Não, não tivemos sorte no sorteio para o Mundial.

Preferia, sem hesitar, o destino da França
, com ou sem teorias da conspiração  (Suíça, Equador, Honduras), da Grécia (Colômbia, Costa do Marfim, Japão) ou da Rússia (Bélgica, Argélia, Coreia do Sul).

A distribuição prévia da FIFA nos quatro potes foi tão bizarra que teve, ao menos, o mérito de impedir um «grupo da morte», assim com quatro tubarões juntos logo na primeira fase.

Mesmo assim, olhando para os oito agrupamentos, é pacífico atribuir ao nosso grupo G o estatuto de mais forte: tem a segunda melhor seleção europeia (teoricamente, só atrás da Espanha, mas se calhar, neste momento, a
Alemanha é mesmo a mais forte do continente); a primeira classificada da zona Concacaf ( EUA); e a mais forte seleção africana do momento, o Gana.

Aquele 50/50 que, nos «playoff» de acesso a fases finais, nos tem beneficiado sempre, desta vez pendeu para o lado negativo.

Quem viu o sorteio, certamente se lembrará (além do decote de Fernanda Lima, ok...): faltavam sair duas bolas, uma com o nome da Rússia, a outra representando Portugal.

E era mesmo daquelas situações que não geravam divisões nas preferências: estava tudo a torcer para fugir ao grupo G (temendo alemães, respeitando norte-americanos e ganeses).

Os belgas jogaram futebol de encantar na fase de apuramento, mas num duelo numa fase final de Mundial, era capaz de apostar que não nos ganhavam. Argélia e Coreia do Sul, com o devido respeito, não nos escapam (então com os coreanos, tínhamos mesmo umas contas a certar desde aquele estranhíssimo encontro de 2002, com Beto e João Pinto expulsos e nós com nove quase a chegarmos ao 1-1, lembram-se?)

Dentro do que era possível sair, seria difícil arranjar pior. Mas no que toca a sortes e sorteios, seja em europeus ou mundiais, há mais mitos do que realidades em redor da presença da Seleção em fases finais.

Também não é caso para se desejar «quanto pior melhor». Em futebol, fazer-se história alternativa não faz grande sentido e até pode ter o risco de desviar o foco do essencial.

E o essencial é mesmo que Portugal, nas fases finais sobretudo, se tem mostrado mais forte com os mais fortes e, surpreendentemente, menos capaz com os menos dotados.

O já referido Mundial-2002 foi o exemplo mais claro dessa estranha tendência portuguesa. No grupo teoricamente mais fácil que Portugal apanhou nos últimos anos largos (Coreia do Sul, Polónia, EUA), caímos na primeira fase. Foi, aliás, a última vez que não conseguimos passar da fase de grupos, uma vez chegados a uma fase final de euros ou mundiais.

Em contraponto, no Euro-2000 aparecemos no tal «grupo da morte» (Alemanha, Inglaterra, Roménia) e o saldo foram três vitórias com direito a nota artística (três de Sérgio Conceição aos alemães; recuperação épica de 0-2 para 3-2 com os ingleses, com grandes golos de Figo, João Pinto e Nuno Gomes; golo de Costinha mesmo no fim, aos romenos).

No ano passado, nova prova de que estar no grupo mais forte não nos assusta: apuramento perante Alemanha (apesar da derrota no primeiro jogo, mas com grande exibição), Holanda (talvez a melhor exibição de CR7 na Seleção até à altura, só superada pela glória de Solna no playoff) e Dinamarca (triunfo 3-2, com excelente jogo ofensivo a compensar dois erros defensivos).

É claro que esta tendência pode falhar um dia. Diz muito sobre a tendência dos jogadores portugueses de estarem melhor nos grandes momentos e facilitarem quando as coisas (só aparentemente) se afiguram mais simples.

Mas mesmo com a experiência repetida, por vocês não sei, mas eu teria claramente preferido o destino da Rússia, comparando com o que nos tocou em sorte.

Rota para os oitavos? Não há muito que inventar: não perder com a Alemanha (o jogo no Euro-2012 mostrou que é perfeitamente possível); cumprir com os EUA (esqueçam tudo o que viram no Mundial-2002...); resolver com o Gana.

Num cenário de normalidade, esse terceiro jogo será, claramente, o que vai decidir a vaga sobrante, se considerarmos que um dos apurados do grupo G é a Alemanha e que Portugal se baterá com o Gana pela outra posição nos oitavos.

A boa notícia neste quadro complicado? Se, como acredito, passarmos, temos talvez mais hipóteses de saltar dos oitavos para os quartos, do que, propriamente, de garantir o acesso à fase a eliminar.

Isto porque calhamos no ramo Bélgica/Rússia/Argélia/Coreia do Sul, o tal que, nos 50/50, teria sido o nosso grupo, se tivesse prevalecido o lado positivo do destino.

Mais do que fazer estas conjugações futuristas, convém começar a pensar naquilo que deve ser aproveitado do que Portugal mostrou na caminhada para o Brasil (foi alguma coisa, mas muito teve a ver com Ronaldo e Moutinho e pouco com o resto) e identificar o que há a melhorar (lanço já uma campanha por William Carvalho, 
a melhor surpresa individual do futebol português desta temporada, no onze).

Quem é frequentador do Facebook, de certeza que já terá visto amigos a fazer este exercício. Se ainda não o descobriu, aqui vai o simulador do «Olé» até à final. Vale tudo, até escolher Portugal campeão.

Nunca se sabe.


«Nem de propósito» é uma rubrica de opinião e análise da autoria do jornalista Germano Almeida. Sobre futebol (português e internacional) e às vezes sobre outros temas. Hoje em dia, tudo tem a ver com tudo, não é o que dizem?