Um episódio na Austrália foi premonitório. O trabalho era maior do que ele. David Moyes nunca compreendeu a grandeza do Manchester United, nunca agarrou os jogadores desde início e, apesar de ser o treinador com a terceira melhor percentagem de vitórias na história do clube, saiu. Despedido… O sucessor escolhido por Alex Ferguson falhou.

A popular Bondi Beach foi o palco daquele momento, como contou o The Telegraph. O United estava na Austrália em digressão, num sítio que Moyes conhecia. Já ali tinha estado com o Everton, o clube de onde vinha. Por isso, decidiu-se. Depois do treino, os jogadores iam passear pela praia para relaxarem…

…acabaram no terraço de um bar, refugiados de uma multidão ávida de recordações e contacto com os craques. A segurança teve de ser chamada. Em definitivo, aquilo não era o Everton, que tinha passado quase despercebido entre quem gozava o sol, ainda que as roupas indicassem quem aquelas pessoas eram. Ao fim de alguns dias de pré-época, Moyes ainda não percebera aonde tinha chegado.

Talvez a equipa técnica que Alex Ferguson deixara em Old Trafford o pudesse ajudar. Mas o escocês ex-Everton sempre foi tido como um homem correto e sério. Não quis deixar em Liverpool quem o tinha ajudado e mudou tudo. Foram os adjuntos de Ferguson, chegaram os dos
Toffees. Uma decisão que teria consequências graves.




Um grupo de campeões e, convenhamos, de jogadores bem estabelecidos na vida, foi adverso a tamanha mudança. Se o que antes existia funcionava, se o que antes existia fez o Manchester United ganhar a Premier League com 11 pontos de avanço na última época, para quê alterar tanto? As primeiras queixas aos métodos de David Moyes foram conhecidas bem cedo, com Van Persie, uma das estrelas da equipa, à cabeça.

Moyes nunca entendeu que aqueles não eram jogadores que tinham algo a provar, mas que já tinham sucesso. Os perfis dos egos eram diferentes, para o bem e para o mal, do que encontrara em Liverpool. E depois de Van Persie, Rio Ferdinand e Vidic davam sinais de descontentamento. No mercado, a compra de Fellaini foi um erro que nem a transferência de Juan Mata compensou.

O holandês voltaria à carga, para criticar as táticas de Moyes. Disse que havia quem jogasse nos espaços que ele gosta de ocupar e que, por isso, tinha de procurar outros terrenos. Moyes refreou o meio-campo, deixou avançados sozinhos e, se fora de portas a estratégia dava resultados, em Old Trafford, onde a posse de bola era maior, o plano foi um desastre: em casa, o United é 11º na Liga, fora é segundo.

Pior do que isso, o ManUtd do escocês conseguiu acabar com alguns recordes. Perdeu em casa e fora com Liverpool e Everton, o que aconteceu pela primeira vez na História do clube! Em Old Trafford, perdeu pela primeira vez com o Swansea, perdeu com o Newcastle o que não acontecia desde 1972 e com o Stoke, cuja última vitória no terreno do United datava de 1984! O West Bromwich? Não vencia ali desde 1978.



No início de tudo, esteve ainda Wayne Rooney. Desejado pelo Chelsea, o avançado inglês esteve com um pé fora do United. O internacional inglês fora orientado por Moyes no Everton, mas a relação entre ambos deteriorou-se quando o técnico colocou Rooney em tribunal, devido a afirmações feitas pelo avançado numa autobiografia aquando da transferência para o United, em 2004.

O camisola 10 do United acabou por pedir desculpa e pagar uma indemnização, que Moyes reencaminhou para a associação de antigos jogadores do Everton. O episódio teria ficado para trás, mas num verão quente como o último terá vindo à memória que Rooney acusou o treinador do United de o ter forçado a sair do Everton.

Por último, mas com extrema importância, o discurso. Mesmo nos primeiros anos, Alex Ferguson mostrou ser um líder quando falava através da imprensa. Moyes usou demasiada «esperança». E abusou do «vamos tentar» num clube que está habituado a «conseguir». E mesmo com todas as evidências à frente, Moyes deu mais um sinal de que não percebera a grandeza do United, ou não teria dito isto na véspera de defrontar o Bayern Munique: «Somos tão bons como qualquer outra equipa.»  Os problemas de comunicação sucederam-se e era eles que davam as provas: o escocês não tinha tamanho para o cargo.



David Moyes é o técnico com a terceira melhor percentagem de vitórias no clube [52,9 por cento]. Está à frente de treinadores históricos e com sucesso como Matt Busby [50,5], Ron Atkinson [50] e Tommy Docherty [50]. Mas enquanto estes pegaram num clube à procura de sucesso, Moyes encontrou um United à procura de não perdê-lo. O que faz e fez toda a diferença para um treinador que ao serviço do Everton só nos últimos anos de 11 conseguiu estabilizar a equipa na metade de cima da tabela.

Agora, em Old Trafford, segue-se Ryan Giggs. Não é expectável que o galês mude muita coisa. Ou mude alguma, sequer. Mas sabe-se, e basta olhar para o rival Liverpool, que um grande clube acaba sempre por renascer. Por isso, a grande dúvida quanto ao futuro centra-se apenas em David Moyes. Irá ele renascer, ou continuará ocupado a tentar perceber o que é o Manchester United?