Jordan Perez; Scott Wiseman, Roy Chipolina, Danny Higginbotham, Ryan Casciaro, Joseph Chipolina; Jeremy Lopez, Daniel Duarte, Liam Walker, Robert Guilling; Adam Priestley. São nomes de jogadores que passam despercebidos à maioria dos adeptos do futebol, e que esta quarta, na melhor das hipóteses, serão chutados para uma das páginas interiores da maioria dos jornais.

Mas tal não irá acontecer em Gibraltar, um pequeno território de 6,5 km quadrados, e com cerca de 30 mil habitantes. Para os gibraltinos, estes são nomes familiares, que vão ficar na história do futebol local. Foram os onze jogadores a quem o selecionador Allen Bula concedeu o privilégio de materializar em campo, um sonho conquistado em catorze anos de batalha: o reconhecimento oficial da UEFA como membro efetivo do futebol europeu.


A conquista foi muito dificultada pela Espanha, receosa que tal decisão contagie os órgãos que superintendem o futebol no velho continente, ficando mais sensibilizados às tentativas de autonomia futebolística que a Catalunha e o País Basco já têm ensaiado.

Questões políticas e de soberania, sobre o território britânico, também extravasam para esta questão desportiva, obrigando a GFA (Associação de Futebol de Gibraltar) a procurar uma casa para jogar, dada a falta de condições do único estádio existente, e a recusa da Espanha em emprestar um recinto.


A solução foi encontrada no Estádio Algarve, a cerca de 400 quilómetros de distância. A Eslováquia teve a honra de apadrinhar a estreia. O empate (0-0) final foi efusivamente festejado. Pelo resultado e pela autonomia futebolística: para todos os efeitos, até ao próximo jogo, esta é a única seleção em todo o mundo que ainda não sabe o que é perder.

«Apesar de Portugal ser longe, para nós não é estranho, porque muitos gibraltinos costumam vir cá no verão. Sentimo-nos como em casa e este é um sítio muito bom para começar. Infelizmente Espanha não nos permitiu jogar nos seus estádios. Podíamos jogar mais perto de nossas casas, num local que implicasse uma viagem mais curta para os nossos adeptos, e com mais benefícios económicos para as áreas próximas de Gibraltar. Mas para Espanha, é óbvio que Gibraltar representa algo com o qual eles nunca conseguem chegar a acordo», lamentou Fabian Picardo, primeiro-ministro de Gibraltar, que assistiu ao jogo.

«Estamos muito orgulhosos de ver a equipa jogar a este nível e estamos muito gratos à Federação Portuguesa. Todos, desde os responsáveis do estádio às autoridades portuguesas, têm sido muito prestáveis», reconheceu Desmond Reoch, presidente da GFA. 

«Foi um grande resultado. Tínhamos um plano de jogo que os jogadores cumpriram a rigor. Pedi-lhes 100 por cento e eles deram muito mais. A Eslováquia jogou muito bem, teve mais posse de bola, mas a minha equipa jogou de forma brilhante. Ser um membro da UEFA de pleno direito foi um primeiro sonho cumprido; sair com um empate deste jogo foi como se se cumprisse um outro sonho». As palavras são do selecionador Allen Bula.

«Não digo que vamos qualificar-nos para o Euro 2016. Mas vamos entrar em campo sempre com intenção de ganhar, sentir que vemos uma luz ao fundo do túnel e podemos lá chegar...». Uma mensagem temerária de quem está a dar os primeiros passos na alta roda do futebol europeu. A continuação desse sonho tem a duração de dois anos, e irá passar pelo relvado do Estádio Algarve. 

«Os jogadores, a minha equipa técnica, e eu, somos profissionais, e não nos envolvemos em política, nem queremos ouvir falar em política. Isso não nos afeta, temos um trabalho a fazer e ficou provado hoje que nada nos afeta. A UEFA deixou uma mensagem clara nesse aspeto, quando em maio aprovou Gibraltar como membro, e estou 100 por cento com essa mensagem. Quanto ao estádio, essa foi a decisão da federação, que apoio totalmente. Não podia estar mais contente por jogar neste estádio e dizer que será a minha casa nos próximos dois anos. Portugal aceitou-nos de braços abertos», agradeceu.

Roy Chipolina é o capitão da equipa gibraltina. «O Danny e o Scott acrescentam muita experiência, especialmente o Danny, porque tem uma tremenda voz de comando, e ajuda toda a equipa a controlar-se e a equilibrar-se. Foi graças a isso que conseguimos um bom resultado. Não me sinto tão cansado como pensava antes do jogo. Estivemos concentrados no nosso plano, equilibrámos as coisas, e todos os jogadores cumpriram o seu papel. Conseguimos um resultado fantástico e estamos em êxtase. Trabalhámos muito para isto, e conseguir este resultado no nosso primeiro jogo é fantástico», disse, elogiando os companheiros que evoluem nos campeonatos secundários de Inglaterra.

Uma conferência de imprensa conjunta, que antecedeu um jantar volante no estádio, antes da partida, em autocarro, para Gibraltar. Com a curiosidade extra de a viatura ser de uma empresa espanhola.

«Quem não salta é espanhol!»

«Hoje é um dia histórico para o nosso país. O mais importante na história do futebol, em Gibraltar». O sentimento foi transmitido ao Maisfutebol por John Sergeant - uma hora antes de Hugo Miguel apitar para o início do jogo - e era transversal aos cerca de 500 gibraltinos, que fizeram uma viagem de cinco horas para apoiarem o memorável momento da sua “rock team”, diante da Eslováquia.

«Não temos o nível de um país grande no futebol, como Portugal. Mas agora, como membros da UEFA, temos a possibilidade de jogar com eles, e com jogadores nascidos em Gibraltar. Temos um misto de jogadores profissionais e semi-profissionais, e no futuro, com a nossa cultura e por o futebol ser o desporto mais importante em Gibraltar, vamos bater-nos bem, e sem medo. Os gibraltinos vivem o futebol com muita emoção, e têm muita ambição. Somos melhores que Andorra e San Marino, deveremos estar ao nível do Liechtenstein.», continuou John Sergeant, pai de Jack Sergeant, defesa-central que aos 66 minutos também entrou nesta história.

Lee Casciaro. Não é conhecido no mundo do futebol, mas para Sergeant, é um craque, a estrela da equipa. Mas, por estar lesionado, não saiu do banco de suplentes. «O melhor é o Lee Casciaro, mas está lesionado. Joga em Gibraltar e os melhores que jogam em Inglaterra, são o Scott Wiseman e o Danny Higginbotham. O Wiseman joga no Barnley, na Championship. O Higginbotham joga no Chester, com outro jogador de Gibraltar, o Adam Priestley.», elegeu.

«Obrigado Portugal». O agradecimento dos gibraltinos ao país que os acolheu estava escrito numa tarja. Nas bancadas, algumas bandeiras de Portugal ajudaram a compor a festa, e a evidenciar o distanciamento do pequeníssimo território britânico encravado entre Espanha e o Mediterrâneo, para com nuestros hermanos. «Portugal is better than Spain», apregoavam, assim como – e agora em castelhano -,«quem não salta é espanhol». E todos saltaram. E o slogan castelhano foi a única exceção num apoio todo ele feito em língua inglesa. Se calhar, para dissipar dúvidas e algum possível intruso...