Foi apresentada pelo Barcelona como uma grande novidade. E tem sido um sucesso entre os adeptos. A camisola com as cores da Catalunha representa mais do que um equipamento alternativo para o Barça, tem todo um significado de identidade e político, porque replica a bandeira da Catalunha e foi entendida como uma declaração de princípio do clube sobre a independência da região. Mas, nesta altura, deve haver muita gente com dúvidas. É que não há maneira de a equipa ganhar quando veste a «Senyera».

São cinco jogos, quatro deles oficiais. Saldo: duas derrotas e três empates. A primeira derrota em jogo oficial com a camisola às riscas amarelas e vermelhas aconteceu neste domingo, frente ao At. Bilbao, e foi também a primeira da época na Liga para a equipa de Tata Martino.

A senda da Senyera começou na pré-temporada. Foi com ela vestida que o Barcelona visitou o Bayern Munique, no reencontro com Pep Guardiola. Os alemães ganharam por 2-0. A estreia oficial aconteceu na primeira mão da Supertaça de Espanha frente ao At. Madrid, jogo que terminou com um empate a um golo. Apesar de tudo, o 0-0 na segunda mão chegou para o Barça levar o troféu.

Seguiu-se o jogo de campeonato com o Osasuna, em Pamplona. 0-0, os primeiros pontos perdidos pelo Barça na Liga. Depois, a 22 de outubro, de novo a Senyera em campo em San Siro, frente ao Milan, para a Liga dos Campeões. Resultado: 1-1. E agora, o At. Bilbao.

Não é a primeira vez, e não será a última, que se associa uma camisola aos resultados desportivos. A superstição faz parte do futebol e as cores das camisolas alimentam há muito discussões de adeptos. E houve mesmo casos em que a superstição levou a melhor. Afinal, ninguém acredita em bruxas, mas...

O caso mais famoso é o do Brasil, depois do Maracanazo. Em 1950, o escrete usava camisola branca com pormenores em azul. Era assim desde o seu primeiro jogo, em 1914. Mas foi com esse equipamento que perdeu a final do Mundial de 1950, debaixo dos narizes brasileiros, em pleno Maracanã. A vitória do Uruguai (2-1) levou o Brasil a querer exorcizar daí para a frente todos os fantasmas desse trauma, incluindo a camisola.



A mudança não foi imediata, ao contrário do que diz a lenda. O Brasil ainda jogou em 1952 o Campeonato Panamericano com a camisola branca. Mas, com o aproximar do Mundial de 1954, a pressão aumentou para que fossem apagadas todas as memórias de 1950. O jornal Correio da Manhã, com o apoio da Federação brasileira, lançou uma campanha pela criação de um novo equipamento. E o vencedor, entre duzentas propostas, foi Aldyr Schlee, jornalista e cartoonista, que apresentou uma versão com camisola amarela e calções azuis. A mesma que, com algumas variações, dura até hoje.

O Real e o calção negro

Mais antigo é o exemplo do Real Madrid. Depois de terem eleito o branco integral como imagem oficial, os merengues abriram uma exceção em 1925/1926. Conta o site oficial do Real que foram os jogadores Ecobal e Quesada os promotores da iniciativa, depois de uma viagem a Inglaterra, onde viram jogar o Corinthians britânico e acharam muito elegante o seu equipamento de camisola branca e calções negros. Replicaram-no em Madrid mas, depois de duas derrotas pesadas com o Barcelona para a Taça do Rei (1-5 em Madrid e 0-2 em Barcelona), o presidente de então, Pedro Parages, decidiu abandonar a variante, por achar que dava azar.



Manchester United baniu camisola... ao intervalo!

Depois, há mudanças com outras motivações. Pelo menos no discurso público. Foi o caso do Manchester United, em 1996. Os «red devils» tinham por essa altura um equipamento alternativo cinzento, que não correu bem. Não foi só a questão estética. Ao que rezam as crónicas, em cinco jogos assim vestido o Manchester United, que corria para o título, perdeu quatro jogos e empatou um.

Ou melhor, perdeu três e meio. Sim, porque este equipamento foi banido ao intervalo de um jogo. O Manchester United jogava em casa do Southampton e perdia 3-0 ao intervalo. Alex Ferguson não esperou mais. Lee Sharpe, então médio do Manchester United, contou assim a história, no jornal «Guardian»: «O treinador entrou de rompante no balneário e disse: ‘Dispam esse equipamento, vão mudar.» Foram as primeiras palavras que ele disse ao intervalo. Acho que ele não gostava mesmo da camisola, e os nossos resultados com ela foram maus. Mas nunca mais a usámos.»

O United voltou ao relvado de azul e branco, as cores do terceiro equipamento. A explicação oficial de Alex Ferguson é que, naquele cinzento, os jogadores não conseguiam distinguir-se uns aos outros contra o fundo das bancadas. «Os jogadores não conseguiam identificar-se. Disseram que era difícil ver os companheiros à distância, quando levantavam a cabeça. Não teve nada a ver com superstição. Este clube esteve 26 anos sem ganhar a Liga e não pensámos em mudar as camisolas vermelhas», disse o escocês na altura, citado pelo «Independent».

No início deste vídeo tem imagens dessa meia parte com equipamento cinzento



O United não se livrou de perder esse jogo (1-3), mas a partir daí ganhou três de enfiada e selou a conquista do título, o terceiro em quatro anos para a equipa de Cantona, Giggs e companhia. Quanto às camisolas cinzentas, foram banidas pelo clube dois dias depois do jogo em Southampton.

Depois, há exemplos mais recentes. Nem sempre bem sucedidos. No Milan, por exemplo, Adriano Galliani quis banir o equipamento alternativo da equipa, negro, depois da derrota com o Arsenal para a Liga dos Campeões, em 2012. «Nunca mais vamos usar este equipamento. Tentei tudo para evitar que o usássemos contra o Arsenal, mas a outra alternativa era jogar nu. Foi a última vez que usámos», garantiu o dirigente «rossonero».



Mas os interesses comerciais falaram mais alto, e o Milan manteve mesmo o equipamento por mais uns tempos. Em julho de 2012, Galliani explicava-se assim no site do clube: «Disse que o terceiro equipamento não voltaria a ser usado, mas a produção e o fornecimento de camisolas começou há muito tempo. Mas a camisola preta não estará nos nossos equipamentos daqui a um ano, em 2013.» De facto, esta época o terceiro equipamento do Milan passou a ter camisola dourada e calções pretos.

Quanto ao Barcelona, não parece que mudar seja a solução, pelo menos para já. A camisola da Senyera foi apresentada com grande pompa pelo clube e o presidente, Sandro Rosell, prometeu em setembro deste ano que ela seria mantida enquanto for presidente. Quando lançou este equipamento, o dirigente explicou que o clube quis associar-se assim ao 300º aniversário da Guerra da Sucessão de 1714, quando a vitória da casa de Bourbon acentuou a repressão sobre as pretensões independentistas da Catalunha. A iniciativa dividiu opiniões, mas o Barcelona revelou no início da temporada que a camisola estava a ser um sucesso e as vendas iam de vento em popa.