«Eu não chorei!», garantiu Carlos Lopes, que se dirigia a Moniz Pereira, emblemático treinador do Sporting e da selecção nacional de atletismo, e que 25 anos depois da histórica conquista da medalha de ouro na maratona nos Jogos Olímpicos de 1984, em Los Angeles, ainda não consegue controlar a voz e as lágrimas quando fala no rapazote de Viseu - «Vildemoinhos», corrigiu o visado - que naquela madrugada de 12 Agosto fez o que até então ninguém imaginara ser possível.
«Foi o melhor atleta do mundo em meio-fundo e fundo, o mais completo corredor de sempre. Havia quem fosse bom na pista e não na estrada, quem fosse na estrada e não no crosse, mas Carlos Lopes era bom em todas», argumentou Moniz Pereira, por ocasião da homenagem do Sporting ao antigo atleta, que teve lugar em Alvalade, na passada segunda-feira, já sem o microfone com o qual, durante cerca de uma hora, no auditório de Alvalade, recordou os feitos de Carlos Lopes.
Com a dignidade que os 90 anos lhe conferem, chorou quando viu o pequeno filme a recordar a entrada de Carlos Lopes no Coliseum de Los Angeles, mas sorriu quando lembrou que o atleta que tinha sido atropelado na Segunda Circular 15 dias antes da prova tinha chegado «inteirinho» aos Estados Unidos. «Esqueci-me que era mais forte do que a gente pensava», lembrou, como o nervoso miudinho que o atormentou na véspera e no dia da prova, excepto a Carlos Lopes.
O dia em que soube que seria um dos melhores
«Tive sorte», reconheceu o primeiro campeão olímpico português, revendo a longa carreira em breves segundos. «Todos os anos fui melhorando as minhas marcas pessoais e quando comecei a perceber que não era tão mau como me pintavam, comecei a acreditar que podia chegar mais longe», disse Carlos Lopes, que coleccionou títulos, medalhas, alegrias, mas também lesões e tristezas.
«Foi quando venci Anacleto Pinto [carismático atleta do Benfica], que soube que mais tarde seria o melhor», confessou. E se o clube da Luz o tentou. Mas o Sporting foi mais rápido - «Os meus pais só souberam meio ano depois que tinha assinado contrato», revelou Carlos Lopes - e com receio que o rival contratasse o jovem atleta de Vildemoinhos, foi até lá garantir que a viagem terminaria em Alvalade. «Na Batalha comecei a chorar, tinha 17 anos e era um grande passo para mim, porque nunca tinha saído da terra, excepto quando ia participar em provas.»
Foi a 12 de Agosto de 1984. Carlos Lopes, então com 37 anos, a caminho dos 38, correu mundo com a conquista da medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de Los Angeles. Foi o mais velho e mais rápido atleta do mundo na maratona durante 24 anos. Em 2008, nas Olimpíadas de Pequim, o recorde foi batido, mas A Portuguesa voltou a tocar.
O presidente do Sporting, José Eduardo Bettencourt, aproveitou para lembrar os atletas do clube que com «esforço, dedicação, coragem e persistência» é possível sonhar.