CAMINHOS DE PORTUGAL é uma rubrica do jornal Maisfutebol que visita passado e presente de determinado clube dos escalões não profissionais. Tantas vezes na sombra, este futebol em estado puro merecerá cada vez mais a nossa atenção. Percorra connosco estes CAMINHOS DE PORTUGAL.

FOOTBALL CLUB CARVOEIRO UNITED – II Divisão da AF Algarve

Um clube algarvio com nome de emblema inglês. Soa a Algarve United, certo? Pois, mas se há algo que esta equipa salienta ao primeiro contacto é a vontade de separar as duas hostes. O Carvoeiro United não pretende, de todo, ser uma imitação do projeto falhado lançado em 2004 e que chegou, inclusive, a anunciar Paul Gaiscoigne para o cargo de treinador, o que nunca chegou a acontecer.

O Algarve United falhou, acabou, renasceu e voltou a desaparecer. O Carvoeiro United garante que já fica contente «se todos os anos der um pequeno passo para a frente».

A ideia foi deixada por Pedro Frias, treinador adjunto e, ao mesmo tempo, responsável pela comunicação do clube, em conversa com o Maisfutebol. É ele o nosso mestre cerimónias para esta curta viagem no tempo à história de um clube em que «70 por cento dos adeptos são ingleses».

A verdade é que o projeto vai ainda para a segunda temporada desportiva (arranca no dia 3 de outubro). Surgiu da mente de três jovens, todos de nacionalidades diferentes.

«A ideia inicial, por assim dizer, foi de um holandês, o Yannick Nicklaus, mas teve a ajuda de um português, o Sandro Pacheco, e de um inglês, o John Wilson, para fundar o clube. O Yannick nasceu na Holanda mas está em Portugal há vários anos», explica Pedro Frias.

Mora em Carvoeiro, que pertence ao concelho de Lagoa, no Algarve. «Juntou amigos e criou o clube. Muitos dos jogadores que compuseram o plantel da época passada estavam sem clube. Alguns até tinham sido semi-profissionais, outros não estavam em lado nenhum e tiveram neste clube uma oportunidade para jogar futebol», acrescenta.

O projeto cresceu mas nunca deixou de ser visto como algo familiar. «O pai do Yannick é o presidente, a mãe trata da logística, dos equipamentos e do merchandising, também»
, conta Pedro Frias. Ele que tenta dar ao Carvoeiro United o ar moderno que o projeto exige: «Às vezes a forma como se comunica dá logo outro aspeto daquilo que somos. Mas sempre com os pés assentes no chão. Não vivemos de fantasias.»

«Perdíamos 4-0 e os ingleses não paravam de cantar…»



Na temporada passada, a equipa competiu na I Divisão da Associação de Futebol do Algarve. Motivo? Ainda não havia Segunda. Acabou por ser despromovida ao segundo escalão. Um dado que Pedro Frias vê como normal: a experiência tem de valer alguma coisa.

Este ano, na II Divisão, o objetivo é claro: subir. «São oito equipas. Só o Messinense é um clube, por assim dizer, que exige mais respeito. Os outros são clubes como o nosso: novos ou reativados recentemente. Podemos acreditar», defende o técnico adjunto.

Olhar para a temporada a pensar em subir não é uma novidade apenas pela meta em si. É a primeira vez que o clube tem uma meta, por si só. «No ano passado só falamos de objetivos no final da época», atira, entre risos.

«No início só queríamos garantir a inscrição no campeonato distrital. E chegar ao fim. Tivemos as dificuldades normais, sobretudo financeiras. Sobrevivemos com um patrocínio ou outro que vamos conseguindo e da nossa própria dinâmica, ou seja, pelas iniciativas que vamos fazendo, como a venda de rifas. Não pagamos salários a jogadores e a única despesa que temos, agora, é o treinador, que veio de novo, e o fisioterapeuta e até esse foi um patrocínio», conta Pedro Frias.

O nome do clube, esse, foi escolhido para agradar à massa associativa. «A maioria dos nossos adeptos são ingleses. Diria que cerca de 70 por cento. E fãs do Manchester United. Depois o nosso clube tem várias nacionalidades e quisemos dar a ideia de união em torno de um projeto»
, explica.

A comunidade inglesa residente em Lagoa adotou o clube, que espera chegar aos 300 sócios até ao final do ano. «Eles são fantásticos, ainda no ano passado houve um jogo em que estávamos a perder 4-0 e era vê-los a cantar. Não param», elogia Pedro Frias. E acrescenta que os resultados da primeira época nem ajudaram: «Os ingleses são os mais fieis, mas ninguém aguenta tanta derrota. Acreditámos que podemos chegar a mais gente este ano.»

Um campo dividido com a escola de João Moutinho

Desde o início que, sobretudo pelo nome, a sombra do Algarve United pairou no projeto do Carvoeiro. «As pessoas confundiam ou diziam-nos que não ia durar muito. Gerou sempre muita conversa. Isso não dura um ano, diziam. Não tem nada a ver. Eles começaram com expectativas enormes, nós ficamos contentes se, todos os anos, dermos um pequeno passo em frente. Não entramos em loucuras», sintetiza.

Utilizando o campo local, pertencente à autarquia, o Carvoeiro United vai dividindo o sintético, que usa três vezes por semana para treinar, com equipas locais de formação e veteranos. «O Grupo Desportivo de Lagoa usa-o para os treinos de juniores, juvenis e até a escola do João Moutinho, que é privada, treina também ali», enumera.

O Lagoa acaba por ser, por assim dizer, o rival do Carvoeiro United. «Perdemos os dois primeiros jogos, na terceira vez arrancamos um empate. Mas o nosso melhor jogo de sempre foi uma vitória contra o Farense B quando estávamos a jogar com 10 desde os 60 minutos. Estava 0-0, marcámos e ganhámos o jogo», recorda Pedro Frias.

No plantel não há profissionais. Há jogadores que são também artistas mas noutras áreas: «Hotelaria, pintura, há um jogador que tem um bar o que até complica a vinda aos treinos. Eu sou músico, o treinador de guarda-redes também
», conta o técnico.

Pedro Frias estreia-se este ano como adjunto depois de ter começado como olheiro. « Um dia fui ver um jogo do adversário e entreguei um relatório de sete páginas. Acharam um exagero», atira entre risos. André Villas-Boas também começou assim, lembrámos. «Pois e também fazia relatórios muito detalhados, não é? Vi alguns já», responde.

Juntamente com o treinador Carlos Gordinho espera levar a bom porto o projeto. E fazer com que o Algarve United deixe de ser uma sombra e o Carvoeiro brilhe por nome próprio.