O Maisfutebol desafiou os jogadores e treinadores portugueses que atuam no estrangeiro, em vários cantos do mundo, a relatar as suas experiências para os nossos leitores. São as crónicas Made in Portugal:

JOSÉ TAVARES, TREINADOR DO BEIJING GLORY FC

«Olá a todos,

Eu cheguei à China (Beijing) a 6 de Setembro de 2013 para ser treinador de uma equipa de chamada Beijing Glory FC, uma equipa nova a ser formada só com miudos nascido em 1997. O objetivo passa por competir no campeonato da terceira divisão, chamado League Two, para criar e fazer as bases para daqui uns anos ter a equipa na Super League.

Quando cheguei estive um mês enfiado dentro de um Hotel porque os miúdos estavam espalhados por toda China e era preciso chamá-los, o centro de estágio estava em obras e era preciso organizar toda a estrutura para poder começar: adjuntos, treinador de guarda-redes, médicos, cozinheiro, tudo.

Claro que demorou até tudo começar em pleno, mas o que não consegui foi um tradutor a tempo inteiro até janeiro, o que para mim foi uma experiência complicada mas gratificante. A isso, já lá vamos.

Vivemos todos num centro de estágio que aqui chamam de base. Connosco moram outras pessoas. Passo a explicar: o prédio é de dois andares e bastante comprido. Está dividido em 20 quartos por piso. Nós temos o primeiro e metade do segundo.

Todo o grupo mora ali. Quatro jogadores por quarto e eu, os adeptos, o cozinheiro e o médico com um quarto para cada um. O complexo é enorme, tem ginásio, tem 3 campos de relva sintética, 2 campos de relvado natural, 2 campos de 7, tem piscina, restaurantes, lojas e engloba mais dois prédios (blocos como o nosso) para poder alojar toda gente que aqui trabalha diariamente.

 
Ao princípio disse que não queria viver aqui e procuraram um apartamento para mim, porque nunca estive numa situação daquelas. O problema é que o centro de estágio está fora da cidade e o trânsito é algo fora do normal! Desde que cá estou nunca vi esta estrada vazia. Teria de levar com tudo aquilo todos os dias para sair da cidade logo de manhã e entrar na cidade ao fim da tarde. Morria!

Para além disso, iria perder toda a experiência de viver no meio destas pessoas, comer o que eles comem, viver como eles vivem. Isso para mim é o mais importante. Vivo tranquilamente, sem problemas, a comandar todo um grupo de trabalho aqui nesta residência enorme.

Nos primeiros dias dediquei-me a observar tudo: como comiam, a quantidade, o que comiam, a que horas as luzes se apagavam, os horários (estão sempre atrasados), o que comiam à noite, e fiquei aterrorizado com o que vi.

Tive de criar regras para tudo e para todos. A primeira: ninguém fuma dentro das nossas instalações e em frente aos miúdos. O cozinheiro, o médico e os adjuntos olharam de lado para mim e perguntaram onde eu iria fumar. Lá respondi que nunca fumei e ficaram admirados.

Sugiram alguns problemas mas consegui o que queria. Tivemos algumas reuniões para eu explicar o que pretendia. Mesmo no grupo havia miúdos que fumavam, era preciso dar o exemplo e cortar com isso. Neste momento, nenhum deles fuma e dizem-me que foi uma grande conquista.

Criei regras para mesmo tudo: o horário de apagar as luzes, o horário para entregar os telemóveis (sim, porque ficavam até altas horas a jogar no telemóvel), o horário a que têm de voltar após as folgas, o horário das refeições e até a quantidade do que comiam, porque era fora do normal para miúdos e para jogadores do futebol.

Posso dizer que foi um pouco como uma guerra, sei que o difícil na vida é mudar mentalidades mas eu já vinha bem preparado após a experiência na Índia e nesta altura tudo corre da melhor forma.

Até breve,

José Tavares»