Aos 18 anos, Mauro era uma promessa do futebol português e trocava um longo percurso nas camadas jovens do FC Porto pela oportunidade de crescimento nas reservas do Chelsea.
O defesa-central representou os londrinos na temporada 2002/03, conviveu com John Terry e Frank Lampard mas optou por regressar ao seu país no verão seguinte.
Penafiel, Paredes, FC Marco e Esmoriz foram as etapas seguintes, nos escalões inferiores de Portugal, até tomar uma decisão pouco habitual: aos 24 anos, trocou o sonho do futebol por um futuro como comissário de bordo.
Mauro não teve lesões nem perdeu o gosto pelo jogo. Foi apenas uma escolha, uma decisão necessária uma fase prematura da carreira.
A TAP, companhia que ofereceu estabilidade ao antigo jogador, pedia comissários de bordo até aos 25 anos. Era o momento decisivo, um agora ou nunca, a opção entre alimentar um sonho que ia desenvolvendo contornos menos felizes ou optar pelo fim abrupto e seguir em frente.
Em entrevista ao Maisfutebol, após uma viagem ao Rio de Janeiro, Mauro recorda essa decisão de 2006 e não denota qualquer tipo de arrependimento.
«Tenho família no ramo da aviação e naquela altura fui pela cabeça, não pelo coração. Estava num ponto mediano, no Esmoriz, e pensei que já não voltaria ao mais alto nível. Como o limite de idade na maior parte das companhias aéreas são os 25 anos, tive de decidir nesse momento.»
Para trás ficaram onze anos nos escalões de formação do FC Porto e uma experiência inesquecível no Chelsea. Mauro não esconde as saudades desses momentos mas sente que tomou a decisão certa.
«Até o meu treinador no Esmoriz, Caetano, deu-me os parabéns por isso, sabe que foi difícil. As pessoas vivem com a ilusão de que o futebol é para sempre mas eu sabia que não. Talvez ainda pudesse chegar a outro nível, quem sabe, embora não me arrependa.»
O grande arrependimento - assume o comissário de bordo - prende-se com o regresso a Portugal em 2003.
«Um dos meus erros foi sair de Inglaterra após o primeiro ano no Chelsea. Lá valoriza-se mais o jogador, ao contrário de aqui. Queriam emprestar-me ao Queens Park Rangers, continuaria ligado ao Chelsea, mas o ano tinha sido difícil, estava sozinho em Londres, com um clima escuro, e optei por regressar ao futebol português.»
Mauro Óscar Coelho da Silva, atualmente com 31 anos, chegara ao Chelsea após a parca utilização nos juniores do FC Porto sob o comando técnico de João Pinto.
«Estive muito tempo no FC Porto, estava habituado a jogar e a ser capitão de equipa, mas chegando aos juniores, sendo júnior de primeiro ano, percebi que João Pinto preferia os jogadores mais velhos. No final dessa época, sabendo que ele ia continuar, optei por encontrar outro rumo. Saí por opção.»
Um empresário abriu-lhe as portas do futebol inglês mas foi Mauro a apontar o caminho para Stamford Bridge.
«Amadeu Paixão tinha boas ligações em Inglaterra e queria-me no Fulham, mas falei com ele e quis ir treinar ao Chelsea, onde estava outro português, o Filipe Oliveira. Gostaram de mim e acabei por assinar contrato.»
Temporada 2002/03. Este ainda não era o Chelsea de Roman Abramovich (chegaria no final da época) ou José Mourinho.
«Mesmo assim, tinha uma grande força e pude treinar com jogadores como Terry ou Lampard. O Lampard é calado, mas o Terry falava muito, apoiava bastante os jovens. Depois havia ainda o Jimmy, que tinha jogado em Portugal, o Zenden, Zola e um treinador consagrado: Ranieri.»
Mauro disputou o campeonato de reservas em Inglaterra e regressou a Portugal para tentar chegar à Liga. Assinou pelo Penafiel, que tinha um projeto de subida no segundo escalão.
«Depois do Penafiel, Jorge Regadas falou comigo e disse-me para ir para o Paredes e que depois ele me iria levar para o FC Marco, novamente na II Liga. E assim foi. Tínhamos grande equipa, mas começaram os problemas financeiros e tudo desmoronou. Seguiram-se duas épocas no Esmoriz, na II Divisão B, e a tal decisão que mudou a minha vida.»
Como comissário de bordo, o antigo defesa-central cruza-se regularmente com antigos companheiros de equipa e percebe que a estabilidade é um luxo.
«Nos voos de e para a Madeira costumo apanhar muitos jogadores que estão na II Liga, ou no Campeonato Nacional de Seniores, e percebo que têm dificuldades por salários em atraso. Nesse sentido, posso dizer que a estabilidade que tenho me dá um grande conforto.»
Mauro é feliz. Nas viagens de longo curso também convive com jogadores que estão num patamar interessante e aproveita esses momentos para matar saudades.
«Ainda recentemente apanhei o Hugo Almeida, que jogou comigo, o Yannick Djaló e o Manuel Fernandes a vir da Rússia e falei bastante com eles. Noutra viagem foi o João Moutinho. Dá para matar saudades. O futebol completou-me naquela altura, mas posso dizer que hoje em dia venho sempre trabalhar com um sorriso.»
A sua equipa é outra, embora tenha igualmente onze elementos.
«Comecei com viagens de médio curso mas agora faço médio e longo curso. É esse o passo seguinte, onde me encontro, depois vêm as viagens apenas de longo curso e as posições de chefia. Curiosamente, nas viagens longas também somos onze: dois pilotos e nove assistentes. E temos muitos treinos para estarmos afinados.»
A vida sorri a Mauro e permite-lhe experiências inesquecíveis. A conversa com o Maisfutebol surgiu depois do regresso do Rio de Janeiro. Viajou no sábado, regressou na madrugada de terça-feira. Pelo meio, foram momentos de descanso e lazer na cidade brasileira.
«Já conheci muitos países graças a isso, seja na Europa, em África, no continente americano….Falta-me apenas a parte da Ásia, veremos se com a privatização da TAP teremos viagens para lá. Gosto muito do que faço, adoro o convívio com pessoas e o encontro de culturas. Sou feliz.»
RELACIONADOS
Cavaco: dos golos com Pauleta à segurança num centro comercial
Hélder Calvino: segurança, barman e animador noturno
Ivo: do choque com Mantorras à distribuição de encomendas
Mawete: hotelaria, agropecuária e piscicultura em Angola
Um funcionário público pentacampeão pelo FC Porto
Ivo Damas: a segunda vida como comercial de automóveis