«Dúvida? Não! Mas luz, realidade… E sonho que na luta amadurece», escreveu Pedro Homem de Melo em «Aleluia», um poema que bem debruar a ouro sobre azul uma conquista feita de sangue, suor e lágrimas. Como tantas outras do FC Porto.

O FC Porto é campeão nacional!

Dito agora, nesta noite tórrida do Dragão, a exclamação nem soa a surpresa. Mas o longo caminho de onze meses no campeonato mais longo da história foi uma jornada repleta de peripécias e que acabou em consagração.

No fim da primeira volta, o FC Porto tinha sete pontos de atraso para o Benfica. Agora, a duas jornadas do fim, garante o 29.º título com oito de vantagem.

Uma das mais inacreditáveis recuperações do futebol português culminou esta noite, num Dragão sem a chama dos adeptos, diante de outro rival, naquele que terá sido o clássico mais vazio de todos os tempos.

Vazio de gente, não de história.

Sérgio Conceição venceu o segundo campeonato em três e igualou o feito de Mourinho, ao ganhar os quatro clássicos da Liga na mesma época.

Para que se cumprisse esse pequeno feito, comparado com o título e a milionária entrada direta na Champions, Rúben Amorim teve a primeira derrota na Liga – não perdera tanto pelo Sporting como pelo Sp. Braga. A única derrota de Amorim nas provas internas foi a 15 de dezembro 2019, ainda pelo Braga B, contra o Merelinense, para o Campeonato de Portugal.

Sete meses depois, o Conceição vergou Amorim, que já havia o vencido esta época por duas vezes pelo Sp. Braga, e do FC Porto vergar mais um rival, naquele que foi também o clássico dos miúdos.

Entrada de leão, saída de sendeiro

O Sporting apareceu com cinco jogadores da casa no onze e quatro no banco, o FC Porto tinha Fábio Vieira de início e sete dos nove suplentes eram da formação.

Amorim, com duas alterações de início, apresentou o seu habitual 3-4-3, com Conceição, que fez quatro alterações, a lançar em campo um 4-4-2 com Díaz solto na frente ao lado de Marega.

A entrada do Sporting foi de leão. Minuto 1 e já a bola estava na baliza do FC Porto, apesar do lance anulado por fora de jogo a Sporar. Mérito da Nuno Mendes, que sobre a esquerda era uma locomotiva.

O FC Porto reagiu e também não tardaria a ter o seu golo anulado. Aí, por mão na bola de Díaz. Aqui, o mérito foi de Fábio Vieira. Na estreia a titular, o extremo de 20 anos mostrou o porquê da aposta: coloca a bola onde põe os olhos e na primeira parte isolou por duas vezes o colombiano, perdulário.

Sem o lesionado Sérgio Oliveira e o castigado Uribe o meio-campo mostrava esclarecimento só quando Fábio Vieira ou Otávio derivavam para a zona central para pegar no jogo. Danilo dava vigor e capacidade de desarme, Loum dava pouco mais do que nada. Era curto, ainda assim.

A maior ausência era, ainda assim, a de Corona, também castigado. Faltava ali um virtuoso com discernimento. Díaz só cumpre a primeira premissa.

O Sporting chegava rápido lá na frente. Com uma equipa com nervo e talento encarou o FC Porto nos olhos e chegou ao intervalo a dividir a posse de bola, com mais cantos (6-2) e remates (5-4).

Se a entrada do Sporting foi de leão. A saída, porém, acabou por ser de sendeiro.

Capitão a indicar o caminho

Na segunda parte, o Sporting foi perdendo pulmão e o FC Porto foi ganhando terreno. Aos 63m Fábio Vieira deu o aviso, com uma bola à barra. Logo de seguida, a ameaça concretizou-se. E o capitão Danilo que já havia sido decisivo em Tondela, voltou a abrir o marcador, da mesma forma: canto e desvio de cabeça.

Tinha de ser de bola parada que este FC Porto havia de se consagrar campeão.

Soltaram-se fogos de artifício nas imediações do estádio, ouviram-se cânticos a espaços. A festa que havia começado com um cortejo impressionante entre o hotel e o estádio, continuou na medida do possível num tempo de jogos à porta fechada e em que a distância social se impõe.

A confirmação do triunfo havia de chegar por Marega ao minuto 90. O mal-amado, símbolo de uma equipa que nem sempre deslumbrou, mas suou a cada minuto.

O FC Porto é o campeão da resistência, do espírito competitivo, do trabalho, da vontade. É também a melhor equipa nacional nesta temporada. Inequivocamente. Melhor defesa, melhor ataque e protagonista da tal recuperação incrível de 15 pontos para um Benfica que se desmoronou no caminho.

Dado como acabado uma e outra vez ao longo da época, o FC Porto é também o campeão da esperança. E também é simbólico isto de o verde leonino selar a consagração do rival.

Essa esperança que Conceição nunca perdeu em cada batalha. E que nos faz voltar a «Aleluia», a versos que até já chegaram a emoldurar o autocarro da equipa:

«E azul e branca essa bandeira avança…

Azul, branca, indomável, imortal…

Como não pôr no Porto uma esperança

Se “daqui houve o nome Portugal”?»