A «World Cup Experts Network» reúne órgãos de comunicação social de vários pontos do planeta para lhe apresentar a melhor informação sobre as 32 seleções que vão disputar o Campeonato do Mundo. O Maisfutebol representa Portugal nesta iniciativa do prestigiado jornal Guardian. Leia os perfis completos das seleções que participarão no torneio:

Autores dos textos: Dmitry Girin, Artur Petrosyan e Anton Matveev
Parceiro oficial na Rússia: Sport-Express
Revisão: Pedro Calhau


O 4x3x3 tem sido a formação em que Fabio Capello tem disposto a sua equipa. Há três coisas que o italiano que ver na sua formação: disciplina, velocidade e movimento. Capello ensinou a equipa a aguentar, ensinou a equipa a defender. Os médios centro Igor Denisov, Denis Glushakov, Roman Shirokov e Viktor Fayzulin jogam um papel fundamental neste estilo de jogo. Eles fazem um jogo de pressão alta para que a equipa consiga recuperar a bola rapidamente. E Shirokov é especialista em criar superioridade numérica na área – uma das opções atacantes da Rússia.

Este estilo de jogo funciona muito bem contra grandes equipas como Portugal, com o 1-0 de Moscovo como melhor exemplo. Mas é muito exigente fisicamente e é muito difícil fazê-lo bem sem uma boa preparação. A Rússia teve problemas contra seleções como o Azerbaijão ou a Irlanda do Norte, que gostam de estacionar o autocarro na sua área. No Brasil, deve ter-se cuidado com a Argélia.

Capello tem um lote de jogadores intocáveis na seleção: o gurad-redes Igor Akinfeev, o par de centrais Sergey Ignashevich e Vasiliy Berezutski, o playmaker Shirokov, o extremo direito Aleksandr Samedov e o avançado Aleksandr Kokorin.



Denisov foi o principal médio defensivo na primeira metade da fase de qualificação, mas não esteve nos últimos jogos – Glushakov tornou-se a primeira escolha de Capello nessa posição. Mas, agora, o jogador do Spartak Moscovo está em baixo de forma, assim como o seu companheiro de equipa Dmitry Kombarov, que foi o principal defesa esquerdo na qualificação.

Kokorin jogou a maior parte da fase de apuramento como extremo esquerdo e Aleksandr Kerzhakov como avançado centro. Mas o ponta de lança do Zenit não foi tão bom na segunda parte da época (apenas nove jogos e dois golos depois da pausa de inverno). Por isso, é provável que Kokorin jogue o Mundial como o mais avançado, com Kerzhakov no banco. Nessa caso, Yuri Zhirkov, Aleksei Ionov e Oleg Shatov vão lutar pela posição de extremo esquerdo.

A fraqueza da seleção da Rússia está no centro da defesa. Ignashevich e Vasiliy Berezutski são mesmo bons jogadores. Sim, têm muita experiência e entendem-se muito bem. Mas Capello não tem mais opções para esta posição. Alexey berezutski não tem jogado muito nesta época, enquanto Vladimir Granat não tem experiência internacional. Se Ignashevich ou Vasiliy Berezutski se lesionarem ou ficarem castigados será um grande problema para a equipa.

Que jogador poderá surpreender no Mundial?

Aleksandr Samedov. O extremo direito de 29 anos trabalhou muito nos últimos anos e evoluiu muito. Fez uma época muito boa pelo Lokomotiv Moscovo marcando sete golos e fazendo nove assistências na Primeira Liga da Rússia. Não esteva no onze titular no início da campanha de qualificação, mas, agora, Samedov é um dos que têm garantida a titularidade. É um jogador rápido, inteligente e tem um espírito combativo.

Que jogador pode ser uma desilusão?

Roman Shirokov. Com exceção para Akinfeev, é provavelmente o jogador mais forte da Rússia neste momento. Teve grandes exibições na fase de qualificação e é o capitão. Mês este tem sido um ano difícil para Shirokov. Teve um grande diferendo com o treinador do Zenit Luciano Spalletti caindo com o italiano e sendo emprestado ao Krasnodar. E teve também algumas lesões nos meses que passaram. Se Shirokov estiver em baixo de forma no Brasil será muito mau para a Rússia.

Qual é a expectativa realista para a Rússia no Mundial?

Apenas passar a fase de grupos. Os adeptos sonham muito alto porque pensa que a Rússia tem um grupo fácil (a mesma situação de há dois anos no Euro 2012). Sim, a Coreia do Sul e a Argélia podem ser vencidas e frente à Bélgica podem também somar-se pontos. Mas a Rússia tem de estar em forma para conseguir isso. Os jogos são noutro continente, num fuso horário diferente e num clima muito quente – isso pode ser um grande problema.



Curiosidades

Igor Akinfeev
O guarda-redes do CSKA e da Rússia é conhecido pelo seu mau gosto musical. O antes pretendido por Liverpool, Manchester United e Bayern nunca teve problemas em admitir ser um grande fã de uma banda chamada Ruki Vverkh [«Mãos ao ar»], que é muito popular entre as jovens do liceu. Uma vez, ele até pediu ao vocalista para cantar uma canção com a banda.

Dmitry Kombarov
Foi para a academia do Spartak Moscovo com quatro anos, juntamente com o seu irmão Kirill, mas, após alguns conflitos com os treinadores, os seus pais levaram-nos para a academia rival do Dínamo. Passaram nove anos a jogar nos escalões de formação e na equipa sénior do Dínamo, mas em 2010 foram para os seus rivais... Spartak, por 10 milhões de dólares. O Spartak apenas queria o Dmitry, mas ele recusou-se a ir sem o irmão. E o clube contratou ambos.

Yuri Zhirkov
É provavelmente o mais pacato e modesto jogador na história da deleção russa. Raramente fala à comunicação social e quando o faz é muitas vezes sem conseguir encontrar as palavras certas. Por outro lado, a suam mulher é considerada a mais bonita WAG (foi Miss Rússia 2012) e também a menos culta... Ela não conseguiu responder a qualquer pergunta de um programa de televisão, incluindo a questão Quem escreveu as peças de Shakespeare?. Depois do programa, ela ficou mais popular, assim como Yuri.

Aleksander Kerzhakov
O único ponta de lança da Rússia que jogou numa liga europeia de topo – representa o Sevilha na liga espanhola – deu o nome ao verbo «kerzhakovar» no Euro 2012. Em 2012/13 esteve 1.527 minutos sem marcar um golo, o que dá um dia, uma hora e17 minutos.

Fabio Capello
O italiano sempre foi um grande admirador das artes líricas. Mesmo quando era selecionador da Inglaterra encontrava sempre tempo para ir a Moscovo por causa do Bolshoi. Não admira que agora morando em Moscovo ela vá lá tantas vezes. O seu único amigo russo é o famoso maestro Valery Gergiev.



Perfil principal: Yuri Zhirkov

«Zhirkoooooov!« - gritaram todos os narradores na noite de 19 de outubro de 2010. Um golo fantástico contra o Spartak Moscovo (o clube que o rejeitou em 2003) foi o primeiro e o único que ele marcou pelo Chelsea. A parte interessante é como os narradores conseguiram pronunciar o seu sobrenome nome de forma correta, tendo em conta o modo como soa para um falante de inglês.

Zhirkov esperou uma no para marcar o seu golo de estreia pelo clube de Londres. Deu a sensação de que estava à espera para consegui-lo frente a uma equipa russa e àquela que significa anto para ele.

É tido por certo que há apenas um gigante adormecido no futebol russo: Roman Pavlyuchenko. Mas isso é errado. É verdade que Guss Hiddink chamou isso ao avançado do Tottenham, mas no nosso país este tipo de monstro está constantemente a nascer sendo produzido em laboratórios secretos desde a Sibéria até Tambov.

Foi em Tambov, onde nasceu Yuri Zhirkov, que o nosso raramente despertado mostro (especialmente depois da sua mudança para Inglaterra) mostrou na Rússia a sua real capacidade. Ele cresceu numa numa pequena povoação no seio de uma família muito pobre e jogava futebol não por gosto, mas para garantir que na voltava a casa.

Ele jogou em troca de alimentos em torneios jovens evitando que os seus pais e o seu irmão mais novo morressem à fome. Quando jogava no Spartak Tambov , Yuri atraiu a atenção de vários clubes de topo na Rússia. Mas um dos gurus dos treinadores russos, Oleg Romantsev, vetou a transferências de Zhirkov para o Spartak Moscovo. Romantsev não gostou do rapaz que era muito magro e fraco; aquele que, seis anos mais tarde, iria jogar na liga mais exigente do ponto de vista físico...

Zhirkov foi, assim, contratado pelo CSKA Moscovo onde rapidamente se transformou numa estrela. Os adeptos do Spartak passaram a um lamento permanente. Imagine-se os adeptos do Liverpool descobrirem que a direção do clube tinha recusado Rooney, ou o Real Madrid não ter visto nada de especial em Messi ou o Tottenham ignorar o potencial de Henry. Não seria a melhor sensação do mundo, seguramente.

Foram vários anos a mostrar capacidades fantásticas no terreno de jogo: cruzamentos, passes milimétricos, inultrapassável a defender – ele tinha lá tudo. Desde tenra idade que ele estava destinado a mudar-se para um clube no estrangeiro. Especialmente depois das masterclasses internacionais, como o golo na final a Taça UEFA em 2005, as exibições brilhantes ma Liga dos Campeões e no Euro 2008.

O Chelsea ficou com ele, embora Yuri tenha tido uma grande oferta do Bayern Munique que esteve quase a aceitar: «Encaixo melhor no país e no futebol alemão», declarou. No entanto, dois empresários russos, Evgenyi Giner e Roman Abramovich decidiram tudo por ele e mandaram-no para Londres.

Zhirkov foi sempre um trabalhador árduo. A sua principal característica foi sempre trabalhar não apenas para si, mas para a equipa. O seu currículo parecia perfeito para a Inglaterra: um jovem viciado em trabalho com tremenda experiência europeia e técnica brasileira.

O melhor jogador sul-americano da história do futebol russo, o antigo avançado do CSKA Wagner Love, descreveu-o assim: «Tenho sérias dúvidas de que o Zhirkov tenha realmente nascido na Rússia. Eu penso que ele passou a Juventude inteira nas praias de Copacabana. Só assim se explica o que ele consegue fazer com uma bola.»

Quando era treinador do Chelsea, André Villas-Boas disse algo parecido quando Zhirkov foi vendido pelo clube. Destra vez Yuri decidiu pela sua cabeça. Era altura de voltar à Rússia.

Zhirkov teve os seus momentos de glória em Inglaterra. Momentos pontuados por grandeza. Com jogos daqueles que se mostra aos netos com orgulho. Mas o sujeito tímido de Tambov não estava preparado para a competição na equipa, para um excesso de pressão e de atenção sobre todos, desde os adeptos aos jornalistas. E só estava à espera de justificações para acreditar que não lhe era uma única hipótese no campo.

Ele não foi para outro clube dessa Europa para provar que estava certo. Simplesmente tomou o caminho mais fácil indo para o Daguestão, para o Anzhi Makhachkala, onde o dinheiro para os jogadores estava a jorrar a cada nascente. Ao ter escolhido a equipa mais impopular para os adeptos da Rússia foi várias vezes assobiado quando representava a equipa nacional. Isso foi esquecido, mas alguns ainda lhe chamam «Magomed», um nome típico do Daguestão.

Zhirkov tem nos dias de hoje mais um contrato opulento, desta vez com o Dínamo Moscovo, o mais recente novo rico da Rússia. Yuri é de novo feliz na sua terra natal: é casado, com uma antiga miss, cujas entrevistas à televisão chocam qualquer pessoa com um QI superior a 10; filhos que publicamente fumam shisha [cachimbo de água] com 10 e 7 anos de idade; e um emprego num estádio perto de Moscovo, onde um bando de adeptos vêm um grupo de onze milionários jogar um futebol primitivo defensivo.

Fez alguns jogos razoáveis recentemente, depois de o Dínamo ter substituído o treinador. Zhirkov vai ao Campeonato do Mundo no Brasil porque Fabio Capello gosta de jogadores polivalentes. E Yuri ainda é capaz de jogar em quatro posições: defesa esquerdo, médio esquerdo, médio defensivo e defesa central que ataca.

Para o colecionador de relíquias da II Guerra Mundial Zhirkov, o Mundial do Brasil vai ser a sua última batalha a sério. Já com 30 anos, as suas únicas hipóteses de ir ao Euro 2016 são como turista. Mas por enquanto tem de ser um verdadeiro soldado. Ele provou, pelo menos, que sabe lutar pelo seu país.