«Até ao fim» é uma rubrica do Maisfutebol que visita adeptos que tenham uma paixão incondicional por um clube e uma história para contar. Críticas e sugestões para spereira@mediacapital.pt

Chama-se Nuno Canoa, tem 38 anos e é um caso raro: um portista nascido do Alentejo. Mas não é um portista qualquer, é um apaixonado pelo clube, que alimenta essa paixão com camisolas.

«Tenho uma coleção que faço desde que sou miúdo. Gosto muito do FC Porto. Sofro muito à distância, porque vivo em Lisboa e sou natural de Veiros, perto de Estremoz, no Alentejo. Portanto sempre fui um adepto do FC Porto à distância», conta.

«Acho que era o único portista na minha vila quando era miúdo.»

Mas como é que um alentejano se transforma em adepto do FC Porto no início dos anos oitenta, quando o clube azul e brancos estava muito longe de ganhar os títulos que entretanto ganhou?

«O grande culpado desta situação é o Paulo Futre. Via-o a fazer aquelas fintas, aqueles golos e aquelas coisas, apaixonei-me pelo FC Porto. Depois o FC Porto foi campeão europeu quando eu tinha cinco anos, tenho memórias vagas desse jogo, mas lembro-me de festejar muito. Os meus pais e o meu avô benfiquista acharam muita piada, até porque era um portista no Alentejo e nunca tinha sequer ido ao Porto.»

A partir daí foi uma, outra e outra vez. Foi em dezenas de situações, para ver vários jogos. Foi até quando ainda não era dono do seu destino, levado pelos pais, que lhe faziam o favor de o conduzir até ao antigo Estádio das Antes em troca de receber um sorriso estampado na cara de Nuno Canoa.

Mas ver o FC Porto a jogar não chegava e, por isso, este portista dedicou-se a outra paixão: colecionar camisolas da equipa portista. Já vendeu algumas e trocou outras, pelo que o número nunca é estático, mas nesta altura andará à volta de oitenta camisolas.

Tenho muitas especiais para mim. Por exemplo a primeira da coleção, que é uma camisola de feira, que um tio meu me ofereceu. Não era oficial, mas a emoção de a receber foi incrível», conta.

«Outra camisola especial é a primeira que a minha falecida mãe me ofereceu, já tinha 18 anos. Fui ao Estádio das Antes ver uma eliminatória da Champions com o Anderlecht, que por acaso até perdemos. Os meus pais estavam cá fora à minha espera e ofereceram-me uma camisola, com o número e o nome do Alenitchev, que era um dos meus jogadores preferidos.»

Da camisola de Deco à que Nuno Canoa se arrepende de ter vendido

A partir daí a conversa evolui em torno das camisolas especiais que há na coleção. Nuno Canoa tem sempre mais uma para referir, num sinal óbvio que memória puxa memória.

«Tenho uma camisola que foi usada pelo Deco e que é muito cobiçada. Já tive propostas muito altas por ela, mas não a vendo. É uma camisola que o Deco utilizou contra o Hertha Berlim, nas Antas, uma camisola azul e branca, da Kappa, muito bonita. Ainda o Deco era o número 29», diz.

«Tenho uma camisola utilizada pelo Fernando Couto, tenho uma autografada pelo Paulo Futre, com uma dedicatória. Tenho uma que me foi dada pelo Vítor Baía e autografada por ele, tenho uma assinada por todos os campeões de Viena. Tenho uma camisola do Maniche, que me contactou há uns anos a dar os parabéns pela coleção, eu respondi-lhe a dizer que gostava de também ter uma camisola dele e ele foi impecável: enviou-me pelo correio uma camisola alternativa de 2004.»

Por falar em correio, há outra camisola que Nuno Canoa não esquece.

«A do Luís Mata, capitão da equipa B», refere.

«É especial porque eu fui ver um jogo do FC Porto B com os meus filhos e levámos um cartaz a pedir uma camisola. No fim do jogo o Luís Mata veio ter connosco, disse que não podia dar a camisola ali porque o deixavam, pediu-nos a nossa morada e disse que a enviava depois. O certo é que a camisola chegou mesmo pelo correio.»

Nesta altura vem à conversa uma outra camisola, que este adepto especial já não tem com ele mas que está a tentar com todas as forças recuperar.

«Estou a fazer uma reestruturação na minha coleção e, como não sou rico, estou a vender algumas camisolas para comprar outras. As camisolas são caríssimas, tenho de investir muito e preciso de dinheiro para esse», começa por dizer, antes de chegar à camisola.

«Vendi uma que era muito especial e que estou a tentar recomprar. Uma camisola branca, de 2001, que o FC Porto só utilizou duas vezes. Foi-me dada por um rapaz de quem fiquei muito amigo, aquela camisola era um símbolo da nossa amizade. Arrependi-me de a vender. Já entrei em contacto com o comprador, que também é impecável, e acho que vou conseguir recomprá-la.»

De camisola em camisola, de jogo em jogo, de festejo em festejo, este portista alentejano, agora a viver em Lisboa, diz que à distância se sofre mais. Pelo que precisa daqueles objetos para se sentir mais perto da paixão pelo FC Porto.

«O sonho que tenho é manter a coleção até ser velhinho e depois deixá-la para os meus filhos. A vida está caríssima, não compro camisolas como há cinco anos, mas a ideia é sempre expandir a coleção, embora seja um hobby muito caro.»

Artigo original: 03/03, 23h50

MAIS «ATÉ AO FIM»