20 de Junho de 2000: Portugal-Alemanha, 3-0

Ensinaram-me que para fazer um artigo de opinião em condições convém ter uma boa ideia para defender logo de início. Cá vai: detesto meias verdades.

Gary Lineker disse um dia que no futebol «são onze contra onze e no final ganha a Alemanha». Talvez tenha sido assim, mas a sentença já deveria ter sido atualizada há muito. Doze anos, precisamente.

«No futebol são onze contra onze e no final ganha a Alemanha, exceto se do outro lado estiver o Sérgio Conceição». Assim é que é.

Ok, o Carlos Manuel também lhes mostrou a fibra portuguesa, mas foi só parecido. Humilhar alemães é com o Sérgio Conceição.

Habituei-me a torcer contra a Alemanha porque nutro simpatia pelos underdogs. Fui búlgaro em 94, checo em 96 e croata em 98, por exemplo. Em 2000 só precisei puxar pelo orgulho lusitano que tenho em abundância. E Sérgio Conceição fez-me feliz.

Acho que nunca um português tinha arreado tanto em estrangeiros desde a Padeira de Aljubarrota. O nosso Sérgio fez do pé direito a pá do forno com que Brites de Almeida presenteou os espanhóis. E despachou os alemães um a um.

Eu já o admirava pela forma extraordinária como o seu penteado resistia heroicamente às agruras do jogo. Mas como nunca percebi bem se o mérito era dele ou da Loreal acabei por centrar-me naquele Portugal-Alemanha.

Dizem-me que hoje estamos nas mãos dos alemães. Talvez seja. Mas só é assim porque Sérgio Conceição está em Olhão e não em São Bento.

Recordar aquele jogo é lembrar um Portugal de reservas que reservou um lugar na história. Por orgulho, apenas. Para mostrar que nem sempre são eles que ganham.

Foram todos brilhantes, mas o Sérgio foi enorme. Não sei se ele tinha comido alguma bola de Berlim estragada, se tinha batido com o Mercedes ou se tinha bebido uma Erdinger que não estava lá muito fresquinha.

O que eu sei é que entrou em campo como se o tivessem chateado mesmo a sério. E tratou logo de os envergonhar.

Um hat-trick perfeito. Primeiro com a cabeça, depois com pé esquerdo e por fim com o direito. Do outro lado Kahn, Matthaus, Ballack ou Bierhoff...atónitos. Incrédulos. A formula mágica de Gary Lineker estilhaçada por um conimbricense de feitio difícil e coragem para dar e vender.

De lá para cá, Portugal já perdeu com a Alemanha em 2006 e 2008. Porque não tinha o Sérgio Conceição.

Aliás, ainda hoje acredito que Marc Batta não expulsou Rui Costa, na caminhada para o França 98, por causa da perda de tempo. O problema foi outro. Ia entrar o Sérgio Conceição...

«Cartão de Memória» é um espaço de opinião/recordação acerca dos mais míticos jogos do século XXI, o tempo de existência do Maisfutebol. A ordem dos jogos reflete apenas a vontade do autor. Pode sugerir-lhe outros momentos através do Twitter.