Finalista da velhinha Taça dos Clubes Campeões Europeus no distante ano de 1978, o Club Brugge tem tido uma prestação a roçar a desgraça na edição 2016/17 da moderna Liga dos Campeões. O clube belga, um dos mais antigos daquele país (124 anos), tem agora um duplo confronto com o FC Porto, outra equipa a necessitar de pontos e que até pode estar um pouco mais pressionada pelo estatuto de favorita no Grupo G.

Na verdade, o campeão da Bélgica da última temporada atravessa um período complicado, com várias lesões e maus resultados acumulados nos primeiros meses da nova época. De entre os lesionados, contabilizam-se várias peças fundamentais para a conquista do título em maio passado: os centrais Bjorn Engels e Brandon Mechele, o lateral-esquerdo Laurens de Bock, o extremo José Izquierdo, provavelmente o jogador mais decisivo e irreverente da equipa e o médio ofensivo Lior Refaelov. Em dúvida, na sequência de uma gastroenterite, estão ainda os extremos Felipe Gedoz e Anthony Limbombe e o avançado Abdoulaye Diaby, embora a recuperação destes três jogadores possa ocorrer até à hora do jogo.

O treinador Michel Preud´Homme, antiga glória da seleção belga e do Benfica, tem vivido problemas consideráveis nesta quarta época aos comandos do Brugge. Ao cabo de dez jornadas do campeonato, o campeão encontra-se na sétima posição, com 16 pontos, os mesmos do sexto classificado Standard e a cinco pontos de distância do líder Anderlecht. Mas se no campeonato, até pela existência de um «play-off», a situação não pode ser vista como dramática, já o cenário europeu é bem diferente. Nas duas primeiras jornadas, a formação belga foi copiosamente derrotada pelo Leicester (0-3) e pelo Copenhaga (4-0), resultados que não deixam qualquer margem de manobra para os dois encontros frente ao FC Porto.

Com poucos reforços para a nova temporada (apenas foram recrutados três jogadores de forma cirúrgica: o lateral-direito van Rhijn, o médio-defensivo Tomás Pina e o extremo Limbombe), o Brugge vê-se agora confrontado com a ausência de múltiplas opções para compensar as muitas lesões que têm assolado o plantel. No último desafio do campeonato (derrota por uma bola a zero em Charleroi), aliás, estiveram seis jogadores da formação, quatro delas ainda das reservas, no banco de suplentes, uma prova da necessidade máxima de Preud´Homme num período de maior aperto.

As variantes táticas de uma equipa vertical e com problemas defensivos

ONZE PROVÁVEL

O Club Brugge deverá começar a partida frente aos dragões num sistema tático em tudo semelhante a um 1-4-2-3-1, ou 1-4-3-3 de vocação defensiva. A equipa costuma apresentar algumas variantes consoante os jogos ou diferentes momentos dos jogos, podendo ainda atuar em 1-4-5-1, 1-4-4-2 losango ou até num 1-5-4-1, com o trinco Simons a fazer o papel de terceiro central.

Face a tantas ausências, o mais provável é que Michel Preud´Homme lance os melhores jogadores que tiver ao seu dispor. Na baliza, estará o totalista Ludovic Butelle. A linha defensiva será, muito provavelmente, constituída pelo lateral-direito van Rhijn, pelos centrais Poulain e Denswil e pelo lateral destro adaptado à esquerda, Cools. Simons e Claudemir deverão formar a dupla de médios mais recuados, com Vanaken a descair ligeiramente na faixa direita, Vormer a assumir o papel de médio mais criativo e Bolingoli a fazer a ala esquerda. O avançado escolhido para esta partida será, ao que tudo indica, o internacional belga Jelle Vossen.

A época não tem sido realmente fácil para os campeões belgas e a ausência de jogadores importantes como Izquierdo ou Refaelov condiciona a forma de atacar do Brugge, uma equipa habitualmente mais vertical e incisiva no ataque à profundidade. Por norma, Preud'Homme promove uma certa liberdade nas movimentações dos alas, mas jogando com um médio ofensivo e um lateral de origem adaptados os condicionalismos serão maiores.

Para este encontro, será de esperar um Brugge jogando num bloco médio-baixo, visando as contraofensivas rápidas e um jogo mais direto, na profundidade. Em termos ofensivos, o médio Vanaken pode ser um dos elementos chave, ele que demonstra qualidade ao nível do passe e do remate e consegue transportar a equipa para a frente com bola, jogando agora mais descaído na faixa direita.

Dois exemplos da mobilidade e amplitude que Vanaken dá ao jogo ofensivo do Brugge

A imagem anterior demonstra também o que é uma transição bem gizada do campeão belga: Vanaken sai na condução, deixa para Vossen (que jogou mais descaído na direita na partida de sexta-feira frente ao Charleroi), este devolve a Vanaken, que volta a colocar no número 9, tendo este atirado muito perto da baliza contrária. A mobilidade dos atacantes do Brugge nas saídas e a forma como emprestam largura e atacam a profundidade terão de deixar os defensores portistas em sentido. Apesar de tudo, e sem Izquierdo, velocíssimo e extremamente incisivo a atacar a profundidade, a formação belga perde o elemento mais decisivo no momento atacante, em particular nas transições rápidas. E acaba por perder, por sua vez, qualidade e consistência no processo…

No entanto, o FC Porto não poderá descurar as movimentações sábias de Jelle Vossen, avançado com critério no jogo associativo e com sentido de baliza, bem como a criatividade do holandês Ruud Vormer e do já mencionado Hans Vanaken, elemento que aparece bem em zona de finalização e a velocidade e imprevisibilidade dos alas/extremos Bolingoli e Limbombe, jogadores rápidos e com técnica interessante, embora a viver uma fase prematura das carreiras, o que é de notar nalguma da intermitência que ainda apresentam em certas exibições.

Os (muitos) problemas defensivos e as bolas paradas

A forma como o Brugge baixa várias vezes o seu bloco, não deixando de ser permeável ao jogo associativo dos adversários, ainda assim

Se há setor onde as ausências se têm feito notar de forma acentuada é a defesa. Ainda assim, e mesmo antes de algumas das lesões terem afetado os elementos da zona mais recuada, o Brugge tem vindo a denotar vários problemas a nível defensivo, tanto na organização e transição, como também nas bolas paradas laterais.

A equipa recua as linhas defensiva e de meio-campo em alguns momentos, não conseguindo apesar de tudo limitar os espaços de progressão aos adversários. Há uma tendência a fechar muito por dentro, em determinadas situações, permitindo que a equipa contrária possa explorar a largura e a profundidade nos corredores laterais. O lateral-direito van Rhijn deixa algum espaço nas costas (que pode ser aproveitado por Alex Telles) e, do outro lado, o destro Cools não é propriamente um lateral demasiado seguro, demonstrando assim como van Rhijn propensão para apoiar a equipa em termos ofensivos. As coberturas podem ser garantidas pelos médios-defensivos ou pelos alas, sendo que é de notar que Vanaken, Vormer e Bolingoli se aproximam bastante dos laterais quando o adversário está mais subido e próximo da área do Brugge.

Os médios-defensivos revelam boa coordenação e possuem funções distintas. Enquanto o experiente Timmy Simons é mais posicional e muitas vezes desce para apoiar os centrais ou van Rhijn, Claudemir é mais agressivo e pressionante, saindo ao portador da bola de forma regular. Simons é a «âncora» da equipa, não garantindo ainda assim que o adversário não possa garantir superioridade na zona da entrada da área, por onde se movimentam muitos os avançados portistas, mas também Otávio e Óliver Torres. Será expectável que o Brugge recue de forma progressiva, ficando num sistema bem próximo do 1-4-5-1.

Quanto aos centrais, revelam alguns problemas na leitura de jogo e dificuldades quando o adversário ataca com contundência o espaço por eles «dominado», mesmo tendo em conta o bom jogo aéreo de Poulain e a contundência de Denswil a jogar em antecipação. Este último poderá aliás ser o central a explorar, visto que a tendência para ganhar em velocidade aos atacantes contrários, acaba por expô-lo de forma clara em muitas situações de jogo.

Na imagem anterior, fica bem à vista outra das debilidades desta equipa: a forma como se defendem dos cruzamentos laterais. Os laterais costumam ser algo permissivos nas coberturas e esta cai muitas vezes com facilidade na área do Brugge. Repare-se como o Charleroi foi astuto na exploração desta debilidade do campeão belga, ao colocar quatro homens em zona de finalização na área, com o jogador assinalado com um círculo a antecipar-se bem a Denswil. Este é um exemplo ilustrativo, outros podiam ter sido utilizados, dado que a equipa tem revelado complicações neste tipo de jogadas praticamente desde o arranque da nova época.

A defesa das bolas paradas, em especial cantos, é outra questão problemática para a formação de Brugge. Com uma predominância da marcação individualizada (algo que promove as ações de antecipação por parte dos adversários), a equipa acaba por ser permeável neste tipo de jogadas. Um exemplo prático dos efeitos adversos desta forma de defesa (que se conjuga com uma marcação zonal feita com poucos homens e de forma pouco incisiva na zona do primeiro poste) foi o último jogo na liga milionária perante o Copenhaga. Os terceiros e quarto golos dos dinamarqueses surgiram na sequência deste tipo de lances. Na primeira imagem, em cima, são visíveis as tremendas facilidades com que Santander se deparou para atacar o lance, fugindo sem grande oposição para atacar a bola. Na segunda imagem, retrato do quarto golo, no qual Zanka fugiu à marcação de Poulain nas costas do francês, que o perdeu do campo de visão e deixou o internacional dinamarquês ataca a bola à vontade.

Já na marcação de cantos, é habitual a colocação de cinco a seis elementos da área contrária, sendo que em caso de opção por um canto curto, aparecem quatro homens a atacar o lance. Vossen e Poulain são dois dos elementos mais habilitados a atacar o espaço aéreo, correspondendo da melhor maneira aos cruzamentos do destro Vormer.

FIGURA:

Jelle Vossen: Não havendo Izquierdo, a escolha para referência da equipa não foi fácil. Se tivéssemos em conta o estatuto, talvez Simons tivesse sido o eleito. Se tivéssemos em conta a qualidade com bola no pé e preponderância no processo de construção, os nomes Vanaken e Vormer viriam sempre ao de cima. No entanto, a escolha acaba por recair em Jelle Vossen, o internacional belga, associado em tempos ao FC Porto e que tanto prometeu quando surgiu de forma estelar no Genk. O caminho nos tempos mais recentes tem sido algo sinuoso mas o avançado de 27 anos não deixa de ser um jogador importante. Com boa leitura de jogo e inteligência nas movimentações, oferece bons apoios frontais, empresta mobilidade e amplitude à equipa, além de demonstrar um considerável sentido de baliza. O instinto goleador, porém, é que parece já não ser o mesmo de há uns anos. Ainda assim, e face ao momento atual do campeão belga, consegue ser um dos jogadores com maior potencial para fazer a diferença em campo.