Manuel António, do acampamento da tropa para o Jamor
Nos relvados, era avançado, na tropa atirador. Um golo perto do fim da final de 69 deixou a Briosa a sonhar, mas Simões e Eusébio tiraram a Taça aos estudantes
Foi a melhor época de sempre de Manuel António, avançado da Académica, estudante como todos os outros da altura no plantel. Em 68/69, conquistou a bola de prata e ajudou a equipa a voltar ao Jamor, onde, por instantes deixou a Briosa com as mãos na Taça... antes de Simões empatar a contenda (a cinco minutos do fim), e Eusébio resolver já no prolongamento.
Esta poderia ser a história de um avançado bem-sucedido, convertido depois em dirigente e médico do clube, não fosse a inusitada situação em que disputou essa célebre temporada: na tropa. «Estive primeiro nas Caldas da Rainha, depois em Tavira e em Mafra. Fazia bastante ginástica, mas tinha de treinar-me sozinho, ao fim do dia, dar mais umas corridas. Jogava ao fim-de-semana e voltava ao quartel», conta, ao Maisfutebol.
PUB
O pior foi, quando ainda no Algarve, tinha de ir jogar, por exemplo, ao Porto. «Lembro-me de ter voltado de avião para Lisboa e depois apanhei um táxi para Tavira. Quando ouviu o destino, o motorista ficou a olhar para mim e deve ter pensado: este é maluco. Cheguei às seis da manhã e ainda fui para as marchas, a dormir claro. Foi uma época incrível. Resisti a tudo e sobrevivi!»
A tropa, sempre presente, livrou-o, todavia, de alguma efervescência social e contestação à ditadura. «Não vivi esse ano a fundo porque o passei quase todo no exército. Só ao fim-de-semana tomava conta da situação. Ainda fui chamado pelo comandante, porque sendo militar não podia estar envolvido em quaisquer manifestações contra o regime. Mas ninguém me fez mal.»
No Jamor graças ao coronel Totobola
Corria de feição a temporada à Académica - curiosamente, tal como a atual, com resultados bem mais positivos na Taça do que no campeonato - , e eis-nos chegados ao Jamor. Desta feita, o périplo do goleador não começou no quartel como acontecia na véspera dos outros jogos: e estava no acampamento militar, nas chamadas marchas finais para tirar a especialidade, atirador de infantaria. Até na tropa jogava ao ataque...
PUB
«Era preciso pedir autorização ao comandante do quartel de Mafra para me ausentar. Na altura, quem me safou foi o coronel Totobola. Não me pergunte qual o nome dele, que nunca o soube. Aliás, nunca mais o vi. Era adepto da Académica e seguramente que alguém da direção do clube solicitou os seus bons ofícios. Passei de uma tenda para um hotel na margem sul, nada mau!», recorda.
Na final, fez jus à eficácia, e colocou a Briosa na frente do marcador a nove minutos do fim, um «bom golo», com parada no peito e remate à meia-volta. Suspense. «Depois, houve um livre, batido pelo Eusébio, o Viegas [guarda-redes] defendeu para a frente e o Simões, sempre à espreita, fez a recarga. Seguiu-se o prolongamento e o Eusébio fez o segundo para o Benfica.»
O pantera negra, justamente, foi preponderante no jogo. Como quase sempre. «Era um grande jogador. Era importante. Marcava a diferença. Mas não foi um jogo desequilibrado. Tínhamos muito boa equipa. Eliminámos o Sporting nas meias-finais e jogámos sem stress, não tínhamos medo das melhores equipas. Quando entrávamos em campo, aquilo era tudo nosso», assevera, com um brilho nos olhos.
PUB
«Domingo, tudo é possível»
Chegamos a 2012. Volta a haver Académica no Jamor. O adversário também é favorito. Pode a história ser outra? «Pode, pode sim. Tudo é possível. Não é um campeonato. É um só jogo. Não há que ter medo do Sporting. Tivemos uma ponta final moralizadora, duas vitórias, a Liga Europa¿ Uma final traz sempre um cenário de dúvida até ao fim», defende.
«Só a chuva é que me está a aborrecer. Ainda por cima, não há grandes condições lá para nos abrigarmos.» O lamento é prontamente contrabalançado pelo jornalista. E se for como uma boda molhada? «Olhe, bem visto!», concluiu o atual administrador do IPO de Coimbra, que será dos adeptos mais fervorosos nas bancadas do Jamor.