Por volta da década de 70, as disputas entre os jogadores e os clubes de futebol estavam na ordem do dia por causa das reivindicações por parte dos futebolistas, como empregados em relação à entidade patronal que eram as agremiações desportivas: os dois grandes cavalos de batalha dos jogadores verificavam-se em relação ao «direito de opção» e à inexistência de um contrato (colectivo) de trabalho.
O «direito de opção» consistia num privilégio que os clubes tinham em relação aos jogadores do seu plantel para autorizar uma eventual transferência de um seu futebolista para outro clube. Ou seja, o clube podia manter um jogador no seu plantel (quando acabasse o contrato) assegurando apenas 60 por cento do ordenado oferecido pelo outro clube que queria fazer a contratação.
«O direito de opção contrariava todas as leis laborais do País. Bastava pagar 60 por cento [do salário oferecido pelo emblema que queria fazer a contratação] e o jogador acabava por ficar vinculado ao clube [onde estava] por um ordenado muito inferior àquele que lhe ofereciam», recordou ao Maisfutebol Jorge Fagundes, presidente da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) eleito em 1974. «Nessa altura, havia essa situação anómala: o jogador ficava a perder muito dinheiro, com uma lei de opção que não acontecia em mais nenhuma actividade profissional, nem com os jornalistas, com os médicos, os metalúrgicos, etc....», analisou o antigo dirigente.
Daí decorria também que o contrato entre os jogadores e os clubes tinha um estatuto que «não era equivalente ao dos trabalhadores comuns». «Não [era equivalente] em todos os sentidos», explicou Jorge Fagundes, dizendo que «os jogadores eram trabalhadores que ganhavam bem, mas não eram trabalhadores na verdadeira acepção da palavra; não tinham todos os direitos que os outros trabalhadores tinham».
A pedrada no charco
Estas eram situações que estavam no auge da polémica entre clubes e futebolistas nos princípios dos anos 70 e que estiveram no centro das preocupações de um Sindicato dos Jogadores criado em 1972 ¿ que levou também à resposta a nível organizativo por parte dos clubes e que viria a obter vitórias para os jogadores em 1975. Mas a batalha foi longa e começou vários anos antes, mesmo que só tenha sido ganha depois da Revolução de Abril. [ver artigos relacionados]
António Simões, jogador do Benfica, foi o primeiro futebolista a tomar uma posição contra o «direito de opção» dos clubes. «Foi antes de 1969 e provocou uma celeuma que nunca mais acabou», recordou Simões para o Maisfutebol. «Lembro-me de ter dado uma entrevista nessa altura em que dizia Os nossos direitos são não ter direitos nenhuns!, uma frase que tive, ainda jovem, nessa época em que vivíamos sem direitos», contou.
«Este caso deveu-se ao tal direito de opção, pois apareceu um clube com uma proposta para eu sair e eu fiz sentir que tinha esses direitos. Acabei por não sair, por uma questão de opção [minha], mas isso fez mexer e revolucionou um pouco aquilo que era o relacionamento entre o trabalhador e a classe patronal. No fundo, eu não queria sair, queria continuar; mas queria também marcar uma posição na altura, e foi isso que se fez», disse Simões.
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