«Voa, Nelson, voa…» A frase ecoa como um mantra na cabeça do campeão quando ele encara a pista no momento de saltar. Desde menino que assim é.

Tal como aconteceu há dois anos, em Praga, este domingo, em Belgrado, Nelson Évora voou uma vez mais para a medalha de ouro, que lhe valeu a revalidação do título de campeão europeu de triplo salto em pista coberta.

17,20 metros… Na terceira das seis tentativas da final, o atleta português suplantou a sua melhor marca do ano (os 16,92 que havia conseguido no salto anterior, após ter começado com um nulo), que o colocou no mais alto lugar do pódio, à frente do veteraníssimo italiano de 40 anos Fabrizio Donato (17,13) e do alemão Max Hess (17,12), que era apontado como favorito (após saltar 17,52 na qualificação).

O trio do pódio na prova de triplo salto dos Europeus de atletismo

Na véspera, já Patrícia Mamona havia conseguido a medalha de prata, também no triplo salto. Ela e sobretudo Nelson Évora foram os grandes destaques na comitiva de dez atletas representaram Portugal nos Europeus de pista coberta, na Sérvia, conforme sublinhou no final Luís Figueiredo, vice-presidente da Federação Portuguesa de Atletismo.

17,20 metros: um salto que valeu ouro

«Todos nós sabemos por aquilo que o Nelson tem passado e por tudo o que tem sofrido, mas ele tem fibra de campeão e os campeões vêem-se nestas alturas», afirmou Luís Figueiredo, acrescentando que «de acordo com a pontuação alcançada, foi a melhor participação de Portugal em Campeonatos da Europa»: «Tivemos toda a gente a superar-se e a estabelecer máximos pessoais e até um recorde nacional no lançamento do peso [Tsanko Arnaudov, 21,08 metros, que ficou no quarto lugar].»

Novo ciclo começa com êxitos

Foi uma vez mais uma prova de superação do atleta que aos 32 anos volta a triunfar nos grandes palcos, depois de um período entre 2010 e 2012 em que a sua carreira esteve seriamente comprometida devido a uma sucessão de lesões, como uma grave fratura da tíbia.

Esta nova vida do atleta luso, nascido em Abidjan (Costa do Marfim), filho de pai cabo-verdiano e mãe costa-marfinense, tem nesta temporada um ciclo de mudança. Em setembro de 2016, o atleta anunciou o fim de um trajeto comum de 25 anos ao separar-se do treinador João Ganço, vizinho que o descobriu para o atletismo quando ele em criança brincava num parque em Odivelas – tendo em jovem praticado com bons resultados também o salto em altura.

Campeão europeu no mais alto lugar do pódio

Évora passou a viver e a treinar em Guadalajara (Espanha) sob a orientação do cubano Iván Pedroso, antigo campeão olímpico e mundial do salto em comprimento e seu ídolo de infância – como reconheceu publicamente numa foto conjunta que partilhou há um ano nos Mundiais de pista coberta.

À mudança de treinador, seguiu-se a mudança de clube, com a transferência do Benfica para o Sporting em outubro último.

Nelson apresentado em Alvalade com a camisola do novo clube

O atleta chegou ao terceiro grande da sua carreira, depois de ter representado o FC Porto entre 2002 e 2004, numa altura em que se naturalizou português e começou a bater os recordes nacionais na sua disciplina. Tudo isto foi antes de ter regressar ao Benfica, clube que já havia representado na formação e pelo qual fez quase todo o seu percurso ao mais alto nível.

Após a recente troca de um rival por outro, venceu a primeira prova com a camisola do Sporting no início de fevereiro, no meeting de Val de Reuil, em França, antes de há duas semanas ajudar os leões a sagrarem-se campeões nacionais em pista coberta em masculinos (título que juntou ao feminino), em Pombal, relegando o Benfica para o segundo posto.

A celebração nos Europeus de pista coberta, em Belgrado

Depois do sexto lugar na final olímpica de 2016, tendo sido ainda assim o melhor europeu nos Jogos do Rio (com uma marca de 17,03 metros), o campeão olímpico de 2008 começa em grande 2017, ano de Mundiais absolutos, que se disputarão em Londres de 4 a 13 de agosto. E ao seu palmarés junta a sétima medalha em grandes competições, o segundo ouro nos Europeus 'indoor” (além do bronze no Mundial de pista coberta em 2008), além do bem mais significativo título de campeão olímpico e de três lugares no pódio em Mundiais absolutos (ouro em 2007, prata em 2009 e bronze em 2015).

Depois de um ano atípico, em que mudou de clube e de treinador, a vontade de vencer renova-se ao longo do tempo. Ontem, como partilhou nas redes sociais, ele voltou a «saltar para o infinito» e voltou a levantar o esplendor do atletismo português.

Aos 32 anos, o campeão continua a voar.