Todos nós somos diferentes e por isso, apresentamos convicções, agimos e pensamos de modo distinto uns dos outros. Uns mais diferentes, ou por outro prisma, uns mais próximos. Ao nível dos treinadores, social e naturalmente, vamos comparando um treinador com outro, com mais semelhanças ou divergências consoante o que analisamos. E o que podem ter Klopp e Vitória de comum? E porquê estes dois treinadores? Não são os óculos nem o modo como o alemão corre para o jogador para festejar que nos leva a esta comparação!

Rui Vitória apresenta-se provavelmente na sua melhor forma desde que chegou ao Benfica. Acabou de ultrapassar uma eliminatória europeia em que inicialmente poucos lhe davam hipóteses, alcançou o primeiro lugar na Liga e o seu discurso está mais claro do que nunca. Jürgen Klopp dispensa qualquer apresentação pelo seu modo extrínseco, emotivo e emocional como se relaciona com todos, festeja e é acolhido pelos seus atletas. E muito mais pelos adeptos.

Rui Vitória e Klopp são apologistas de uma maior autonomia dada aos futebolistas e à equipa»

Então o que podem ter em comum? E o que faz essa semelhança merecer ser destacada? São ambos treinadores apologistas de uma maior autonomia dada aos futebolistas e à equipa. E apesar de se falar muito mais desta área, ainda não são muitos os treinadores que no futebol colocam isso em prática! Trata-se daquilo que Rui Vitória definiu como liberdade responsável. O conteúdo que os atletas passam nas suas mensagens quando falam de Rui Vitória e de Klopp é diferente quando ouvimos os que foram ou são agora treinados por eles a falarem de outros treinadores. Nem melhor nem pior, distinto. Geralmente os atletas – ou as opiniões que são publicadas por estes – sobre os treinadores são geralmente as melhores, mas, sendo elogios, apresentam sempre pequenos tópicos que analisados dão-nos sinais fantásticos. E estes dois treinadores dão-nos sinais diferentes se por exemplo os compararmos com os seus últimos adversários internos: Jorge Jesus e Van Gaal.

Qualquer treinador sente-se muito mais confortável se conseguir aplicar de modo quase natural na liderança e no treino aquilo que é o seu modo operacional para a sua nova equipa. Mas para isso é necessário muito mais do apenas os jogadores serem sempre os mesmos. Seria necessário que o contexto, os adversários, os estados emocionais e físicos dos seus atletas fossem sempre os mesmos. O que Rui Vitória e Klopp fazem de modo diferente dos seus últimos adversários internos é a sua abordagem no modo de liderança e relacional com os jogadores. Com a possibilidade concedida aos mesmos de decidirem cada vez mais – com rede, o que pode ser até considerado um modelo mais flexível ou modelo quase não modelo – os dois técnicos ficam mais perto de conseguirem ter jogadores com maior capacidade pensante e de compreenderem o que fazem. Deixam de ser peritos apenas em executar e passam também a compreender o porquê.

Rui Vitória dá bastante autonomia aos jogadores

Mas isto é ser melhor que os outros, que não o fazem? Não! Os treinadores podem ser avaliados pelo resultado ou pelo processo. Mas na hora H, quase todos os avaliamos pelo resultado. E aqui há uma enorme diferença. Técnicos como Rui Vitória ou Klopp (Guardiola, Luís Henrique, Tuchel, etc.) apostam mais no processo e no atleta. Outros treinadores como Van Gaal ou Jorge Jesus apostam mais no resultado e no imediato. E aqui há uma disputa entre aquilo que são os resultados imediatos e aquilo que é a avaliação da história. Os que apostam no imediato, estragam o futuro mas aumentam as possibilidades de vencer no agora. Os que apostam no processo de aprendizagem e no atleta aumenta, as hipóteses de vence mais vezes, mas demoram mais tempo a vencer. 

Se esta escolha é prioritária na escolha dos treinadores para os projetos dos clubes? Não sei. Queria acreditar que sim. Mas muitas vezes as escolhas são conscientes e os comportamentos posteriores dos dirigentes não são coerentes com as caraterísticas que treinadores com esse propósito possuem. Vamos ver o que acontece caso Rui Vitória ou Klopp não vençam nem já nem daqui a um tempo. E, se vencerem, demonstrar-nos-ão que é possível compatibilizar o desenvolvimento de competências (não apenas em executar) com a capacidade de alcançar resultados desportivos. Vamos aguardar!