Radamel Falcao lesionou-se há uma semana e foi operado no último sábado, 25 de janeiro de 2014. O avançado colombiano sofreu uma lesão no ligamento anterior cruzado do joelho esquerdo mas não perde a esperança de disputar o Campeonato do Mundo de 2014.

A Colômbia, que torce pela sua referência ofensiva, disputa o primeiro jogo a 14 de junho. Pouco menos de cinco meses, algo longe dos seis, o prazo médio para a recuperação deste tipo de lesões. José Carlos Noronha, o médico que operou El Tigre no Porto, aponta Derlei como exemplo e diz que Falcao tem «50% de probabilidades de recuperar a tempo do Mundial.»

Derlei, com a camisola do FC Porto, fez uma rotura do ligamento anterior cruzado do joelho direito a 22 de dezembro de 2003 e voltou à competição a 25 de abril de 2004. Ou seja, cerca de quatro meses.

Noronha admite que o brasileiro era especial, «um fenómeno da natureza». Em entrevista recente ao Maisfutebol, o médico relatou até um episódio delicioso: «O Derlei foi operado e, ainda a recuperar da anestesia, gritava pelo Jorge Mendes [empresário] e dizia que queria ir treinar. Nunca vi ninguém com essa garra.»

Poderá Radamel Falcao encarar o processo da mesma forma? Jackson Martínez (FC Porto) e Fredy Montero (Sporting) são partes interessadas na matéria. Torcem pela recuperação do compatriota, por certo, mas sabem que terão mais espaço sem ele.

«Tem de se trabalhar sobretudo a parte mental»

Derlei atende o telefone na sua residência de São Bernardo do Campo, no Estado de S. Paulo. A partir do país que se prepara para receber o Mundial, o ex-jogador fala sobre a recuperação e deixa alguns conselhos a Falcao. 

«Tem de se trabalhar sobretudo a parte mental. Quando eu me lesionei, falaram-nos nos seis meses e tentei logo estabelecer um objetivo: queria jogar antes do final da época. Não sabia que seria um jogo do campeonato, a meia-final ou a final da Liga dos Campeões, queria apenas jogar», começa por recordar, em conversa com a Maisfutebol Total.

O brasileiro superou todas as expectativas. Regressou no final de abril e foi suplente utilizado frente ao Alverca (1-0), na antepenúltima jornada do campeonato.

Na ronda seguinte, a presença do onze como forma de preparação para o jogo decisivo: Corunha à vista! Derlei foi titular na segunda mão das meias-finais da Liga dos Campeões e converteu o penálti decisivo (0-1). Tudo valera a pena.

No total, o avançado do FC Porto disputou seis encontros até ao final da época, incluindo 120 minutos no Jamor, na vitória do Benfica após prolongamento, e 78 minutos em Genselkirchen, no histórico 3-0 frente ao Mónaco.

«Cada pessoa recupera de forma diferente, mas acredito que o Falcao vai estar no mundial. Vi a lesão dele, foi uma infelicidade tremenda, uma fatalidade, até porque vinha de um momento fantástico. Tenho a absoluta certeza que o Falcao estará aqui no Brasil. Estou à espera dele!»


A câmara hiperbárica e a história de Pepe

Radamel Falcao pode agradecer aos avanços da medicina. Entre outras práticas recentes, El Tigre está sujeito a períodos de tempo na câmara hiperbárica, onde recebe oxigénio através de uma máscara para que este, através da corrente sanguínea, chegue ao ponto do corpo que precisa de regeneração.

Em maio de 2009, antes de o colombiano chegar ao Porto, Hulk contraiu uma rotura de ligamentos do tornozelo esquerdo. O tempo previsto de paragem era de um mês mas o brasileiro sujeitou-se à câmara hiperbárica no Hospital Pedro Hispano e recuperou em duas semanas.

O processo não é confortável, longe disso. Falcao revelou isso mesmo na segunda-feira. «É uma sensação estranha estar lá, é como estar a 14 metros de profundidade. Hoje quase ia saindo, mas os médicos pediram-me para ficar mais um pouco e fiz um esforço.»



Derlei é o recordista mas sobram outros exemplos para alimentar a esperança de Radamel Falcao. Pepe recuperou a tempo do Mundial de 2010, embora a sua lesão tenha sido contraída em dezembro do ano anterior. Ou seja, um mês de vantagem em relação ao colombiano.

Pepe foi operado a 17 de dezembro de 2009. Tinha uma rotura do ligamento cruzado do joelho direito. Nessa altura, o jogador do Real Madrid escolheu o Porto e o médico José Carlos Noronha, submetendo-se à intervenção cirúrgica na Ordem da Trindade, tal como Falcao.

Na altura, o especialista Domingos Gomes explicou ao Maisfutebol o que estava em causa. «O que está em causa é a formação de um novo ligamento. Basicamente a cirurgia que o Pepe vai fazer é para substituir o ligamento afetado por um novo, retirado de outro lado, da rótula ou de um músculo. E esse novo tendão demora esses seis meses a fortalecer-se, a ter vasos novos, nervos novos, sensores novos.»

«Cada atleta tem a sua reação. A minha experiencia diz-me que exceções há sempre. Mas umas foram boas, outras foram catastróficas», admitiu Domingos Gomes.

Pepe recuperou em cima da hora, a tempo de disputar o Mundial. Recordam-se outros nomes, outras histórias. Paulo Ferreira, Simão, César Peixoto, Anderson ou Bebé.

José Carlos Noronha reconhece que, para lá dos casos de sucesso imediato, existem outras preocupações. Apenas 55 por cento dos jogadores com uma rotura do ligamento cruzado anterior conseguem voltar à forma anterior.

«Em parte por causa de algum erro no momento da operação, mas também devido ao medo que o jogador ganha de voltar a lesionar-se, mas penso que o Falcao não será um destes casos. Não é um jogador de ter medo e penso que teremos um bom resultado», disse o médico na segunda-feira.



«As consequências ficam para toda a vida»

Derlei garante que estava totalmente recuperado quando voltou a jogar. Porém, não esconde que os efeitos de uma lesão do género são incontornáveis, a médio e longo prazo.

«Estava realmente a cem por cento mas a cabeça também ajuda. Aliás, por mim até voltava antes mas tive de ouvir os médicos. A parte psicológica é fundamental e temos de puxar pelo nosso corpo, mesmo que em alguns casos isso possa encurtar um pouco a carreira», deixa escapar.

O medo tem de ser ultrapassado. «Quando voltamos a jogar, não podemos pensar nesse joelho, não podemos ter medo que ele volte a ceder, porque isso pode influenciar tudo. Mas claro que ficamos com sequelas disso», admite.

«As consequências ficam para toda a vida. Sobretudo quando deixamos de jogar, por já não termos a mesma estrutura muscular e o mesmo treino diário, ficam difíceis alguns movimentos, como dobrar, abaixar. Temos de ir lidando com isso», acrescenta Derlei.

De qualquer forma, Radamel Falcao tem o Mundial no seu horizonte e deve lutar pelo seu objetivo. Será uma corrida contra o tempo, tal como acontece no caso do português Bruma, mas não há limites para a esperança. Derlei serve de exemplo. «Acredito que no final de abril o Falcao já vai estar a treinar. Força para ele!»