Dez anos depois é fácil evocar o dia que mudou o mundo: todos nos recordamos. Basta falar em 11 de Setembro. «Lembro-me perfeitamente, estava...», ouve-se repetidamente. Val Teixeira e Kimberly Brandão também se recordam, claro: estavam ambos nos Estados Unidos, e viveram tudo por dentro.

Ele estava em casa, a preparar-se para mais um treino. Ela estava precisamente num treino, ainda na equipa universitária. A notícia chegou-lhes trazida por vozes conhecidas, mas haveria de lhes bater com o impacto que só quem vive nos Estados Unidos pode sentir. Por isso falaram connosco.

Falaram daquele dia, e dos 3650 dias que se seguiram. Em dez anos mudou muita coisa: na América, no mundo, e até no futebol. Por isso olhámos para o fenómeno através dos olhos do soccer. «Os futebolistas americanos estão mais conscientes da necessidade de ser beneficentes», conta Val Teixeira.

No fundo, aponta, foi essa a maior reforma nos americanos: mudaram por dentro. «Estão mais abertos, mais preocupados com o que se passa no mundo», frisa o português do Real Maryland. «Em Nova Iorque as pessoas ficaram mais unidas. Percebemos que todos nós perdemos alguém», diz Kimberly.

Depois, claro, mudou a segurança. Nas fronteiras, nos aeroportos, e também nos estádios. Como locais de grande concentração de pessoas, os jogos de futebol passaram a ser olhados com cuidado. «Antes podia entrar-se com tudo, ninguém ligava. Hoje nem uma garrafa de água se pode levar.»

Foram dias que mudaram tudo, com o mundo lá dentro. É fácil lembrar que era um dia de competições europeias. O Boavista estava em Liverpool, para jogar a Liga dos Campeões. Não sabia que ia jogar, mas jogou mesmo: empatou 1-1. Marcou hotel de prevenção para a hipótese de não poder viajar.

O F.C. Porto recebia em casa a Juventus, no dia a seguir, o Sporting já estava na Dinamarca, para defrontar o Mitdjylland. Nenhum dos jogos se realizou nessa data, sendo adiados para dez dias depois. Pelo meio a Juventus ainda teve de sair do hotel onde estava na Boavista, por ameaça de bomba.

Foram dias loucos, mas sobretudo loucos na América. O El País escrevia que para esta geração de americanos, o 11 de Setembro estará como Pearl Harbor esteve para os seus avós: um acontecimento que lhes mudou a vida para sempre, mudando decisivamente o curso da pátria que é deles.

Foram essas mudanças que fomos tentar perceber, através de um português e uma portuguesa, futebolistas num país em mutação, que viveram esse e todos os dias que se seguiram por dentro do furacão. Num dia de memória, respeito e reflexão, nos Estados Unidos e no mundo, venha daí nesta viagem:

Kimberly, memórias do «treino onde tudo mudou»

Val Teixeira, no dia em que a América abriu horizontes