Chama-se Javier Cohene e o leitor certamente se lembrará dele como central do Paços de Ferreira ou, mais recentemente, o Vitória de Setúbal. Queira, portanto, acrescentar mais um dado: Cohene é, agora, internacional palestiniano.

Apesar de ter nascido na cidade de Pirayu, no Paraguai, Cohene não teve as oportunidades que queria no seu país. Melhor dizendo: não teve nenhuma. Em conversa com o Maisfutebol, o central de 27 anos garante, contudo, que não guarda mágoa. Entende a decisão dos responsáveis do seu país de origem.

«Nunca recebi sequer uma mensagem dos responsáveis do Paraguai. Mas não guardo qualquer mágoa. A vida continua», comenta Cohene.

E como surge, então, a Palestina? Na verdade, Javier Cohene nunca tinha estado no país. Queria representar uma seleção, vasculhou as suas origens e descobriu a ligação à Palestina. Uma ligação em quarto grau, pelo lado do pai. E um «amor correspondido», porque na Palestina tudo fizeram para contar com um jogador de tão vasta experiência, o que não abunda por aqueles lados.

«Estava a tratar isto há algum tempo. Já deveria ter estreado pela Palestina em maio, já estava tudo tratado. Mas tive uma lesão num joelho e não pude estar num torneio. Mas a questão da naturalização estava a ser tratada por causa da descendência que eu tenho. Eles mostraram interesse, gostei da abordagem», explica.

E a estreia aconteceu. Num jogo contra Taiwan, Cohene alinhou pela primeira vez com os novos colegas. Um jogo agridoce.

«Foi uma estreia boa e má ao mesmo tempo. Boa porque foi a primeira vez e tive a oportunidade de ajudar com um golo. Má porque saí logo aos 26 minutos», conta.

A Palestina venceu por 7-3, com Cohene a abrir o ativo. Mas cedo teve de sair. «Foi por causa do calor. Comecei a sentir tonturas. Falei com o treinador e ele achou melhor tirar-me para não arriscar nada», contou.

«Conflito? Prefiro nem falar disso»

A naturalização de um jogador para representar uma seleção de outro país é um tema, de resto, banal. O que torna especial esta história, para além de ser um jogador com passado no futebol português, é a drástica mudança. Do Paraguai para a Palestina.

O país vive uma situação complicada, com o conflito permanente com Israel. Ainda recentemente milhares de pessoas morreram na Faixa de Gaza em intervenções armadas. Cohene manteve-se a par de tudo, mas distante ao mesmo tempo.

«Conhecia bem a realidade do país. Ouvia sempre as notícias do que se estava a passar. Mas nunca iria desistir de jogar por um país que me acolheu de braços abertos. Que me convidou para os representar, sabendo que sou descendente desse país. Vim com orgulho e vou ser grato a vida toda», garantiu.

O tema em si, do conflito, é que passa ao lado de Cohene. «Sobre isso prefiro não entrar em detalhes. Sei que não é uma situação muito agradável e não queria falar», pediu, quando questionado sobre a situação Israel-Palestina.

Em sentido inverso, há um tema que Cohene não tem problemas em sublinhar: o grupo que encontrou. «Foi fantástico. Pessoas amáveis, tranquilas, brincalhonas e muito responsáveis. Não conhecia nenhum deles mas agora já são quase todos meus amigos no Facebook», revela.

Sérvia também é ponto de viragem

Os tempos são de mudança para Cohene. Para além de se ter naturalizado palestiniano, o central está a viver na Sérvia, para onde se mudou depois de terminada a ligação ao Vitória de Setúbal. Joga no FK Borac Cacak, estreou-se este fim-de-semana, no jogo com o FK Beograd. Correu mal: a equipa empatou e Cohene fez um autogolo.

Um pormenor numa adaptação que até está a correr bem. Tem ajuda importante. «Graças a Deus tenho aqui o Sasa Simic, que esteve muito tempo em Portugal. Está a ajudar-me muito», conta, referindo-se ao antigo jogador de Boavista ou União da Madeira.

«As pessoas daqui são simpáticas. Deixam-me entrar no ambiente deles. Facilita-me bastante a adaptação», confessa.

Sem conhecer o país, Cohene confessa que foi um pouco aos «apalpões». «Ainda não sei bem como é, mas vejo aqui sempre muitos jornais desportivos. Isso significa que são fanáticos por futebol. Isso é bom para termos o ambiente que nós, os jogadores, gostamos», frisou.

Sobre o FK Borac Cacak, Javier Cohene lembra que é um clube que já participou na Taça UEFA e tem «muita tradição na cidade».

«As pessoas aqui gostam de conhecer os jogadores. Olhe, já tive convites de pessoas daqui para conhecer melhor a cidade», conta.

Cohene, o paraguaio internacional palestiniano que joga na Sérvia, promete, por isso, não ficar por aqui.