O Ludogorets é um dos casos de ascensão mais rápida da história do futebol. Foi campeão no ano em que se estreou no campeonato principal da Bulgária, além de ter ganho a Taça e a Supertaça, e na época seguinte revalidou o título. Agora, ao terceiro ano, fez 10 pontos em quatro jogos na Liga Europa e já garantiu o apuramento na fase de grupos. Lá no meio há dois portugueses a festejar. Em contraste com as equipas portuguesas, nenhuma delas com motivos para sorrir na Europa.

Vitinha, defesa português que vai na terceira época no clube, tem esta explicação para o sucesso: «Deve-se à grande organização que o clube tem, à vontade do patrão de querer fazer cada vez melhor, de nos dar todas as condições. E também à união do grupo. Temos muitos estrangeiros, que foram muito bem aceites pelos jogadores búlgaros. E depois, explica-se pelo trabalho.»

O «patrão» é Kiril Domuschiev, homem de negócios búlgaro que adquiriu em 2010 o Ludogorets, clube de Razgrad, uma cidade de 30 mil habitantes. É ele quem está por trás desta rápida ascensão. Domuschiev, quer colocar as «águias» de Razgrad no mapa do futebol europeu. «Claramente. Ele aspira à Liga dos Campeões», conta ao Maisfutebol  Fábio Espinho,  o outro português do Ludogorets e uma das referências da equipa. «Ele em três anos pegou num clube pequeno que estava na II Divisão B, ou equivalente, e fez dele bicampeão.» Fê-lo à custa de muito investimento: «Sim. Hoje em dia no futebol isso é fundamental.»

O resultado foi uma equipa com muitos jogadores estrangeiros que levou algo de novo ao futebol búlgaro, diz Fábio Espinho. «O futebol aqui é diferente. Enquanto na Europa Ocidental se joga um futebol mais técnico, aqui é mais agressivo. Como a nossa equipa é recheada de jogadores de várias nacionalidades, diferencia-se por ter um futebol mais técnico», nota o médio formado no FC Porto e que emigrou este ano, depois de deixar o Moreirense. «A nossa equipa tem a média de alturas mais baixa das que lutam pelo título, por exemplo. A nossa arma é mesmo a técnica.»

O Ludogorets é um caldo de culturas, reforça Vitinha. «Só brasileiros e portugueses somos sete no total», conta. «Temos franceses, finlandeses, romenos, eslovacos, argentinos, espanhóis.»

A época até nem começou bem. A equipa começou por perder a primeira mão da segunda pré-eliminatória da Liga dos Campeões, frente ao Slovan Bratislava. Vendo o seu sonho da Liga dos Campões ameaçado, e depois de perder também o primeiro jogo do campeonato, Kiril Domuschiev despediu o treinador que tinha orientado a equipa nos últimos três anos e que tinha feito parte desta ascensão meteórica. Ivailo Petev, cujo nome aliás havia de correr mundo meses mais tarde.

Petev foi o treinador que as adeptos do Levski Sófia rejeitaram, por ter admitido que gostava do CSKA, e que despiram e expulsaram em plena conferência de imprensa.

Esse foi o principal motivo por que o futebol búlgaro foi notícia nos últimos tempos, e não foi bom. «São coisas que acontecem no futebol. Aqui no Leste sobretudo. Também acontecem esse tipo de escândalos no futebol romeno, por exemplo, onde eu estive vários anos», nota Vitinha. 

Mas o Ludogorets tem escapado a essa imagem de instabilidade. «O clube tem muito boa organização, acho que aqui dificilmente acontecerá uma coisa dessas», diz Vitinha, rejeitando a ideia de que a diferença seja essencialmente o maior poderio financeiro do clube. «Há mais equipas com bastante capacidade financeira, o Levski, o CSKA também está a voltar», observa, preferindo acentuar a diferença na organização: «Aqui não nos falta nada.»

Agora, o Ludogorets fez do futebol búlgaro notícia pelos melhores motivos.  Stoycho Stoev foi o treinador que sucedeu a Petev. Com ele a equipa ainda passou a segunda pré-eliminatória da Liga dos Campeões e também a terceira, com o Partizan. Caiu no play-off, com o Basileia. Mas a ambição estava lá, e foi canalizada para uma campanha fantástica na Liga Europa.  Além do campeonato búlgaro, que o Ludogorets  lidera  com três pontos de avanço sobre o segundo classificado, ao fim de 16 jornadas.

Na fase de grupos da Liga Europa o Ludogorets estreou-se na Holanda, em casa do PSV Eindhoven. E ganhou,  2-0 . E depois venceu o Dinamo Zagreb no segundo, e foi a casa do  Chernomorets  vencer o terceiro. Três jogos, três vitórias, sem sofrer um único golo. 

E o grande momento chegou nesta quinta-feira. O Ludogorets recebia os ucranianos a precisar apenas de um ponto. Teve de viajar, como tem feito sempre nos jogos como anfitrião na prova, até Sófia. O estádio do clube, na cidade de Razgrad, não tem condições para receber jogos europeus, pelo que a equipa joga na capital, no Estádio Nacional. 

Portanto, fizeram os mais de 300 quilómetros que separam Razgrad de Sófia. «São quatro e meia, cinco horas de viagem», nota Fábio Espinho. Ainda assim, havia muita gente no estádio a apoiar. «A distância dificulta o acesso dos nossos adeptos, mas há muita gente que apoia o Ludogorets. Também adeptos de outras equipas, porque nós estamos a representar o futebol búlgaro.»

Vitinha, que ficou na bancada a ver o jogo, admite que havia alguma ansiedade antes da partida. «Havia algum nervosismo, alguma ansiedade para conseguir este ponto. Ainda vamos jogar com o PSV e acabamos em casa do Dínamo Zagreb, as coisas podiam complicar-se se não tivéssemos feito este ponto.»

Mas fizeram-no. Com Fábio Espinho a titular, o Ludogorets não conseguiu marcar na primeira parte mas fê-lo logo depois do intervalo, um golo do brasileiro Juninho Quixadá. Os ucranianos ainda empataram, mas o Ludogorets segurou o ponto de que precisava.

E pronto, garantiram que em fevereiro ainda havemos de ouvir falar deles na Liga Europa. Já pensaram no adversário que gostariam de ter? Sim. Vitinha, natural de Guimarães, vai pelo coração. «Gostava que calhasse o V. Guimarães, porque significava que passava, o que está difícil. Por outro lado, preferia que passassem e não nos calhassem.»

Fábio Espinho sorri perante a hipótese de até poder vir a calhar um dos grandes do futebol português, se FC Porto e/ou Benfica não se apurarem na Liga dos Campeões e acabarem em terceiro nos seus grupos.

«Já comentei com os meus colegas. Gostava que os portugueses fossem o mais longe possível, mas se o FC Porto ou o Benfica viessem parar à Liga Europa, gostava que calhasse um deles. Até porque é sempre mais uma oportunidade de voltar a Portugal. Preferia o FC Porto, porque é mais perto de casa.» 

Para Fábio, que emigrou pela primeira vez esta época e se afirmou rapidamente como titular do Ludogorets, essa até podia ser uma boa oportunidade de voltar a chamar atenções em Portugal. O objetivo dele é voltar a casa um dia. «Gostava de voltar a jogar no futebol português, num clube com outros objetivos, num patamar mais alto», diz. Para já, vai dando nas vistas na Liga Europa. «Acredito que em Portugal reparem no que eu faço. Esta é uma grande montra. Se havia pessoas que duvidavam do meu potencial, estão a ver que estou a jogar regularmente e a ver os nossos resultados.»