A dimensão universal de Eusébio está muito para lá dos números. Mas estes ajudam a percebê-la, a enquadrar o verdadeiro fenómeno que foi o avançado do Benfica e da seleção nacional. Não apenas no seu tempo: em todos os tempos. 
 
A sua passagem pelo Benfica, com estreia oficial a junho de 1961 e despedida em março de 1975, traduziu-se nos seguintes títulos maiores: 11 vezes campeão nacional, 5 Taças de Portugal e 1 Taça dos Campeões. No plano individual, destacam-se 1 Bola de Ouro, em 1965, 2 Botas de Euro (em 1968 e 1973), a que se deve juntar, com a seleção, o título de melhor marcador no Mundial de 1966.
 
Ao serviço dos encarnados, soma 473 golos em 440 jogos oficiais. Desses, 50 foram conseguidos frente aos grandes rivais, Sporting (26) e FC Porto (24).  Na I divisão, Eusébio marcou 320 golos em 313 jogos: 317 em 301 jogos pelo Benfica, 3 em 12 jogos pelo Beira-Mar, na temporada de 1976/77, depois de um périplo em fim de carreira pelo futebol dos Estados Unidos, México e Canadá. 
 
A contabilidade do total de golos oficiais não é precisa, devido a esses jogos no continente americano, mas é consensual que Eusébio marcou mais de 700 golos oficiais, entre eles uma dezena apontados em jogos da seleção do Resto do Mundo, organizados pela FIFA (dois golos) ou pela UEFA (oito). É, ainda hoje, o recordista de golos na Taça de Portugal, com 97 tentos. E tem uma sequência que muito dificilmente será igualada em Portugal: 32 golos em 17 jogos consecutivos, entre maio e agosto de 1962.
 
Eis o registo de golos de Eusébio pelo Benfica, na I divisão:
 
1960/61: 1 jogo/1 golo
1961/62: 17/12
1962/63: 24/23
1963/64: 19/28
1964/65: 20/28
1965/66: 23/25*
1966/67: 26/31
1967/68: 24/42**
1968/69: 21/10
1969/70: 22/21
1970/71: 22/19
1971/72: 24/19
1972/73: 28/40**
1973/74: 21/16
1974/75: 9/2
 
A negro, as épocas em que foi melhor o marcador da Liga
*Em igualdade com Figueiredo (Sporting)
** Bota de Ouro para melhor marcador europeu
 
Balanço de jogos pelos encarnados: 221 vitórias, 51 empates, 29 derrotas.
 
Rei na Europa dos anos 60
 
De recorde em recorde, Eusébio fez história. É a grande referência do futebol europeu na década de 60, entre o ídolo Di Stefano, que o precedeu na glória, e o herdeiro Johann Cruijff, que dele recebeu o testemunho para para dominar a década seguinte.

Impulsionado pelo talento de Eusébio e por uma geração que sem ele tinha surpreendido o mundo com a vitória na final de Berna, em 1961, o Benfica tornou-se na grande equipa europeia, chegando a cinco finais em oito anos. Os golos estavam a cargo do Pantera (como passaram a chamar-lhe os ingleses), ou do King, como os companheiros ainda hoje o tratam. Na Taça dos Campeões somou 46, no conjunto das três provas, 57. O único jogador dos encarnados a marcar cinco num jogo, o primeiro a fazer um «hat-trick». Tendo jogado muito, muito antes, de haver fase de grupos e temporadas com 17 jogos europeus, ainda hoje integra o top 10 dos melhores marcadores da Taça dos Campeões - é nono, atrás do seu ídolo de sempre, Di Stéfano – e do conjunto das provas europeias. Um fenómeno.

Eusébio não participou na conquista do primeiro título, mas estreou-se ainda nesse mágico 1961, com 19 anos e nove meses. Fez 75 jogos, durante mais de 13 anos. Somou 30 partidas consecutivas a titular, é o terceiro jogador com mais vitórias na história europeia dos encarnados.

Depois da estreia internacional avassaladora, em Paris – três golos ao Santos em 45 minutos – percebeu-se depressa, no balneário, que a frente de ataque tinha de mudar para entrar «o menino», como lhe chamava Bela Guttmann. Alguém tinha de ser sacrificado, foi Santana.

O ponto mais alto do trajeto europeu de Eusébio aconteceu com apenas vinte anos: a vitória por 5-3, em Amesterdão, sobre o Real Madrid, do ídolo Di Stéfano. Marcou dois golos, os dois últimos dessa final, que pode recordar aqui.



Seguiram-se mais três finais, perante Milan, Inter e Manchester United. Não se traduziram em títulos, apenas no reconhecimento do estatuto na Europa e no resto do Mundo, em especial depois da campanha da seleção, no verão de 1966.

Época após época, mesmo sendo começando a ser martirizado pelas lesões, o King continuou imparável. Repetiu os dois golos ao Real Madrid em 1964/65 na mágica goleada por 5-1, na Luz, que definiu como a melhor exibição da sua carreira. Decidiu quase sozinho as meias-finais com a Juventus, em 1967/68 e atingiu o máximo de cinco golos em 1970/71 com o Olimpija Ljubljana. Pelo meio, um fantástico momento de inspiração, talvez o seu melhor golo, como o próprio reconhece, frente ao La-Chaux-de-Fonds (1964/65).

Desde muito cedo os joelhos começaram a atraiçoá-lo. O esquerdo não lhe dava descanso. As cirurgias sucediam-se. Mas nem assim os adversários conseguiam pará-lo. «Mesmo com as operações a que foi submetido, continuava a ser muito difícil de travar. Lembro-me que apesar das dificuldades em fletir o joelho continuou a fazer muitos golos. Era um fenómeno», lembrava Jaime Graça em depoimento ao Maisfutebol.

De jogo em jogo, de golo em golo, Eusébio e o Benfica fizeram juntos a viragem para a década de 70. A ligação à Luz não seria interrompida, apesar de várias propostas milionárias recusadas. A evolução do futebol e o aparecimento de novas potências atenuaram a força dos encarnados nas provas internacionais. Veio o ciclo do Ajax, de Cruijff e Michels. Depois o Bayern, de Beckenbauer e Müller, quando o Rei já procurava um final de carreira que o recompensasse por tudo o que havia dado ao clube. Em 1975 partiu enfim para os Estados Unidos, capitalizando um prestígio universal.

Assinando 57 dos 613 golos europeus do Benfica, Eusébio encerrou a carreira internacional em março de 1975, com o PSV, justamente na única temporada em que não marcou. Entre o primeiro, ao Áustria de Viena, e o último, ao Ujpest, foram 12 anos de proezas, assim distribuídas:

1961/62: 5 golos
Áustria Viena, Nuremberga (2), Real Madrid (2).

1962/63: 6 golos
Norrkoping (4), Feyenoord e Milan

1963/64: 4 golos
Distillerry (3) e Dortmund

1964/65: 9 golos
Aris (3 golos), La Chaux de Fonds, Real Madrid (3), Vasas (2),

1965/66: 7 golos
Dudelange (4 golos), Levski Sófia (3)

1966/67: 4 golos
Spartak Plovdiv (2), Lokomotiv Leipzig (2)

1967/68: 6 golos
Glentoran, St Étienne, Vasas (2), Juventus (2)

1968/69: 1 golo
Valur

1969/70: 4 golos
KB Copenhaga (3), Celtic

1970/71: 7 golos
Olimpija Ljubljana (6), Vorwärts Berlim

1971/72: 1 golo
Wacker

1972/73: 2 golos
Malmö (2)

1973/74: 1 golo
Ujpest

Até hoje, pelo mundo fora, é muito restrito o grupo dos que se lhe podem comparar. Quem não o viu em ação terá sempre a possibilidade de consultar os números, para o confirmar. Mas as homenagens de que foi alvo neste domingo triste, e os aplausos que recolhia em qualquer país que visitasse, são a melhor demonstração de que a eternidade não se mede em estatísticas. E vale mais que todos os recordes do Rei.