A segunda vitória de Portugal neste Europeu – a primeira conseguida nos 90 minutos – foi também o primeiro jogo na era Fernando Santos ganho por mais de um golo de diferença. Os momentos em que os golos chegaram, bem cedo na segunda parte, e a vocação de controlo que este seleção sempre assumiu simplificaram a tarefa e fizeram desta meia-final o jogo menos sofrido de Portugal desde o início da prova.

Os números ilustram essa realidade, desde logo pelo facto de, após uma primeira parte de muita posse no meio-campo contrário, Portugal ter, depois do 2-0, recuado as linhas e consentido um domínio territorial ao País de Gales para explorar saídas rápidas – que estiveram perto de resultar no 3-0.

Foi a primeira vez em que Portugal dispôs de uma vantagem confortável para gerir, e fê-lo bem: o País de Gales, que por força dessa meia hora acabou o jogo com mais posse bola do que Portugal, só visou a baliza portuguesa em duas ocasiões, e apenas uma delas com perigo – na defesa de Patrício a um remate de longe do inevitável Bale (76 min).

Nos 90 minutos, o País de Gales rematou nove vezes, mas só três enquadradas com a baliza – enquanto Portugal teve exatamente o dobro de tentativas (18 no total e 6 na baliza). Outra diferença, que aproximou o domínio português do exercido nos jogos da primeira fase, foi a paciência na procura de espaço de remate: apenas três tiros contra o bloco defensivo galês, metade da média portuguesa de remates bloqueados neste torneio.

Dez dos 18 remates lusos foram conseguidos dentro da área, o que demonstra, pelo menos na segunda parte, depois de um primeiro tempo bastante estéril, uma construção mais elaborada – em especial pelo dinamismo trazido à ala esquerda pelo regresso de Raphael Guerreiro, que combinou bem com João Mário e teve participação nos dois golos.

Outro aspeto importante para a segurança na gestão da partida – até porque as bolas paradas eram um ponto muito forte no arsenal do País de Gales, foi o reduzido número de faltas cometidas (dez ao todo, contra 12 dos galeses) e, principalmente, o número mínimo de cantos consentidos: apenas dois, número que limitou os estragos das movimentações coletivas para libertar Williams e Bale, e que tanta mossa tinham feito à Bélgica.

Aliás, acabou por ser o Pais de Gales a provar do próprio veneno, já que o primeiro golo de Portugal nasceu de um pontapé de canto cobrado curto. A qualidade do cruzamento de Raphael Guerreiro fez uma parte do trabalho, o tempo de impulsão e suspensão de Cristiano Ronaldo tratou do resto. Foi o segundo golo de Portugal neste Euro resultante de um pontapé de canto, depois do 3-3 conseguido por Ronaldo diante da Hungria.

As faltas foram quase sempre cometidas longe da zona-Bale, como o demonstra o facto de o estreante Bruno Alves (o 21º jogador a ser utilizado nesta fase final) ter sido o único elemento do quarteto defensivo a incorrer em faltas (três), com as outras faltas a serem distribuídas por Ronaldo, João Mário, Renato Sanches e Adrien, em zonas mais adiantadas.

Por força dessa gestão da vantagem – e também de algum abuso de passes longos na primeira parte - este foi o jogo do Europeu em que Portugal tentou menos passes (apenas 406, quando o normal era superar os 500), e o segundo com menor acerto (83%).

Portugal acabou o jogo recorrendo mais aos passes longos do que a seleção galesa (14%). Depois de uma primeira parte em que Bale conseguiu alguns espaços para arrancadas, procurando Danilo para situações de um para um, este foi o jogo em que Gales foi obrigado a jogar um futebol mais curto e apoiado, batendo o seu máximo de passes num só jogo (517). Mas sem Ramsey para criar movimentos de rotura e com Joe Allen bem anulado pela marcação de Adrien, foi uma seleção galesa privada dos seus melhores trunfos, aquela que tentou anular uma desvantagem de dois golos, rondando a área portuguesa sem grandes argumentos.

Globalmente, os jogadores portugueses correram mais três quilómetros do que os de Gales – mas acima de tudo correram melhor, nas zonas onde a pressão era mais relevante. A conclusão desta história é um pouco contrastante com o que tem sido o percurso de Portugal com Fernando Santos: apesar de a segurança na posse de bola ser a chave do planeamento tático desta seleção, foi num dos jogos com menor eficácia de passe e com menor intensidade de circulação que a vitória chegou da forma mais segura. E, paradoxalmente, foi no capítulo em que Gales levou mais claramente vantagem durante todo o jogo (72-28% nos duelos aéreos) que Portugal descobriu que o caminho para Paris começava na cabeça de Cristiano Ronaldo.

Estatísticas do jogo

PORTUGAL-PAÍS DE GALES

Remates: 18-9

Remates na baliza: 6-3

Cantos: 6-2

Faltas cometidas: 10-12

Recuperações: 31-35

Desarmes 4-3

Posse de bola: 44%-56%

Passes tentados: 406-517

Passes conseguidos: 335-458

Eficácia de passe: 83%-89%

Duelos aéreos: 28%-72%