A Holanda continua a ser o farol que guia as novas tecnologias aplicadas à arbitragem: é deles, por exemplo, todo o trabalho de fundo relativamente à introdução do vídeo-árbitro.

Nesse sentido, e aproveitando a presença dele em Portugal, o Maisfutebol conversou com Gijs de Jong sobre o projeto-piloto realizado ao longo dos últimos dois anos na Holanda.

Gijs de Jong é, refira-se, diretor de operações da federação holandesa e principal responsável pelo projeto-piloto: um projeto realizado através da colocação de uma carrinha equipada para o efeito no exterior do estádio, onde um técnico e um árbitro analisam as imagens televisivas para ajudar o árbitro principal em tempo real.

«O único problema é que de facto não ajuda o árbitro principal. Ou seja, o árbitro na carrinha tinha auscultadores e um microfone, respondia como se estivesse a falar com o árbitro, mas de facto não havia contacto», esclarece.

«Basicamente quando acontecia uma das situações referidas acima, o árbitro dizia ‘aconselho a que a decisão seja esta’. Depois o nosso trabalho era perceber se a decisão era boa, se era importante para o árbitro e quanto tempo demorava a sair.»

As conclusões, acrescenta, foram encorajadoras. Tanto assim que a federação holandesa avançou com um pedido à FIFA para testar o vídeo-árbitro de facto, em tempo real.

Os testes vão avançar na próxima temporada, exatamente no mesmo modelo: um árbitro e um técnico, dentro de uma carrinha no exterior do estádio, em ligação direta ao árbitro.

«A conclusão do projeto-piloto foi muito clara: o vídeo-árbitro é muito vantajoso. Nós concentrámos o projeto em três tipos de decisões: golos, penaltis e incidentes de cartões vermelhos. O que foi possível perceber é que o vídeo-árbitro é um mecanismo promissor e que pode prevenir o árbitro principal de cometer grandes erros», diz Gijs de Jong.

«A conclusão final é que em 50 decisões erradas do árbitro, o vídeo-árbitro pode corrigir doze. Ou seja, praticamente uma em cada quatro más decisões podem ser emendadas.»

Nesta altura o leitor deve estar a pensar como o jornalista pensou: 12 em 50, isso é apenas um quarto das decisões...

«Certo, mas o vídeo-árbitro não serve para corrigir todas as decisões erradas. Serve para corrigir as decisões importantes, por isso só nos concentrámos em penaltis, golos e incidentes de cartão vermelho. Tudo o resto não é para ser corrigido, para já.»

Mas há mais. Uma das maiores críticas que é feita ao vídeo-árbitro é que vai obrigar a mais paragens durante o jogo, o que acaba por quebrar o ritmo do encontro.

Afinal de contas é necessário que o vídeo-árbitro analise as imagens, tome uma decisão sem margem para dúvidas e a comunique ao árbitro principal, o que muitas vezes pode provocar uma interrupção do jogo.

Mas será que este processo demora assim tanto tempo?

«Não, essa é uma falsa questão. A média de uma decisão é onze segundos, o que depende das decisões que é preciso tomar. Mas nós pensamos que podemos melhorar», garante.

«Por isso estamos seguros que temos de fazer isto definitivamente de uma forma real: e é isso que vamos fazer a partir da próxima temporada. Há erros que ainda não podemos reparar, e por isso eles vão continuar, mas a prioridade do vídeo-árbitro são as decisões mais importantes, as grandes decisões, os golos, os penaltis e os incidentes com cartões vermelhos, que são o que mais pode influenciar o curso de um jogo. Vamos começar por aqui, ver como funciona e depois podemos pensar nos próximos passos.»

Refira-se que a federação holandesa criou um mecanismo de vídeo-árbitro, através de uma carrinha equipada com vários ecrãs e sistema de manuseamento de imagens.

A carrinha esteve primeiro em Amesterdão, onde foi testada em vários jogos das equipas locais, e depois disso em Roterdão. A partir da próxima época vai estar nos jogos da Taça da Holanda, onde o sistema vai ser de facto testado em tempo real.

«Recebemos autorização para fazer experiências reais, por isso tivemos de contactar a UEFA a dizer que queríamos dar esse passo. Acho que houve quinze ou vinte competições que mostraram interesse em avançar com as experiências. O que nós queremos fazer é começar na próxima época com os testes na Taça da Holanda. Iremos fazer aproximadamente 25 jogos e enfim, vamos ver como vai correr.»

Há no entanto um requisito fundamental: os jogos só podem ter vídeo-árbitro se estiverem a ser transmitidos através de seis câmaras de televisão. O que limita muito o objeto de aplicação do sistema: muitos jogos não são transmitidos pela televisão, e ainda menos por seis câmaras que fazem a captação das imagens.

«No campeonato holandês todos os jogos são transmitidos usando seis câmaras. Na Taça não acontece em todos os jogos, por isso não vamos poder fazer a experiência em todos.»

«Se é injusto? Não, por que havia de ser injusto? É tão injusto como a tecnologia de baliza, que também não é utilizada em todos os campos, ou como o sistema de comunicação dos árbitros, que também não é utilizado por todos. Infelizmente a tecnologia não chega a todos ao mesmo tempo, importante é que as duas equipas em confronto estejam nas mesmas condições, e em relação a isso não há dúvidas.»

Por isso Gijs de Jong, que é também membro do comité executivo da UEFA, não tem dúvidas que o futuro é o vídeo-árbitro: e cada vez mais as tecnologias aplicadas ao futebol. As resistências estão de resto a cair uma por uma.

«Durante muito tempo a principal resistência aconteceu ao nível da FIFA e da UEFA. Aconteceu, por exemplo, com Platini e com outros antigos jogadores que eram contra o vídeo-árbitro, porque achavam que as decisões do árbitro principal deviam ser soberanas. Mas é preciso ver como a tecnologia está a evoluir rapidamente. Quer dizer, toda a gente no estádio consegue ver através dos smartphones a repetição da jogada e se a decisão foi bem tomada ou não, menos o árbitro... Que sentido é que isso faz? É uma loucura», atira.

«Mas felizmente as pessoas estão a perceber que isto não é uma revolução, é uma evolução. Como foi a tecnologia de baliza, os árbitros de baliza, os sistemas se comunicação, o spray, enfim. Por isso a FIFA e a UEFA estão aos poucos a ceder. O próprio Infantino disse no último encontro da UEFA que era a favor...»

O futuro da arbitragem começa por isso a ser testado a partir da próxima época na Holanda. As portas abrem-se para a tecnologia, num sinal de que o futebol quer evoluir.