Depois do Adeus é uma rubrica dedicada à vida de ex-jogadores após o final das carreiras. O que acontece quando penduram as chuteiras? Como passam os dias? O dinheiro ganho ao longo dos anos chega para subsistir? Confira os testemunhos, todos os meses, no Maisfutebol.

Nem no mais maltratado dos relvados ficou no estado em que fica quando acelera nas provas de todo-o-terreno. Delfim deixou o futebol em 2009, depois de ter representado o Boavista, D. Aves, Sporting, Marselha, Moreirense, Young Boys, Naval e Trofense, mas mantém-se ligado ao desporto: «Sempre tive paixão por motas. Faço enduro e provas de todo-o-terreno, em motas de duas rodas.»

Esta paixão «era incompatível» com a carreira de futebolista, por isso, mal pendurou as chuteiras começou «a dar os primeiros passos» nesta área. «É algo que me preenche», conta Delfim ao Maisfutebol, apontando que se mantém competitivo: «Levo muito a sério. Concentro-me e tento evoluir de dia para dia.»

«Os médicos dizem que não deveria fazer o que estou a fazer», admite, recordando os tempos difíceis em que uma lesão na coluna o afastou dos relvados durante 30 meses: «É contra indicado para a coluna, mas a verdade é que prefiro fazê-lo e arrepender-me de tê-lo feito do que, mais tarde, perceber que deixei passar essa oportunidade e que não experimentei. Dentro de um regime de segurança elevado tento tirar prazer dessa modalidade.»

Apesar de dedicar muito do seu tempo a esta paixão, as motas «são um hobby», não são a sua principal atividade, o seu ganha-pão. «Faço a gestão do património que foi adquirido durante a minha carreira, o que já me ocupa grande parte do tempo, e tenho o privilégio de ser pai a cem por cento de três magníficos filhos.» 

 

 
Dá para sobreviver? «Felizmente», aponta Delfim, acrescentando que os seus rendimentos estiveram «longe de patamares a que estamos habituados ouvir, porque no futebol existe uma disparidade muito grande». Mas não se queixa. Pegou nas ferramentas que a vida lhe deu e construiu uma vida confortável: «As lesões foram-me dando orientações no sentido de amealhar e de investir. Sempre tive essa preocupação. Quando me deparei com a lesão gravíssima na coluna, não havia estatísticas que me valessem quanto à continuidade da carreira, o que me obrigou a pensar mais além. Levou-me a pensar no que poderia fazer fora da minha atividade. O que poderia fazer, onde poderia investir e como, para manter a qualidade de vida que tinha até então. Ou, pelo menos, equiparada. Desde cedo comecei a pensar no futuro. Felizmente, até à data, as coisas têm corrido bem, dentro de uma linha de orientação e princípios. São apostas, investimentos diversificados. Não ponho todos os ovos no mesmo cesto. Há que acompanhar a conjuntura, não se precipitar, ser correto, ser frontal e não ter medo.»

Investir implica correr riscos. Não existe mesmo o receio de falhar? «Ninguém pode dizer desta água não beberei. Quem pode dizer que está tranquilo? Seja qual for a profissão, ninguém poderá afirmar que está ou estará isento de problemas. É uma questão de princípios. Vai de cada um. Se não tenho formação para investir num restaurante ou numa empresa de material desportivo, nunca o farei. Colegas meus, ou antigos colegas, muitas vezes fizeram investimentos influenciados por pseudo-amigos e gente aparentemente experiente em determinadas matérias, a nível empresarial. São pessoas que iludem e depois as coisas correm mal. Para o bem e para o mal, sempre geri pela minha cabeça, sem sociedades, e tenho-me saído bem.»

Apesar de estar «afastado do futebol a cem por cento», Delfim não coloca de parte a ideia de a modalidade voltar a fazer parte da sua vida. Nunca considerou a hipótese de abraçar a carreira de treinador, mas se falarmos num regresso «como diretor» a conversa já é outra. «A curto/médio prazo, vejo-me a trabalhar nessas funções», conta ao Maisfutebol, acrescentando: «A modalidade precisa cada vez mais de gente do futebol. Não diria que se deve dar protagonismo a quem está ou esteve no campo, mas sim que se deve criar espaço para pessoas do futebol. É lógico que não há espaço para todos, mas creio que os bons, as pessoas que viveram o futebol por dentro durante longos anos, dada a experiência adquirida, conseguiriam acrescentar algo mais.»

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