O Sporting está mergulhado numa crise que não é, apenas, de exibições ou resultados. É uma crise institucional e em avaliação encontra-se, antes de todos os outros, o presidente do clube.

Institucional porque se trata de definir com exatidão quem faz o quê no futebol do clube..

O Sporting tem um presidente que veste calções, dá (mal, muito mal) toques na bola, senta-se no banco e insiste em ir ao balneário. Tem um diretor desportivo que foi até há pouco tempo treinador (e será que não pensa em voltar a sê-lo?). E, por último, tem um treinador que chegou já com os objetivos definidos pelo presidente, o mesmo que lhe lê em público a lista de reforços.

Quem faz exatamente o quê?

Qual o peso do treinador na escolha do plantel, das dispensas aos reforços, passando pelos jogadorea da equipa B que é preciso promover?

O treinador tem algo a ver com o que se passa na Academia, em Alcochete?

Quem define os objetivos para a época?

Bruno de Carvalho afirmou a candidatura do Sporting ao título ainda antes do final da temporada passada, durante uma entrevista à TVI24. Foi a 27 de março, Leonardo Jardim era o treinador em Alvalade, Marco Silva estava no Estoril.. Esta candidatura foi um passo que o tempo revelou precipitado.

O presidente do Sporting reforçou o plantel com Nani, conseguiu manter Slimani e William Carvalho, mas perdeu dois centrais (Rojo e Dier) e a equipa tem falhado precisamente no centro da defesa.

A dez pontos do líder, em quinto lugar atrás de Vitória de Guimarães e Sporting de Braga, Bruno de Carvalho forçou a nota ao propor uma moção de confiança, em assembleia geral. Um dos problemas do presidente leonino é achar que tudo se passa em seu redor. Na verdade, está enganado. Num clube grande, como o Sporting, o presidente nunca será o centro de todos os problemas ou virtudes. O caminho certo, neste caso, seria deixar trabalhar o treinador, manifestar confiança no rumo escolhido e salientar as coisas boas que têm sido feitas. Algumas delas partiram do presidente, sem dúvida. A reestruturação financeira e a continuada aposta em jogadores da formação, por exemplo.

No entanto Bruno de Carvalho escolheu o caminho errado. Agora que a Liga dos Campeões caiu, o campeonato já foi e a Taça da Liga não conta (opção absurda que só prejudica o clube), o presidente quer um responsável, que não ele. Sem imaginação, escolheu o treinador. Apesar de exclamar constantemente «eu sou diferente», Bruno de Carvalho tem alguns dos traços dos piores: ataques a jornalistas, populismo, presidencialismo, blackouts, descredibilização da competição.

Desta vez, porém, a opção é arriscada. Marco Silva é um jovem treinador que os adeptos do Sporting apreciam. Está a fazer pior do que Jardim, mas convém lembrar os factos: na época passada o FC Porto mergulhou numa crise invulgar e o Sporting de Braga andou mal. Não era provável que as circunstâncias se repetissem. Do meio para cima, o campeonato está mais equilibrado. E ainda falta muito para o fim.

Com Marco Silva, o Sporting eliminou o FC Porto no Dragão, para a Taça de Portugal, continua na luta pelo acesso direto à Champions, só saiu da Liga dos Campeões devido a um erro grosseiro do árbitro e estará na Liga Europa em fevereiro. Provavelmente era possível ter feito um pouco mais. Mas não muito mais. Este não é um treinador que os adeptos odeiam, bem pelo contrário. Aliás, seria um treinador bem recebido em todos os clubes da Liga.

Na prática, a maioria dos sportinguistas terá dúvidas em perceber exatamente o que se passa. Porque, lá está, esta é uma crise institucional, de definição de poderes e funções. Muito se joga nos bastidores, sem que os adeptos compreendam a exata dimensão dos problemas. Mas todos eles compreenderão que não é normal que os dois principais responsáveis do futebol, presidente e treinador, troquem indiretas em público. E Augusto Inácio classifique tão graves episódios como «poeira».

Os próximos dias ajudarão a perceber o futuro do futebol do Sporting. Seja qual for o desfecho, a qualidade de Marco Silva nunca sairá manchada e a sua carreira prosseguirá. O que está em causa é a governação, e a forma de governar, de Bruno de Carvalho. O presidente leonino sabe-o. Resta saber se isso também é claro para os adeptos.