«Se o estádio não estiver cheio amanhã, a culpa é da Liga.»

Na véspera de defrontar o Sporting, para a meia-final da Taça da Liga, Abel Ferreira, treinador do Sporting de Braga, desobrigou-se a si e aos seus de qualquer responsabilidade por uma fraca lotação.

Num ataque preventivo, com particular veemência, disparou contra o preço dos bilhetes, que custam 15, 20 e 25 euros, e atirou-se à entidade organizadora.

Apesar do aumento do valor dos ingressos em relação à última edição, o problema são os argumentos que contrariam a convicção do treinador dos minhotos.

Horas depois das declarações de Abel, Benfica e FC Porto defrontaram-se na outra meia-final da Taça da Liga e, numa noite chuvosa, nada convidativa para ir ao futebol, levaram ao Estádio Municipal de Braga 22 945 espectadores.

Há também que considerar um jogo de futebol com um espetáculo, como ontem se viu durante 90 minutos, tanto mais se colocar frente a frente as principais equipas do futebol português.

A título comparativo, por estes dias, um bilhete para o Cirque du Soleil, na Altice Arena, em Lisboa, custava entre 37,5 e 75 euros. Em alternativa, poder-se-á consultar também as vendas de ingressos online para verificar o rol de concertos musicais em que os ingressos têm preços elevados.

Se estes exemplos parecerem descabidos, sugiro-vos outro: na última deslocação a Braga, na 5.ª jornada do campeonato, os adeptos do Sporting pagaram 25 euros para um lugar que agora custa 20 euros para esta meia-final. Dessa vez, porém, o preço não foi definido pela Liga, mas pelo próprio clube da casa.

Posto isto, não sendo barato, sobretudo num país como Portugal, onde o salário médio é o mais baixo da Europa Ocidental, bilhetes entre 15 a 25 euros não são valores exorbitantes para os jogos decisão de uma competição entre as quatro melhores equipas do futebol nacional.

Sagaz como é, Abel entenderá que o problema para o Sp. Braga é outro. Jogando a final four no seu estádio, os arsenalistas correm o risco de não tirarem o máximo proveito do fator casa.

Ainda que involuntariamente, o esclarecimento à preocupação do treinador foi-lhe prestado na véspera, pelo presidente do clube.

«É com grande mágoa que digo: ser de Braga ainda não é sinónimo de ser do Sporting Clube de Braga», disse António Salvador na noite de segunda-feira na gala Legião de Ouro.

Estruturalmente, o Sp. Braga é o 4.º clube português. Porém, basta ver as assistências no estádio para perceber que o público não tem acompanhado nos últimos anos este crescimento sustentado e absolutamente meritório.

O Sp. Braga tem neste momento uma média de 10 349 espectadores em jogos da Liga. O rival Vitória de Guimarães tem o dobro – 20 300 de média por jogo – no concelho vizinho.

Numa cidade jovem, pujante economicamente, naquele que é o terceiro núcleo urbano do país, a margem de crescimento do Sp. Braga seria enorme, desde que a população trocasse afinidades antigas e estivesse disposta a envolver-se com o clube para ajudá-lo a crescer.

Ganhar a sua própria cidade, esse é o grande desígnio do Sp. Braga. Comparado com esse desafio, os preços da bilheteira são mera conjuntura.

[artigo originalmente publicado às 23h45, 22-01-2019]

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«Geraldinos & Arquibaldos» é um espaço de crónica quinzenal da autoria do jornalista Sérgio Pires. O título é inspirado pela expressão criada pelo jornalista e escritor brasileiro Nelson Rodrigues, que distinguia os adeptos do Maracanã entre o povo da geral e a burguesia da arquibancada.