Ao fim de três anos e meio e pouco mais de um mês depois de ter estado para sair mas ter sido seguro pelo presidente, Rui Vitória deixa mesmo o Benfica. O primeiro treinador despedido na Luz com a época a decorrer em mais de uma década: desde Fernando Santos, em agosto de 2007. É o fim da linha para o treinador que foi bicampeão, o treinador do tricampeonato e do tetra, mas também o técnico que fica ligado à pior campanha de sempre de uma equipa portuguesa na Liga dos Campeões. Do verão de 2015 aos primeiros dias de 2019, a passagem de Rui Vitória pela Luz em 10 momentos.

O arranque sob o fantasma de Jesus

Foi quente o verão de 2015, com a mudança de Jorge Jesus, após seis épocas que marcaram o Benfica, para o Sporting. O escolhido para suceder a Jesus foi Rui Vitória, que chegou à Luz após quatro temporadas no V. Guimarães e um troféu no palmarés, a Taça de Portugal ganha em 2013 ao Benfica. Era um desafio difícil e começou precisamente com uma derrota frente ao Sporting, na Supertaça. Seguir-se iam mais duas, uma na Luz para o campeonato e outra para a Taça, com o fantasma de Jesus a pairar ativamente sobre o novo treinador.

A vitória no dérbi que virou a Liga

Na primeira temporada de Vitória, em 2015/16, o Benfica perdeu todos os clássicos menos o último. O triunfo em Alvalade por 1-0, à 25ª jornada, acabaria por virar a Liga para a Luz. O Benfica foi tricampeão. Depois de dois títulos com Jesus, o primeiro para Rui Vitória. Com 88 pontos conquistados, novo recorde na Liga portuguesa.

O primeiro tetra da história encarnada

A segunda temporada de Rui Vitória na Luz fica marcada por uma conquista que o clube perseguia desde sempre: o tetracampeonato. Era o único dos três grandes que ainda não tinha quatro títulos consecutivos, já tinha estado perto por cinco vezes, quebrou o enguiço a uma jornada do final, com o triunfo frente ao V. Guimarães

A dobradinha e uma hegemonia que não durou

Duas semanas depois da festa do tetra, o Benfica de Rui Vitória conquistou também a Taça de Portugal, ao vencer na final o V. Guimarães por 2-1. Estava feita a dobradinha, a 11ª na história do clube, a confirmar a hegemonia dos «encarnados» no futebol português nos últimos anos. Esse triunfo representou a 11ª vitória nos últimos 15 troféus em jogo. Mas só voltaria a conquistar um troféu de então para cá: a Supertaça, em agosto de 2017, o sexto e ultimo título da sua passage pela Luz.

O pior de sempre na Europa

A marca a vermelho que marcará a passagem de Rui Vitória na Luz. Depois de ter chegado na primeira temporada aos quartos de final da Liga dos Campeões e aos oitavos na segunda, em 2017/18 a campanha europeia do Benfica foi um fracasso nunca visto. Seis jogos, seis derrotas, entre elas o 0-5 sofrido frente ao Basileia. Um golo marcado, 14 sofridos, a pior equipa portuguesa na história da Liga dos Campeões, entre as piores de sempre em absoluto. Uma «espiral negativa», chamou-lhe Rui Vitória.

O primeiro triunfo sobre o FC Porto antes da pior série

Depois do fracasso europeu e de não ter conseguido revalidar o título, ganho pelo FC Porto, Rui Vitória começou a época 2018/19 na Luz, mas a margem de tolerância era cada vez mais curta. Na Liga, um arranque de temporada irregular dos habituais candidatos foi mantendo o Benfica à tona no início, reforçado com a vitória no clássico com o FC Porto, à 7ª jornada – o primeiro triunfo de Rui Vitória sobre os «dragões» em três épocas e meia na Luz. O técnico só conseguiu vencer no total 3 dos 16 clássicos que disputou enquanto treinador do Benfica, dois frente ao Sporting e o desta temporada com o FC Porto. Mas o triunfo no clássico não serviu de catalisador. Seguiu-se o triunfo sobre o Sertanense para a Taça e depois quatro jogos sem vitórias, igualando uma série negativa como o Benfica não tinha desde 2012.

O rácio que não era bem assim

No meio dos altos e baixos dos resultados, o discurso de Rui Vitória também não ajudou. O técnico fugiu muitas vezes a explicações aprofundadas sobre os temas e, sob pressão, chegou a atirar ao lado. Como no final de outubro, quando, após a derrota com o Ajax que deixava o Benfica com três pontos a meio da fase de grupos da Champions, quis puxar dos galões ao dizer que era o treinador encarnado com melhor rácio de vitórias na prova. Não ficou claro o que quis dizer, os factos não batiam certo e acabou por se retratar.  

Adeus à Champions, parte II

Na penúltima jornada da fase de grupos da Liga dos Campeões, o Benfica foi a Munique já com hipóteses remotas de apuramento. Saiu vergado por uma goleada, um 5-1 frente ao Bayern que não só confirmou a eliminação como assinalou uma segunda temporada seguida de mediocridade na Europa. Acabou por evitar o último lugar e assegurar a presença na Liga Europa a partir de fevereiro, mas mostrou de novo que era curto.

A luz de Vieira que segurou Vitória

Foi a derrota em Munique que desencadeou o golpe de teatro dos dias seguintes. Rui Vitória esteve com pé e meio fora do Benfica. Mas foi salvo por uma noite mal dormida de Luís Filipe Vieira no Seixal. A 29 de novembro, o presidente do clube deu uma conferência de imprensa para dizer que o técnico esteve de saída, mas afinal ficava. «Foi uma luz que me deu», disse Vieira, acrescentando que Vitória iria continuar e que o treinador não era «o único culpado».

Portimonense apagou a luz

Essa luz apagou-se nesta quinta-feira. A derrota com o Portimonense, que deixou o Benfica com a pior pontuação à 15ª jornada em 10 anos, foi o fim da linha para Rui Vitória. Passou pouco mais de um mês desde aquele voto de «confiança» de Vieira. Agora, ainda sem explicações do presidente sobre o processo, Vitória sai mesmo, com o Benfica em quarto lugar no campeonato, a sete pontos da liderança.