Totti é a Roma e Roma é Totti. Há 40 anos, celebrados esta semana, é essa a sua cidade e o seu clube. Só vestiu outra camisola, a de Itália. E mesmo essa deixou-a de lado há dez anos, porque quando sentiu que precisava de escolher não hesitou. Roma.

Mas Francesco deixou os «azzurri» pela porta grande, como campeão do mundo. E daquele 9 de julho de 2016 em Berlim a imagem que fica de Totti é esta. Desconcertante como sempre, letal e bonacheirão ao mesmo tempo. A bandeira de Itália como um lenço a cobrir-lhe a cabeça e um beijo apaixonado à Taça do Mundo.

Totti chegava ao Mundial 2006 depois de uma época marcada pela lesão mais grave da sua carreira, uma fratura no perónio a meio de fevereiro. Recuperou a tempo de jogar a final da Taça de Itália, em maio, e de ganhar um lugar entre os 23 de Marcelo Lippi para o Mundial.

A Itália foi até ao fim e Totti fez um Mundial discreto, embora tenha sido utilizado em todos os jogos da campanha «azzurra», mas com um momento para a história. No jogo dos oitavos de final frente à Austrália, o tempo passou sem golos, a Itália jogava reduzida a dez desde o minuto 50, por expulsão de Materazzi, Totti começou no banco e entrou a 15 minutos do fim.

Já nos descontos, Fabio Grosso cavou um penálti num lance com Lucas Neill, o árbitro apontou para a marca. Totti avançou, frio, indiferente à brutal pressão do momento. Rematou forte ao meio da baliza, 1-0, a Itália seguia em frente.

Foi assim e o relato do momento vale a pena

Desta vez não repetiu a brincadeira de Amesterdão, o «cucchiaio» da meia-final do Euro 2000 frente à Holanda. Sim, Totti é o tipo que decidiu bater a sua grande penalidade no desempate da meia-final de um Europeu com um «Panenka». Quatro anos antes de um tal Postiga.

O resto é mito. A forma como, antes de chegar a sua vez, anunciou a um incrédulo Di Biagio e a um ainda mais desconcertado Maldini o que ia fazer.  «Mo je faccio er cucchiaio» é a frase que ficou célebre. Aliás, virou título da autobiografia que Totti lançou no início de 2006.

E fez.

2000 foi a melhor competição de Totti com a camisola «azzurra». Marcou dois golos, fez uma assistência e foi eleito «Homem do jogo» da final, apesar da derrota da Itália frente à França. Na época seguinte ganhou o título italiano com a Roma, o seu único «Scudetto».

Seguiu-se o Mundial 2002, a primeira de duas fases finais em que acabou expulso. Em 2002 viu o vermelho no prolongamento do jogo dos oitavos de final com a Coreia do Sul, quando o árbitro lhe mostrou segundo amarelo por considerar que simulou um penálti. A anfitriã Coreia havia de vencer um jogo dominado por muito ruído em torno da arbitragem de Byron Moreno e seguir em frente até à meia-final, a Itália ficava pelo caminho, a gritar «Agarra que é ladrão».

No Euro 2004, Totti chegava a Portugal como uma das grandes referências da Itália, que se estreava num nulo frente à Dinamarca. Durante o jogo, Totti envolveu-se numa discussão com Poulsen, mas o caso só rebentou dois dias mais tarde, quando uma televisão dinamarquesa divulgou novas imagens do lance que mostravam Totti a cuspir no adversário. Foi suspenso por três jogos, só poderia voltar para as meias-finais. Mas a Itália caiu na fase de grupos, pelo que o Europeu de Totti acabou ali, em Guimarães.

Seguiu-se a história feliz do Mundial 2006. E, depois de conquistado o título, o adeus. Totti deu logo sinais de que estava a ponderar terminar a carreira internacional, mas só tornou o adeus oficial um ano mais tarde. «Não consigo fazer determinado número de jogos por ano. Tenho de renunciar a algo e tem de ser a seleção, porque não posso renunciar à Roma», disse na altura.

Nos anos que se seguiram foi dando sinais de querer reconsiderar. E a cada nova grande competição o seu nome voltou à baila, porque Totti faz questão de continuar em campo, a cada nova época.

Mesmo agora, para o Euro 2016, no final de uma temporada na Roma em que foi suplente de ouro, saindo do banco para resolver vários jogos na reta final do campeonato. Gianluigi Buffon, seu rival de tantos anos na Juventus, foi um dos que defendeu o regresso de Totti em 2016, meio a sério, meio a brincar: «Se levava Totti ao Europeu? O Totti leva-se a todo o lado. Um jogador como ele, com o seu talento, pode decidir um jogo em qualquer momento.»