Artigo original: 31-01-2018 23:45

«CHUTEIRAS PRETAS» é um espaço de Opinião do jornalista Pedro Jorge da Cunha. Um olhar assumidamente ingénuo sobre o fenómeno do futebol. Às quintas-feiras, de quinze em quinze dias. Pode seguir o autor no Twitter. Calce as «CHUTEIRAS PRETAS».

Vestem fato e gravata negros, a camisa é de um branco imaculado, os óculos cumprem o protocolo: escuros.

Penteiam o cabelo para trás, banhado em brilhantina. E fumam, fumam muito.

Mr. Pink, Mr. Blue, Mr. Orange, Mr. Brown, Mr. White, Mr. Blonde, os Cães Danados de Quentin Tarantino, 1992 ano louco em Hollywood.

Parceiros no crime, ideólogos de um golpe longe de ser perfeito. Sentam-se à mesa ao pequeno almoço, comem bacon and eggs, engendram a teia maquiavélica. Tudo bons rapazes.

Une-os uma necessidade comum. Dinheiro. Talvez a atração pela adrenalina do logro, mas sobretudo o dinheiro.

Um pilar de entendimento frágil, como rapidamente se constata. A coisa corre mal, o sangue jorra em golfadas à Niagara num armazém escuro, Tarantino filma como gosta, retrata o submundo de uma Los Angeles vetada aos holofotes.

Revejo a película, absolutamente brilhante, e imagino os figurões protagonistas do futebol luso. À mesma mesa, de fatos impecavelmente desenhados, sorridentes e certos de que o futebol é o palco certo para a auto-promoção.

Negoceiam, assinam acordos, rasgam princípios, tornam a Verdade uma noção rapidamente distorcida pela necessidade de resultados. Resultados, quem os não tem?

A balada é um ritmo lento. Filmada em slow motion, para angústia dos que amam e respeitam o jogo.

Este Pink acusa o Blonde, Brown aponta o dedo ao Orange, White processa Blue e Blue processa White. É um somatório assustador de mentiras, meias verdades e manipulação.

Estamos entregues a esta gente. Mesquinha, conflituosa, incoerente, incapaz de ser um exemplo de respeito e boas práticas.

Daqui ninguém sai vivo, decide Tarantino. E do futebol português?

A Justiça que decida. Dura lex, sed lex.

Não matem num armazém escuro aquilo que nos fez apaixonar por este jogo: a crença (inegociável) no talento dos artistas, a certeza de ser ele (o talento) a decidir.

Sem fatos negros, camisas brancas, óculos escuros ou brilhantina.

Só calções, chuteiras, meias e caneleiras, camisola orgulhosamente ilustrada pelo brasão abençoado.

Mais do que os figurões, os clubes são o emblema e as cores. Não os rasguem, respeitem os fundamentos das vossas instituições. Ganhem juízo.

«CHUTEIRAS PRETAS» é um espaço de Opinião do jornalista Pedro Jorge da Cunha. Um olhar assumidamente ingénuo sobre o fenómeno do futebol. Às quintas-feiras, de quinze em quinze dias. Pode seguir o autor no Twitter. Calce as «CHUTEIRAS PRETAS».