Começou o Campeonato do Mundo e as dúvidas sobre como ia ser o ambiente à volta da prova ficaram esclarecidas. Há Mundial. Mas os protestos sociais, as manifestações políticas contra o evento e os confrontos com as autoridades também estão presentes. Foi assim no dia de estreia.

O tema que está a ferver nas redes sociais debaixo de hashtags #NaoVaiTerCopa e #VaiTerCopaSim esteve presente de forma física desde manhã em vários pontos do Brasil e a oposição entre quem protesta e quem está lá para garantir a ordem das coisas explodiu por várias vezes nas ruas. O Brasil venceu, mas, no presente, o futebol não é toda «a alegria do povo». Pelo menos, de todo o povo brasileiro.

São Paulo foi o palco que acolheu o Brasil-Croácia que abriu este Mundial e foi na mais populosa cidade brasileira que os incidentes à volta do Mundial mais se fizeram sentir. Os manifestantes tentaram cortar a Radial Leste, a principal via de acesso ao estádio Arena de São Paulo (conhecido como Itaquerão, por se situar no distrito paulista de Itaquera), a polícia tinha ordens para impedir, os confrontos aconteceram. Os agentes destacados dispararam balas de borracha e gás lacrimogéneo, os manifestantes responderam com pedras.

Vias e estações de metro na cidade de São Paulo chegaram a ficar, respetivamente, interditadas e fechadas, quer pela presença de manifestantes, quer pelos confrontos dos autores dos protestos com a polícia. As primeiras intenções eram as de barrar os acessos ao Itaquerão. As autoridades não o permitiram.

Em vários casos, o carácter mais do que unívoco destas manifestações faz com que protestos inicialmente pacíficos com motivações sociais (e políticas) se transformem em confrontos violentos e distúrbios de cariz anárquico aproveitados por grupos mais radicais – os chamados «black blocs». Na sequência dos confrontos em São Paulo houve dois detidos e 11 feridos – dois deles uma repórter e uma produtora da «CNN».



No Rio de janeiro, uma manifestação com um milhar de pessoas contra a realização do Mundial fazendo reivindicações de direitos sociais através de ativistas políticos começou pacífica, mas terminou com confrontos com a polícia. Houve três detenções e, à hora do jogo do Brasil, três centenas protestaram em frente ao FIFA Fan Fest de Copacabana.

A FIFA voltou a ser alvo das palavras de ordem de algumas centenas de manifestantes em Porto Alegre, cujos atos degeneraram no vandalismo sobre estabelecimentos comerciais. Moradores das zonas abrangidas mostraram-se contra estes protestos, houve troca de insultos entre quem vestia a camisola canarinha e os contra a Copa – reflexo de um país que está de ideias dividas e com a polícia a cavalo nas ruas para arbitrar os acontecimentos.

Em Belo Horizonte, cerca de quatro centenas de manifestantes foram dispersados por balas de borracha e gás lacrimogéneo quando se preparavam para invadir a praça onde está o Relógio da Copa. Dois repórteres fotográficos saíram feridos do meio dos confrontos na capital de Minas Gerais. Em Fortaleza, voltaram a ser os movimentos sindicais a comandar as movimentações dando uma garantia à presidente do Brasil: «Dilma escuta, a Copa vai ter luta».

E as autoridades federais, não obstante estarem impedidas pela justiça brasileira de fazerem greve, já tem manifestações prometidas como resposta ao veto do congresso brasileiro quanto ao aumento dos seus ordenados. As Fan Fests (promovidas pela FIFA para os adeptos que não vão ao estádio desfrutarem os jogos) já passaram pelo incidente do Rio de Janeiro e os polícias federais ameaçam também manifestar o seu desagrado nestes espaços.



A chegada dos adeptos ao Itaquerão, em São Paulo, acabou por se fazer de forma tranquila apesar das movimentações na zona leste da cidade – pois, num raio de dois quilómetros, só prosseguiam as pessoas com bilhete para o jogo. Mas, já dentro do estádio, o ambiente voltou a não ser amistoso para com Dilma Rousseff. Nem para com a FIFA.

A presidente do Brasil e Jospe Blatter (acompanhados de Ban ki-Moon) foram brindados com insultos (irrepetíveis neste espaço) antes e depois da cerimónia de abertura do Mundial. Já se disse, o Brasil venceu, mas a insatisfação está muito presente e Dilma voltou a ser insultada quando apareceu nos escrãs gigantes a festejar o segundo golo de Neymar que pôs os canarinhos na frente do marcador.

Este protesto contra as instituições já se tinha verificado na abertura da Taça das Confederações no ano passado, quando Dilma Rousseff e Josep Blatter usaram da palavra. Desta vez, a FIFA e o comité de organização decidiram que não haveria discursos de circunstância (para evitar mais destes problemas) e decidiram-se pelo lançamento de três pombas brancas por três jovens antes do apito inicial do árbitro.

E o primeiro pontapé de saída do jogo, feito para ser simbólico, também acabou por merecer críticas. Foi dado por um paraplégico dentro de um exoesqueleto desenvolvido por um cientista brasileiro. O momento de orgulho nacional quase passou despercebido no processo mediático de inauguração da Copa. O que não agradou.




Começou aos solavancos o Mundial do Brasil, lá está. Salvou-se para os brasileiros a vitória da sua seleção. Para trás ficaram os limites de tempo impostos pela FIFA que cortaram o hino do Brasil – continuaram os adeptos nas bancadas. O Campeonato já está em curso, mas, por enquanto, joga-se sobre brasas – algumas, como se viu, incandescentes. E o mote de que as coisas não iam começar bem viu-se logo dado pelo incêndio no estádio algumas horas antes a festa.