não me lembro bem, e marquei oito dos 16 golos da equipa. Não foi mau...», prossegue, orgulho pelo calo que apanhou a jogar nos pelados, mesmo depois, quando foi para a Póvoa, ainda como júnior B:

«Ninguém passava no pelado do Varzim [faz cara séria]. Se perguntar a todos os que lá jogaram, como o Bruno Alves ou o Neto, eles sabem bem disso. Passaram por lá grandes jogadores. Hélder Postiga, o Salvador [Agra]... muitos.»

O Ibra de Penafiel

Pedrinho, outro dos bons «produtos» varzinistas, já tinha escrito no Maisfutebol sobre essa capacidade de gerar talentos do eixo Vila do Conde-Caxinas-Póvoa, temática também recentemente abordada por Luís Neto.

«Qual é o segredo? Penso que é a vontade que os jogadores têm, sobretudo os mais jovens. Ainda hoje eles fazem o mesmo que nós fazíamos. Lembro-me de sair da escola, às 16h30, e o treino era só às 19 horas. Eu, o Júlio [irmão de Bruno Alves], o Mário Cunha, o Salvador, íamos logo para o campo. Deixámos a bola guardada com o roupeiro, para termos uma de lado, e punhamo-nos a fazer remates e a jogar», explica.

«Quando era no sintético, então, fazíamos dois ou três quilómetros a pé e chegávamos uma hora e meia antes do treino. Curiosamente, há miúdos que ainda agora fazem o mesmo. Isso demonstra bem a vontade que eles têm de ser alguém», conta, orgulhoso da formação que teve:

«Sempre fui um jogador de muita garra e luta. Aprendi nas camadas jovens do Varzim, cuja imagem de marca, e do clube em geral, sempre foi a raça. Deixar tudo em campo. O que penso é que há muitos jogadores que querem estar onde estou e se eu não der tudo, eles passam-me à frente.»