E ao 17º dia o Europeu desemburrou: dez golos, grandes exibições individuais e três jogos animados - ainda que só um tenha sido equilibrado. Principalmente um tom festivo que andou arredado das jornadas da fase de grupos e do primeiro dia de eliminação direta. A noite fechou com chave de ouro, com Eden Hazard a assinar uma daquelas exibições que merecem tratamento à parte. Mas mesmo descontando a magia do capitão belga, houve muito de bom por onde pegar neste super-domingo em que os dois candidatos teoricamente mais fortes – Alemanha e França - puxaram dos galões e o principal outsider - a Bélgica – se regalou num festim de transições rápidas diante de uma corajosa Hungria.

A FIGURA: Griezmann

O jogo de estreia, com a Roménia, tinha deixado uma dupla interrogação: quanto à pontaria – duas ocasiões claras que não entraram – e quanto ao seu encaixe no desenho tático de uma França que o empurrava demasiado para a direita. Depois de uma passagem pelo banco, a redenção começou nos minutos finais do França-Albânia, quando a sua cabeçada evitou um nulo embaraçoso.

Mas foi ao quarto jogo que um dos melhores avançados europeus da atualidade – quem acompanhou a temporada do At. Madrid sabe que a definição até pode pecar por defeito – cumpriu todas as expetativas, sendo protagonista indiscutível da reviravolta dos bleus diante de uma Irlanda valorosa, e embalada por um golo madrugador.

É verdade que troca de Kanté por Coman, ao intervalo, foi o ingrediente que permitiu à França sufocar os irlandeses. Mas, do alto do seu 1,76, voltou a ser uma cabeçada imponente de Griezmann a desbloquear a situação, antes de uma combinação perfeita com Giroud – afinal são compatíveis, desde que Griezmann não fique preso à linha – consumar a vitória francesa. Pelo meio, ainda forçou uma expulsão e passou perto do que seria o primeiro hat-trick do Euro. Mas fez mais do que suficiente para alcançar Bale e Morata no topo dos marcadores e para se relançar como candidato a estrela do Euro, caso a França chegue tão longe como esperam os seus adeptos.

O MOMENTO: Draxler oficializa o talento

Nenhuma outra seleção chega aos quartos de final do Europeu com a mesma sensação de facilidade deixada pela Alemanha. A equipa de Joachim Löw tem estado tão acima das exigências, que vai conseguindo resolver algumas dúvidas ao longo do percurso. Uma, a do lateral-direito, vai sendo respondida pela adaptação de Kimmich. Outra – jogar com ou sem ponta de lança – tem tido resposta na eficácia de Mario Gomez. Finalmente, a terceira – qual a melhor opção para se juntar a Özil e Müller no trio criativo – ficou resolvida com a categórica exibição de Julian Draxler diante da Eslováquia.

Aos 22 anos, mesmo tendo um título de campeão mundial no currículo, o extremo do Wolfsburgo ainda não tinha consolidado o estatuto na Mannschaft onde as presenças esporádicas desde 2012 só lhe tinham valido um golo, em jogo particular. Assim, quando, já depois de um festival de dribles e de uma assistência maravilhosa para o 2-0, aos 63 minutos, na sequência de um canto, herdou uma bola cabeceada por Hummels para apontar, num remate à meia-volta, o seu primeiro golo numa grande competição, o momento teve contornos de oficialização. Uma ideia acentuada pela substituição operada por Löw, logo depois, em jeito de consagração: esta Alemanha ameaça ir longe neste Europeu, e Draxler já não é um ator secundário.

O FACTO

Pela primeira vez neste Europeu uma seleção marcou quatro golos num jogo: coube à Bélgica esse privilégio, mas até poderia ter sido a Alemanha a antecipar-se, caso não tivesse voltado a desperdiçar várias oportunidades na vitória folgada diante da Eslováquia – incluindo um penalti de Özil, quarta grande penalidade desperdiçada neste Euro em nove tentativas.

Mas o que uniu estes dois jogos, com abundância de golos e oportunidades ao eletrizante França-Irlanda, ao princípio da tarde? Todos eles tiveram golos madrugadores, essa grande raridade do Euro, que obriga as equipas a desmontarem mantes do planeado grande parte dos cuidados defensivos com que vão invariavelmente armadas para o campo. Em três jogos, neste domingo, marcaram-se tantos golos nos primeiros 15 minutos (quatro) como nos anteriores 39 encontros. Não é coincidência que o futebol tenha sido muito mais aberto do que até aqui.

A IMAGEM

É duro ser afastado de um Europeu, e mais duro ainda sair de cena com uma goleada. Mas, mesmo tendo sofrido a derrota mais pesada da prova, diante de uma Bélgica avassaladora, a seleção húngara pode voltar a casa com a cabeça bem erguida: vencendo o grupo F, à frente de Portugal, Áustria e Islândia, excedeu as melhores expectativas e, mesmo diante da Bélgica, ficou a dever ao acerto de Courtois um ou dois golos para atenuar o desaire. Por isso, é ainda mais tocante a dignidade com que, de mão no peito, foram saudar os adeptos, como quem pede desculpas por não ter conseguido ir mais longe. Os aplausos recebidos provam que não era preciso.

A FRASE

«Falei com os meus colegas da Juventus. Aconselharam-me a levar capacete para o jogo se for titular»

(Alvaro Morata, ponta de lança da seleção espanhola, referindo-se à luta com Buffon, Barzagli, Bonucci e Chiellini no Espanha-Itália desta segunda-feira)