Vivemos tempos conturbados neste oásis. Os entendidos dizem que já não somos um país de brandos costumes e até o Presidente da República está preocupado com a onda de crimes que assola o país. Os criminosos estão mais activos, as forças da ordem não estão a conseguir acompanhá-los e os juízes não escapam às críticas, parecendo demasiadadamente preparados para assinar termos de identidade e residência.
Tudo isto é importante, mas se há algo que indigna realmente os portugueses é uma má arbitragem. Um penalty mal assinalado, um fora-de-jogo escandaloso, um jogador que já devia ter sido expulso na primeira parte. Bastou começar a Liga (e as provas europeias) para começarmos a ouvir a mesma lengalenga. Coitados dos juízess, aqueles que também conhecemos como árbitros.
Estamos em semana de clássico e é normal que todos falem nele. Para acabar com especulações, Vítor Pereira escolheu o melhor da época passada: Jorge Sousa. Num passado recente, seria um escândalo escolher alguém da AF Porto para arbitrar um Benfica-Porto. No máximo alguém de Setúbal ou de Leiria. Talvez por isso, muitas vezes surgiram problemas e polémicas. No fundo, não eram escolhidos os melhores. Talvez seja um sinal de maturidade. Assim o esperamos. Pelo menos até este sábado, enquanto não vier alguém protestar.
Jorge Sousa apenas tem de acreditar no seu trabalho e esperar que os seus auxiliares mantenham os níveis de competência. Para o juiz não profissional, que passa grande parte do dia a gerir madeiras em Paredes, a única meta possível é obter respeito entre os pares e, se possível, entre os adeptos menos viscerais. De nada lhe valerá o treino ao fim de cada dia, ou as horas de jogos acumuladas, se um artista se atirar para o chão no risco da área. Não há outro meio senão utilizar o par de olhos, um pouco de intuição e a ajuda de outros dois pares de olhos, que assistem a tudo, igualmente atentas, de outras partes do campo, com uma bandeirinha nas mãos.
Absurdamente, Jorge Sousa não vai poder contar com as mesmas tecnologias que auxiliam Carlos Ramos, o melhor árbitro de ténis do mundo. Que só por acaso (ou talvez não), também é português. Numa entrevista recente, Ramos confessou que preferia arbitrar em Wimbledon, mas não regateia uma boa final em Roland Garros ou na Austrália. Ele está lá, sentadinho, com o auxílio de mais dez juízes de linha e ainda a tecnologia "olho de falcão", que permite tirar as dúvidas das dúvidas, naquelas situações impossíveis para o olho humano. Em desportos mais evoluídos, como o ténis, o cricket, ou o futebol americano, já todos perceberam que as inovações ajudam a encontrar a verdade e nunca a desvirtuam.
Nos Jogos Olímpicos vimos Phelps conquistar uma das oito medalhas com o auxílio do photo-finish, no atletismo a mesma tecnologia é utilizada há décadas, mas no futebol, ahhh, aí não, porque se nos tirarem uma boa roubalheira a coisa nunca terá tanta piada. De que é que iríamos falar na mesa de café? Coitados dos juízes...
«Futebolfilia» é um espaço de opinião da autoria de Filipe Caetano, jornalista do IOL, que escreve aqui todas as quartas-feiras