Nem a Red Bull, nem irmãos Glazer. Aqui, é futebol no seu estado mais puro.

No último fim-de-semana, ingleses e austríacos defrontaram-se não numa partida antecipada da jornada europeia mas num jogo verdadeiramente amistoso. Podia ser o Manchester United de José Mourinho e das estrelas Ibrahimovic, Pogba e Rooney a encarar o Red Bull Salzburgo, tricampeão austríaco. Porém, o palco não era o mítico Old Trafford, mas um teatro mais modesto e sem sonhos de grandeza.

No Broadhurst Park, em Moston, a uns 10 quilómetros do centro da cidade de Manchester, o FC United venceu o SV Austria Salzburg por 3-0 perante 1 562 espetadores. Uma assistência modesta, mas apaixonada, e com três centenas de adeptos que viajaram da Áustria para uma celebração entre duas equipas de futebol especiais.

Os dois clubes têm uma história comum. Ambos nasceram em 2005 quando um grupo de adeptos entendeu os grandes grupos económicos não deviam ser proprietários e controlar os destinos dos clubes que sempre apoiaram.

«O clube é dos adeptos?». Não é essa uma das conceções mais repetidas no futebol? Pois bem, um grupo de dissidentes levou-a à letra quando os magnatas norte-americanos Glazer comprou o Manchester United, criando o FC United of Manchester. Tal como aconteceu precisamente no mesmo ano com os indefetíveis do SV Austria Salzburg, que criaram outra agremiação desportiva com o nome e as cores originais do seu clube 1933, quando este foi adquirido pela multinacional de bebidas energéticas Red Bull.

O Maisfutebol chegou a conhecer in loco a incrível história do United FC, e mostrou-lhe que apesar das relações inexistentes entre os dois emblemas a maioria dos adeptos continua a apoiar o clube de origem.

Desde a visita da nossa reportagem (em 2009), FC United construiu o próprio estádio, com uma lotação de 4 400 espetadores e um custo de 8 milhões de euros, inaugurado em maio de 2015.

Neste momento, o clube milita na National League North, na sexta divisão inglesa.

Fora de campo, o clube destaca-se por ações de solidariedade como a que promoveu na passada quadra natalícia ao abrir o estádio a sem-abrigo.

Mais sucesso desportivo tem tido o Áustria Salzburgo, que começou no sétimo nível do futebol do seu país e na época passada chegou à Erste Liga, segunda divisão, tendo sido despromovido este ano à Liga Regional Oeste, série do terceiro escalão austríaco.

O sucesso desportivo, porém, levou o clube a endividar-se em quase um milhão de euros, de modo a aumentar o orçamento para reforçar o plantel. Além disso, o pequeno estádio de 1 600 espetadores não se coaduna com as exigências de segurança das ligas profissionais em jogos de maior risco, pelo que o clube foi multado em 40 mil euros e penalizado em seis pontos.

Estas situações levaram o Salzburgo a ponderar, sem sucesso, vender 51 por cento do seu capital, com a condição de manter o emblema histórico e as suas cores: violeta e branco.

Independentemente das dificuldades, United FC e Austria Salzburgo mantém-se vivos pela paixão dos adeptos, que no último fim-de-semana se enfrentaram numa espécie de celebração contra o futebol moderno.

Sam Sheridan, Kieran Glynn, considerado o homem do jogo, e George Thomson fizeram os golos que valeram a vitória (3-0) dos ingleses no jogo particular de sábado. O resultado, porém, é o menos relevante. Como no futebol dos velhos tempos, após o jogo, adeptos das duas equipas passaram a noite a conviver: cantando e bebendo. Não Red Bull, certamente.