Houve um nome que sem o saber foi fundamental na carreira de Cristiano Ronaldo: esta história podia ser aliás muito diferente se não existe Franco no início dela.
 
O central que teve uma longa carreira, e que é mais fácil de lembrar pelo que fez sobretudo no Rio Ave, acabou por involuntariamente lançar Ronaldo para o sucesso no futebol.
 
Fê-lo através da transferência para o Sporting.
 
A história é contada ao Maisfutebol por Aurélio Pereira: palavra então ao nome mítico da formação do clube leonino.
 
«O Nacional tinha uma dívida para com o Sporting de direitos da formação de Franco», conta. «O Franco tinha estado até aos juniores no Sporting, depois saiu para o Odivelas e um ano mais tarde assinou pelo Nacional, com contrato profissional.»
 
O Odivelas quis então fazer valer os seus direitos e apresentou uma queixa na Federação: exigia uma compensação pelos direitos de formação.


 
Ora a Federação deu procedência à queixa e intimou o Nacional a pagar os direitos de formação aos dois clubes anteriores de Franco: o Sporting e o Odivelas. No caso do Sporting, a indemnização era de cinco mil contos.
 
Vinte e cinco mil euros na moeda atual.
 
«Cinco mil contos em 1996 era uma fortuna: uma quantia realmente muito elevada para a realidade da altura», recorda Aurélio Pereira.
 
«Isto acontece no primeiro ano da presidência de Rui Alves no Nacional. Como o Nacional não tinha possibilidade de pagar essa quantia, lembrou-se do Cristiano Ronaldo. Falaram então com o presidente do núcleo sportinguista do Funchal, o Dr. Marques de Freitas, para ele expor a situação diretamente ao Sporting.»
 
Aurélio Pereira era nessa altura chefe do departamento de formação do Sporting e admite com toda a naturalidade que não conhecia Cristiano Ronaldo.
 
«Não havia nenhuma informação suportada e escrita sobre o miúdo. Hoje se houvesse um Cristiano Ronaldo em Vila Real ou nos Açores, toda a gente saberia tudo sobre ele. Naquele tempo não era assim», explica.
 
«Quando o Dr. Marques de Freitas falou comigo, até mais pela consideração que tinha pelo homem, disse-lhe que só havia uma solução: o Nacional pagava a passagem ao miúdo, ele ficava em Alvalade uma semana, nós observávamo-lo e depois logo se via.»

 
Assim aconteceu, de facto.



Aproveitando as férias da Páscoa de 1996, Cristiano Ronaldo viajou para Lisboa na companhia do padrinho Fernão Sousa e cumpriu uma semana de testes no Sporting.
 
«Ao segundo dia decidimos que tinha de ficar.»
 
Aurélio Pereira confessa que não viu o treino do primeiro dia, mas alertado pelos técnicos foi ver o segundo.
 
«Ficamos entusiasmados com o miúdo. Tinha traquejo com a bola, velocidade, imaginação. Mas acima de tudo reparei na forma como ele dominava completamente o ambiente. Falava, dava ordens, gritava. Todos os outros miúdos olhavam para ele como uma coisa rara, como um talento», lembra.
 
«Os miúdos selecionam como ninguém. Não dão descontos, como costumo dizer. São juízes implacáveis e se eles, ao segundo dia, já sabem o nome de outro miúdo e lhe passam a bola para ele jogar, é porque esse miúdo é bom jogador.»
 

Osvaldo Silva e Paulo Cardoso foram os dois treinadores que fizeram a observação. «Jogador de talento fora de série e tecnicamente muito evoluído. É de destacar a capacidade de drible em movimento ou parado», escreveram na ficha de avaliação, segundo revelou o jornal do Sporting.



 
Não havia dúvidas, portanto: Ronaldo era um miúdo muito promissor.
 
«Propusemos logo a troca dos cinco mil contos pelo miúdo. Depois fiz uma exposição à Dra. Rita Figueira, que era a diretora jurídica do Sporting. Mais tarde o vice-presidente para a área financeira, que era o Dr. Simões de Almeida, chamou-me ao gabinete dele.»

 
Foi um momento determinante.
 
«Disse-me que não fazia sentido trocar cinco mil contos por um miúdo de onze anos», conta Aurélio Pereira. «Expliquei-lhe a situação e disse-lhe que não podia ignorar o que tinha visto. Ele escutou-me, testou-me, viu a minha reação.»
 
«Meia hora depois de sair do gabinete dele, a Dra. Rita Figueira ligou-me a informar que o vice-presidente tinha assinado a autorização. Acho que viu nos meus olhos que não podíamos perder o miúdo.»
 
O futuro melhor jogador do mundo tornou-se por isso jogador do Sporting a custo zero. A troco, recorde-se, dos direitos de formação de um central júnior: que nunca chegou a defender a equipa profissional do Sporting, aliás.
 
No início da época seguinte, ainda só com onze anos, Cristiano Ronaldo chegava a Alvalade. A partir de onde haveria embarcar para conquistar o mundo.