*Por António Guimarães

Diz a sabedoria popular que «não se deve voltar a um lugar onde se foi feliz». Com o regresso de Zinedine Zidane, apenas nove meses depois de anunciar a sua saída, tentamos perceber o que diz a história sobre os retornos de treinadores, numa análise que visita algumas das maiores figuras do futebol internacional, não deixando de lado Benfica, FC Porto e Sporting.

O técnico francês regressa a um lugar onde criou um ciclo, no qual o Real Madrid venceu três Ligas dos Campeões, um recorde no formato atual da competição. Zidane deixou o banco no final da época passada, alegando a necessidade de uma mudança.

«A equipa precisa de uma mudança para continuar a ganhar, precisa de outra metodologia de trabalho», disse então o gaulês.

Seguiu-se Lopetegui, que não convenceu, enquanto Solari já se sabia que estava a prazo. Por isso, e apenas nove meses depois da saída, Zidane regressou.

Ora vale a pena dizer desde já que esta não é uma estratégia assim tão incomum no mundo do futebol. Grandes equipas europeias optaram por fazer regressar treinadores, e é isso que aqui exploramos.

De bom a mau

Falta o vilão para completar a história de Sergio Leone, mas Ennio Morricone bem poderia fazer esta banda sonora. Começamos em Espanha, no icónico Barcelona. No verão de 1997, chegava à Catalunha Louis van Gaal, que seria acompanhado de José Mourinho.

De futebol progressista, o técnico holandês conseguiu levar o Barcelona à conquista do bicampeonato, ganhando também uma Taça do Rei e uma Supertaça Europeia pelo meio. Uma terceira época menos conseguida ditou a saída de Van Gaal no ano de 2000. Em 2002 (já sem José Mourinho, que iniciava a caminhada triunfal com o FC Porto), o holandês regressou com a promessa de devolver o título aos blaugrana. Não aconteceu, e as partes seguiram caminhos diferentes.

Em Inglaterra, um tal de Sir Kenny Dalglish é uma autêntica lenda viva, sobretudo em Anfield Road. Para os adeptos do Liverpool, o escocês é uma espécie de semideus. Já com uma fulgurante carreira como jogador, Dalglish passou a acumular a função de treinador em 1985, conjugando-as durante cinco anos, até pendurar as botas, em 1990.

Nessa primeira passagem, o escocês ajudou o Liverpool a pintar um dos excelentes períodos da sua história, conquistando três campeonatos, duas Taças de Inglaterra e quatro Supertaças daquele país. Em 1991, Dalglish deixou o Liverpool, e é, ainda hoje, o último campeão pelos Reds (1989/90).

Por isso, quando em 2011 a direção do clube anunciou o regresso da lenda, os fãs ficaram satisfeitos. Mas aquele Liverpool era bem diferente, o próprio futebol já era diferente, e o escocês abandonou o clube no fim da época, tendo conquistado apenas uma Taça da Liga.

Em Itália a história multiplica-se, não faltam treinadores que regressaram aos anteriores clubes. Foi a realidade do Milan, clube no qual por duas vezes correu mal. Arrigo Sacchi foi uma escolha pessoal de Silvio Berlusconi e assumiu o comando técnico dos milaneses, criando uma verdadeira história de sucesso.

Em quatro épocas como treinador dos Rossoneri, Sacchi conquistou uma Liga italiana, duas Ligas dos Campeões, entre outros troféus. Regressaria em 1996, mas sem o mesmo sucesso: a má época do Milan precipitou a saída do italiano.

A direção do Milan voltou, de resto, a utilizar a mesma estratégia anos mais tarde. Neste caso com Fabio Capello. Assumiu a equipa em 1991, depois da saída de Sacchi, dando uma clara hegemonia ao Milan, que sob a sua égide conquistou quatro Ligas italianas e uma Liga dos Campeões. Substituiu Sacchi em 1991, voltaria a ocupar o seu lugar em 1997, mas tal como o compatriota, ficou apenas uma época em San Siro, não tendo conquistado qualquer troféu.

A mesma cidade, o mesmo estádio, a mesma história. No ano de 2004, Roberto Mancini era o senhor do banco do Inter de Milão. Nos quatro anos seguintes, o italiano criou a hegemonia no futebol italiano, com a conquista de três campeonatos, duas taças de Itália e duas supertaças. Regressado em 2014, para um Inter arredado dos títulos, Mancini bem tentou, mas desta vez não correu bem. O técnico acabou por sair sem qualquer título.

Falar de Inter e Milan lembra-nos a Juventus. Claro, também a Vecchia Signora assumiu a mesma conduta quando em 1991 fez regressar Giovanni Trapattoni. No início de carreira, a «velha raposa» passou 10 anos (1976/86) em Turim, nos quais conquistou seis Ligas italianas, uma Liga dos Campeões, uma Taça UEFA, uma Taça das Taças, duas Taças italianas, uma Supertaça Europeia, uma Supertaça italiana e uma Taça Intercontinental.

Recheado palmarés, portanto, que não se viria a repetir. Trapattoni regressaria, mas em quatro anos não conseguiu mais do que uma Taça UEFA.

À segunda, como à primeira

Também há portugueses nesta história. Em 2004, campeão europeu em título, José Mourinho dizia-se um «Special One». Foram de facto três anos especiais à frente do Chelsea, nos quais conquistou duas Premier League (Chelsea foi campeão 50 anos depois), uma Taça de Inglaterra, duas Taças da Liga e uma Supertaça.

Numa segunda passagem, entre 2013 e 2015, o treinador português não foi tão fulgurante, mas não deixou de conquistar um título inglês e uma Taça da Liga.

Falar de Artur Jorge em Paris é falar de um ídolo. O Paris Saint-Germain, que hoje domina o futebol francês, nem sempre foi o papão da Ligue 1. Em tempo de vacas magras (1991/94), Artur Jorge conquistou um título francês e uma Taça daquele país. Regressaria em 1998, numa época sem o mesmo fulgo, que valeu ainda assim a conquista da Supertaça.

Também em França, Leonardo Jardim escreveu os primeiros passos de um regresso complicado. Depois de uma passagem brilhante no Mónaco, Jardim seria demitido no início da época, para pouco tempo depois regressar. Neste caso, deu-se até algo pouco normal: o regresso aconteceu na mesma temporada da saída.

Quem parece saber a lição é o Bayern de Munique. A segunda passagem de Jupp Heynckes foi mesmo melhor que a primeira. Numa época apenas (2012/13), conseguiu vencer tudo o que havia para ganhar (Bundesliga, Liga dos Campeões, Taça da Alemanha e Supertaça alemã). Na primeira passagem (1987/91), o alemão conquistou duas Ligas e uma Supertaça.

Heynckes voltaria ainda em 2018, para ajudar o Bayern a conquistar o título alemão. Já para Trapattoni, a segunda passagem (1996/98) foi sinónimo de três títulos, entre os quais a Bundesliga, contra zero conquistas da primeira vez (1994/95).

Já falámos de Fabio Capello, mas o italiano parece sentir-se bem com retornos. Dez anos separam as suas duas passagens pelo Real Madrid (1996/97 e 2006/07). Em ambas as ocasiões, o treinador conquistou o campeonato espanhol.

O também italiano Marcello Lippi escreveu uma bonita história na Juventus. No primeiro período (1994/99), o técnico conquistou três Ligas italianas e uma Liga dos Campeões, entre outros troféus. Entre 2001 e 2004, Lippi venceu duas Serie A e duas Supertaças.

E por cá, como é?

O Benfica fez regressar treinadores por oito vezes. O mais recente foi José Antonio Camacho, que de ambas as vezes deixou a Luz de mãos a abanar. O espanhol foi, juntamente com o húngaro Lippo Hertzka, os únicos treinadores que não tiveram bons regressos à Luz: Hertzka somou três Ligas na primeira passagem e nenhum troféu na segunda.

Todos os outros tiveram regressos felizes.

Nomes como Otto Glória, Toni, John Mortimore, Eriksson ou Mário Wilson levaram sempre o Benfica a bom porto. Só Béla Guttmann, apesar do êxito, não conseguiu igualar os feitos, uma vez que tinha vencido duas Taças dos Campeões europeus na sua primeira passagem pelo Benfica.

TREINADOR Primeira passagem Troféus Segunda passagem Troféus Terceira passagem Troféus

BÉLA GUTTMANN

1959-62 2 Ligas, 2 Taças Campeões, 1 Taça Portugal 1965-66 Nada    
OTTO GLÓRIA 1954-59 1 Liga, 3 Taças de Portugal 1968-70 1 Liga, 2 Taças de Portugal    
LIPPO HERTZKA 1935-39 3 Ligas  1947-48 Nada    
MÁRIO WILSON 1975-76 1 Liga  1979-80  1 Taça 1995-96 1 Taça
JOHN MORTIMORE 1976-79 1 Liga 1985-87  1 Liga, 2 Taças de Portugal    
SVEN GORAN ERIKSSON 1982-84 2 Ligas, 1 Taça de Portugal 1989-92 1 Liga, 1 Supertaça    
Toni  1987-89 1 Liga 1992-94  1 Liga, 1 Taça de Portugal  2000-02 Nada
José António Camacho 2002-04 1 Taça de Portugal 2007-08 Nada    

Para o FC Porto, por outro lado, os regressos não se revelaram bem sucedidos. Vaschetto e Reboredo não conquistaram qualquer troféu pelos dragões, em nenhuma das duas passagens, enquanto Joseph Szabo conseguiu um troféu (primeiro campeonato do FC Porto) na sua primeira estadia, não conseguindo qualquer êxito da segunda vez.

Yustrich e Béla Guttmann também são nomes para entrar nestas contas, sendo que o primeiro venceu uma Liga e uma Taça na primeira passagem e apenas uma Taça na segunda, enquanto o segundo não ganhou nada.

A exceção acaba por ser... José Maria Pedroto. A mítica figura teve três passagens pelas Antas, a última das quais com Pinto da Costa como presidente, naquele que começou a ser o desenho daquilo que seria o FC Porto do resto do século.

O último regressado ao banco dos dragões foi Tomislav Ivic, que passou na cidade Invicta nas épocas de 1987/88 e 1993/94: na primeira passagem venceu uma Liga e uma Taça, enquanto na segunda venceu apenas uma Supertaça.

TREINADOR Primeira passagem Troféus Segunda passagem Troféus Terceira passagem Troféus

JOSEPH SZABO

1928 – 35 1 Liga 1945 – 47 Nada    
ELADIO VASCHETTO 1947 – 48 Nada 1951 – 52  Nada    
DORIVAL YUSTRICH 1955 – 56 1 Liga, 1 Taça de Portugal  1957 – 58 1 Taça    
FRANCISCO REBOREDO 1949 – 50 Nada 1959 – 62  Nada    
BÉLA GUTTMANN 1958-59 1 Liga 1973-74 Nada    
JOSÉ MARIA PEDROTO 1966 – 69 Nada 1976 – 80 2 Ligas, 1 Taça 1982 – 84 1 Taça, 1 Supertaça
TOMISLAV IVIC 1987 – 88 1 Liga, 1 Taça de Portugal 1993 – 94 1 Supertaça    
             

O Sporting tem menos tradição, tendo feito regressar apenas três treinadores.

O mais bem sucedido foi o falecido Juca, que ganhou uma Liga e uma Taça pelos leões. Tanto para Manuel José como para José Peseiro, o regresso a Alvalade não foi sinónimo de sucesso.

TREINADOR Primeira passagem Troféus Segunda passagem Troféus Terceira passagem Troféus
JUCA

1961 – 63

1 Liga, 1 Taça de Portugal 1975 – 76 Nada    
MANUEL JOSÉ 1985 – 87 Nada 1988 – 90  Nada    
JOSÉ PESEIRO 2004 – 05 Nada 2018 – 19  Nada