A tágide de Diego Maradona chama-se Ricardo Bochini. Suprema inspiração de D10S, alvo da mais pura devoção da meninice do Pelusa. «Só tenho um ídolo. É o Bocha, o número dez do meu Independiente», vincou o imberbe Dieguito, numa das suas primeiras entrevistas.

O que é ser o ídolo do maior dos maiores? Como é impregnar de pueril inveja o futebol daquele que tudo tem? «É como se os Beatles amassem a música dos Los Piojos [banda rock da Argentina]. Não faz grande sentido para mim», desabafa Bochini, envergonhado, ao Maisfutebol.

Mas faz. Faz todo o sentido. Maradona era hincha do Independiente e Ricardo Bochini o grande símbolo do clube. Mais de 700 jogos, centenas de golos, classe a transbordar por todos os poros. A recompensa chegou em 1986.

«Sei que joguei seis minutos no Mundial do México porque o Maradona assim o exigiu», confessa. «Merecia ter ido ao Campeonato do Mundo de 1978 e não fui. Em 1982 lesionei-me à última da hora. Em 86 tinha 32 anos e as pernas cansadas. O Maradona convenceu o Carlos Bilardo a convocar-me.»

A mais bela das homenagens. Maradona resolveu o jogo frente à Bélgica [2-0, com golos do diez] e na fase de descompressão exigiu a entrada de Bochini. «Saiu o Burruchaga, outro craque. Pisei a relva e o Diego veio a correr para mim. Faça o favor Maestro, a bola é sua

Foi o único jogo oficial que fizeram juntos: seis minutos para a História.

1979, um certo jantar em Buenos Aires

Diego Maradona teve de esperar até 1979 para conhecer Ricardo Bochini. O encontro foi arranjado por Hugo Saggiorato, um amigo comum. «Sinto um grande orgulho nisto. O Hugo veio ter comigo e disse-me que o Maradona era meu fã e queria jantar comigo», recorda.

«Nessa altura ele já era reconhecidamente um fenómeno. Combinámos ir a um restaurante da moda em Buenos Aires. Cheguei primeiro, esperei, esperei e comecei a pensar que ele não vinha. Levantei-me e percebi tudo. O Diego estava à porta a dar autógrafos há mais de meia-hora.»

Maradona chegou à mesa e beijou a mão de Bochini. D10S também venera. «Falámos sobre futebol, sobre a minha carreira, sobre a vida difícil na Villa Fiorito. Percebi que o Dieguito tem um coração enorme, apaixonado, por vezes demasiado apaixonado.»

A cópia perfeita e um casamento «de loucos»

O melhor golo de sempre pode ser, afinal, uma cópia. Uma cópia perfeita e ampliada, é certo. Mas uma cópia. Antes de Maradona destroçar meia-Inglaterra no Mundial de 1986, já Ricardo Bochini fizera o mesmo ao Peñarol.

«São dois golos semelhantes. Na Libertadores de 1976 fintei seis ou sete uruguaios. Creio que arranquei ainda mais de trás do que o Diego», relembra Bochini, antes de finalizar a conversa com uma história deliciosa. Uma história de alguém que é ídolo do maior dos maiores.

«Fui ao casamento da filha de um dirigente do Independiente. A cerimónia foi numa quinta e puseram o altar numa zona relvada. Cheguei atrasado, sem chamar a atenção, mas o padre viu-me. Interrompeu o seu monólogo, pediu desculpa aos noivos e gritou: acaba de chegar o melhor jogador que vi em toda a minha vida. Um aplauso para o senhor Ricardo Bochini. Não sabia onde me meter. Foi de loucos.»

Música da claque do Independiente:

«Não se chama Maradona,
não é Di Stéfano nem Pelé.
É o Maestro Bochini, o melhor número 10»