Em julho de 1997, o Benfica preparava-se para a nova época com os bolsos cheios de ilusão. Manuel Damásio vivia os últimos dias na presidência encarnada e tinha feito uma série de contratações sonantes, que colocavam o clube no topo dos favoritos à conquista do título de campeão.

Do Boavista tinham chegado, por exemplo, Nuno Gomes e Sanchez, do Parma tinha chegado em definitivo o brasileiro Amaral, do Grémio tinha chegado Paulo Nunes, internacional brasileiro e antigo companheiro de ataque de Mário Jardel.

Do Chelsea vinha Scott Minto, do Feyenoord Gaston Taument e do Lokomotiv  Ovchinnikov (estes últimos dois também internacionais, neerlandês e russo, respetivamente).

Em janeiro, e já com Vale e Azevedo na presidência, ele que tinha assumido o comando em outubro, ainda iriam chegar Poborsky, do Manchester United, e Brian Deane, do Sheffield United, mas com uma passagem de relativo sucesso pelo Leeds, que lhe valeram três chamadas à seleção inglesa.

Ora foi no meio deste turbilhão de emoções e entusiasmo que foi contratado outro nome sonante: Carlos Gamarra, central paraguaio, na altura considerado o melhor jogador sul-americano naquela posição. Para o conseguir, o Benfica pagou cerca de 2,5 milhões de euros ao Internacional de Porto Alegre.

Tal como Paulo Nunes e Sanchez, Gamarra foi autorizado nesse verão a apresentar-se mais tarde, depois de ter participado na Copa América, o que provocou uma situação curiosa: o central paraguaio ainda não tinha chegado a Lisboa e já era notícia por poder sair.

O Real Madrid andava, supostamente, à procura de um central e apreciava Gamarra, pelo que o jornal Marca garantia que o clube da capital espanhola estaria disponível para pagar cerca de 5,5 milhões de euros.

António Figueiredo, vice-presidente do Benfica, lembrava que o jogador tinha valorizado cerca de 60 por cento sem sequer vestir a camisola encarnada, mas garantia que Gamarra não estava à venda e que era fundamental para o projeto do clube.

Certo é que o jogador não saiu para o Real Madrid, é verdade, mas também não ficou muito tempo na Luz. Em janeiro, e quando era titularíssimo no centro da defesa e um dos destaques da equipa, abandonou o clube e voltou ao Brasil.

«Estava muito bem e joguei todos os jogos. Um dia fui trabalhar de manhã e o Vale e Azevedo disse-me: Tens de ir para o Brasil. Perguntei porquê. O Corinthians quer contratar-te e nós precisamos de dinheiro, temos de vender. O Benfica devia-me algum dinheiro e eu fui ao escritório do Vale e Azevedo, com a minha mulher», explicou mais tarde em entrevista ao Record.

«Estavam para aí cinco ou seis diretores, todos com charuto e começaram a falar. Ficámos a ouvir. Disseram que estavam felizes por mim, porque sabiam que eu não gostava de Lisboa. Foi nessa altura que a minha mulher disse que, por ela, ficava o resto da vida em Portugal. Eles falaram, falaram, mas acabaram por pagar aquilo que me deviam. Se não pagassem, eu não assinava o contrato e inviabilizava o negócio com o Corinthians.»

Em São Paulo, num superplantel carregado de internacionais como Vampeta, Marcelinho Carioca, Edilson, Ricardinho, Fredy Rincón, Sylvinho ou Cris, Gamarra foi campeão brasileiro, antes de dar nas vistas no Mundial 98. A carreira do central seguiu por clubes como o At. Madrid, o Flamengo, o Inter Milão e o Palmeiras.

Infelizmente para ele nunca passou pelo Real Madrid.

«Máquina do tempo» é uma rubrica do Maisfutebol que viaja ao passado, através do arquivo da TVI, para recuperar histórias curiosas ou marcantes dos últimos 30 anos do futebol português.