Quarenta segundos.

Foi esse o tempo que durou a estreia de Lionel Messi com a camisola da seleção nacional da Argentina. E não foi por ter entrado em cima do apito final. A 17 de agosto de 2005, durante um particular com a Hungria, o selecionador Jose Pekerman lançou o prodígio que tinha encantado o planeta no último Mundial sub-20. Entrou a substituir Lisandro López, jogador do FC Porto na altura, e não perdeu tempo a protagonizar uma das suas temíveis arrancadas. O húngaro Vanczák agarrou-lhe a camisola, Messi tentou libertar-se e acabou por atingir, involuntariamente, o rival na face. O árbitro, Markus Merk, viu maldade e expulsou-o.

Quase 11 anos depois (tecnicamente 10 anos e 10 meses), ainda antes de chegar aos 30 de vida, Messi diz adeus à seleção. A derrota nos penáltis frente ao Chile na edição centenária da Copa América foi, segundo o próprio, a gota de água. São quatro finais perdidas, três em anos consecutivos. «É demais para mim. Já chega». O desabafo ecoou pelo mundo entre ondas de choque, revolta e indignação.

Messi diz que é o fim, nem todos acreditam e esperam vê-lo, pelo menos, no Mundial da Rússia, daqui a dois anos. Cenas para os próximos capítulos. Para já, importa perceber o que representou o avançado do Barcelona para a albiceleste. Porque nem sempre foi pacífica a presença de Messi na sua seleção. O peso que sempre carregou foi enorme e, desta vez, atirou-o ao chão.

Argentino porque fez questão

Messi tinha 13 anos quando deixou a Argentina natal para rumar a La Masia, a famosa Academia de futebol do Barcelona. A viver em Espanha desde tão tenra idade, naturalmente despertou a atenção da Federação local que, sobretudo pela insistência de Carles Rexach, tentou que optasse por defender 'La Roja'. Nada feito.

«Sou argentino», terá dito Messi. O sonho de vestir a camisola dos seus ídolos de infância falou mais alto e nem hesitou. Em junho de 2004 começou a jogar na seleção sub-20 argentina, um ano antes de ser a grande figura do Mundial da categoria, ganho na Holanda: melhor jogador e melhor marcador de uma prova em que começou como suplente.

Veio então o tal jogo da estreia pelos AA e o arranque em falso, de tal forma que Messi gosta de considerar o jogo com o Paraguai, em setembro, como o primeiro. A chamada «re-estreia».

Pekerman foi o selecionador no Mundial 2006 e Messi o mais novo entre os eleitos. Jogou, marcou à Sérvia e Montenegro numa goleada de 6-0, ainda na fase de grupos e deixou água na boca dos argentinos que gostavam de tê-lo visto em campo no jogo que ditou o adeus, às mãos da Alemanha, nos quartos de final.

Messi a render Saviola no Mundial 2006

Por esta altura, a afirmação de Messi no Barcelona tornavam-no figura incontornável também na seleção. Estava a nascer um futuro melhor do mundo e, mais do que nunca, a Argentina via aparecer um verdadeiro herdeiro de Maradona quando tantos outros falharam. Ainda não vestia a camisola 10, mas a cada jogo parecia ficar-lhe mais à medida.

Nem a derrota na final da Copa América 2007, frente ao Brasil, por 3-0, abalou a confiança do povo naquele que era já um dos seus maiores ídolos. Foi a primeira de quatro finais perdidas por Messi e, mesmo sendo contra o velho rival, provavelmente a mais surpreendente de todas, já que o Brasil que esteve naquele torneio era visto como uma equipa de segunda linha, sem várias das suas principais estrelas. Foi suficiente, porém.

Da união a Maradona à primeira tentativa de abandono

O apuramento para o Mundial 2010 ficou marcado por muito sofrimento na Argentina. O homem chamado para a qualificação foi nada menos do que Diego Armando Maradona. Um golpe de fé que juntava génios de duas gerações. A qualificação foi, como se disse, má e apenas resolvida no último jogo. No Mundial a esperança era Messi pela emular o feito dos campeões de 86 onde o, agora, treinador brilhava em campo.

Mas a Argentina volta a cair nos quartos de final, novamente com a Alemanha mas agora vergados a uma goleada de 4-0. Messi despede-se da África do Sul sem um golo sequer e a frustração acumula. A relação com Maradona detiora-se a ponto de o ex-jogador ter sido apanhado, recentemente, a dizer que falta capacidade de liderança ao capitão. A somar a isso chegam as críticas do próprio público que não entende como alguém que marca tanto no Barcelona pode ser diferente na seleção.

Maradona construiu uma equipa à volta de Messi mas não chegou

Em 2011, de resto, já com quase dois anos de seca de golos surge a primeira ameaça de abandono da seleção. É Alejandro Sabella, selecionador até ao Mundial do Brasil, que vai, pessoalmente, falar com Messi e convencê-lo a mudar de ideias. Com sucesso.

Ficou famoso, na altura, um conselho que Guardiola teria dado a Sabella para aprender a lidar com Messi. Nunca confirmado mas trazido à estampa pela imprensa catalã, normalmente bem informada: «Entende os silêncios dele, constrói uma equipa à volta dele, dá-lhe a bola e nunca, nunca, o substituas.»

Três finais perdidas em três anos até ao adeus

Em 2014, no Brasil, inicia-se, então, o ciclo negro que ditou o adeus. A Argentina nem sequer pratica um futebol de encantar mas chega à final no torneio que se jogava em casa do rival de sempre. Perde-a no prolongamento, com a Alemanha. Messi leva, de forma controversa, o troféu de melhor jogador da prova. Prémio de consolação.

A verdade é que a derrota, numa final em que a maior surpresa até foi a Argentina chegar à final, não teve nem metade do peso das duas que se seguiram. Ambas na Copa América, ambas nos penáltis, ambas frente ao Chile.

E se, em 2015, ainda houve o contra de jogar em casa do rival, desta feita tudo foi mau. A Argentina parecia mais favorita, o Chile ficou cedo a jogar com dez, mas nada desatou o nulo. Depois, o primeiro penálti perdido foi chileno e quando Messi avançou para a bola, havia a oportunidade de passar para a frente e ganhar vantagem moral. Tudo voou.

Messi numa lista com Cruyff, Di Stéfano ou…Ronaldo (para já)

Se Messi não voltar mesmo a jogar pela seleção argentina vai engrossar uma lista já longa de grandes figuras do futebol mundial que, mesmo tendo representado seleções capazes de disputar títulos nunca lá chegaram.

Johan Cruyff é um nome óbvio. Disputou a final do Mundial de 1974 mas perdeu para a Alemanha. Dois anos depois foi afastado nas meias-finais do Europeu pela Checosloáquia, nos penáltis.

Já antes, a lenda do Real Madrid Di Stéfano tinha passado ao lado dos títulos a nível de seleções, tal como mais tarde com o brasileiro Zico, o ‘Pelé branco’, ou o italiano Roberto Baggio, que, curiosamente, também perdeu um troféu nos EUA, na final e depois de atirar um penálti por cima…

É impossível ainda não lembrar os portugueses Eusébio e, claro, Cristiano Ronaldo, embora este tenha um ponto a seu favor. Quando alguém disser que nunca venceu nada na seleção, pode sempre responder com um…ainda.