Corria o minuto 12 da nova vida do Anoeta, no sábado, quando Aritz Elustondo marcou o primeiro golo na casa renovada da Real Sociedad, 1-0 frente ao Barcelona. E milhares de adeptos puderam finalmente viver o momento ali, em cima do relvado, junto com os jogadores. Dois mil deles num lugar especial, a bancada que leva o nome de Aitor Zabaleta. Uma dor feita memória e celebração, em nome da paixão pelo clube.

Aitor Zabaleta era adepto da Real Sociedad. Tinha 28 anos quando foi assassinado por um neonazi às portas do Vicente Calderón.

Faz 20 anos a 8 de dezembro. Aitor viajou de San Sebastián a Madrid com a namorada, Verónica Olivenza, junto com um grupo de adeptos da peña feminina Izar, para assistir à segunda mão da primeira eliminatória da Taça UEFA, que juntava duas equipas espanholas, a sua Real Sociedad e o At. Madrid. O ambiente estava quente depois da primeira mão, que terminou com a vitória da Real por 2-1, e os adeptos bascos foram escoltados até perto do estádio. Mas chegaram cedo e decidiram ir beber um copo antes do jogo. Depois de perguntarem indicações a um polícia, dirigiram-se a um bar. Mas o que encontraram foi terror.

Atacados por um bando de ultras, tentaram fugir. Aitor acabou cercado por um grupo de cabeças rapadas, junto à porta 6 do Calderón, e apunhalado várias vezes. Ainda foi hospitalizado, mas não sobreviveu. 

O seu assassino, Ricardo Guerra, foi detido e condenado em 2000 a 17 anos de prisão. Quando matou Aitor estava a gozar de uma saída precária da prisão e a sua condenação fez cúmulo com outros crimes que cometeu. 

A família de Aitor nunca deixou que o crime fosse esquecido e o seu pai, entretanto já falecido, lutou sempre pela responsabilização dos restantes membros do bando que atacou Aitor. Mas não houve condenação por associação criminosa da Bastion, a entretanto extinta facção dos ultras da Frente Atlético a que pertenciam os agressores.

Zabaleta não foi a última vítima de crime a pretexto do futebol, nem sequer no futebol espanhol. Ainda em janeiro deste ano um dos homens que participou naquele fim de tarde de dezembro de 1998 no ataque do Calderón, Ignacio Racionero, foi preso por atacar com uma arma branca outro adepto numa rixa. Mas Zabaleta tornou-se um símbolo que a Real Sociedad preservou, parte da sua identidade.

Quando decidiu renovar o estádio, o clube propôs-se também criar uma bancada especial de animação que juntasse os adeptos mais entusiastas. E batizou-a com o nome de Aitor Zabaleta. O vídeo de apresentação da zona «mais simbólica e emocional» do novo estádio, como definiu a Real, tem a locução de Iker Zabaleta, o irmão mais velho de Aitor.

E agora a bancada Aitor Zabaleta encheu-se de adeptos, na maioria jovens. A média de idades é de 24 anos e eles já se fizeram ouvir no sábado, de pé e em celebração permanente, quando a Real inaugurou o novo Anoeta, para já ainda apenas parcialmente remodelado.

As obras, um sonho antigo do clube, modernizaram o estádio e, acima de tudo, reaproximaram os adeptos do relvado. O Anoeta, inaugurado em 1993, deixou de ter a pista de tartan que afastava as bancadas do campo. Com o relvado mais baixo, ganhou novas bancadas e passará de 25 mil para 40 mil lugares quando estiver terminada a renovação, o que só deverá acontecer na próxima época, depois de ser demolida e reconstruída a tribuna norte.

As obras começaram em maio de 2017 e a primeira fase da remodelação ficou pronta agora, a tempo da receção ao campeão Barcelona, sem que a equipa tivesse precisado de jogar em casa emprestada: nas três primeiras jornadas, com autorização da Liga espanhola, jogou fora. No sábado, Elustondo adiantou a Real, mas o Barça deu a volta na segunda parte e venceu por 2-1.

A Real perdeu, mas ganhou uma casa. Um estádio moderno e, sobretudo, com grande ambiente. Como disseram vários adeptos no final, a fazer lembrar o estádio de Atocha, que deixou de ser casa da Real Sociedad em 1993 e seria demolido alguns anos mais tarde. Ganhou uma casa e, mais que isso, ganhou nova alma.

Artigo original: 17/09/18, 23h43