Duas manchas, duas enormes manchas no currículo de Rui Patrício. Os dois erros graves cometidos no espaço de um mês pelo guarda-redes (com Israel e com o Benfica) causam alguma apreensão, agora que a Seleção se prepara para o decisivo duelo com a Suécia. É importante saber como o jogador pode lidar com este tipo de pressão perante a adversidade quando não existe mais nenhum jogo para curar feridas.

«Estamos a falar de um atleta que possui um conjunto de ferramentas e um nível elevado de capacidades psicológicas para a performance. Aquilo que distingue a nata dos atletas dos restantes não é o não errar, mas a forma como lidam com o erro em competição», começou por referir a psicóloga da performance Ana Bispo Ramires.

Na sua opinião, Rui Patrício apresentou «uma postura fortíssima» após o erro cometido no jogo com o Benfica. Com grande experiência no trabalho junto de futebolistas de alta competição, tanto no Benfica como na Seleção, a especialista faz essa observação através de «indicadores não verbais».

«Vi que reagiu positivamente, pois teve a possibilidade de ter duas ou três situações para corresponder. Não o vi vacilar, não o vi nervoso», frisou, destacando as defesas feitas por Rui Patrício após o golo caricato apontado por Luisão.

Ana Ramires também elogia a postura do treinador Leonardo Jardim, assumindo que o erro tem de ser assumido por todos. «A avaliação realizada foi a mais correta possível. É uma situação que termina ali. Se estivermos a falar de erros temos sempre de olhar para o coletivo. É uma ação de todos, pois toda a equipa participa no processo», refere, tentando desmontar certos mitos: «Olhar para o futebol de forma segmentário já não acrescenta nada. A equipa toda marcou três golos, a equipa toda sofreu quatro golos».

Para a psicóloga da performance não há dúvida que «ocorrem milhares de erros ao longo de um jogo de futebol» e «situações destas vão acontecer sempre». No entanto, como se tratou de um «jogo de caraterísticas atípicas em termos emocionais, é normal que aconteçam situações destes». A juntar a estes níveis elevados de intensidade está o pormenor de outros terem errado para que a bola chegasse à cabeça de Luisão, o que acentua a ideia de que o erro deve ser partilhado, tal como acontece com o sucesso.

Nani corrobora esta ideia e até recorda os erros de Van der Saar no Manchester United: «Rui Patrício tem experiência para lidar com estas situações. Joguei com o Van der Sar, e ele teve lances iguais se não piores do que este. Sei que o importante é estar tranquilo e ele saber que é o número 1 e tem a nossa confiança.»

Necessidade de auto-regulação

Mas não existe só o jogo e a reação à adversidade dentro de campo. Surgem as reações no dia seguinte, as primeiras páginas nos jornais, as imagens na televisão ou brincadeiras nas redes sociais, como colocar o momento do golo ilustrado com o tema «Capitão Romance», dos Ornatos Violeta.



«Nem todos reagem da mesma forma. No enquadramento dos Jogos Olímpicos, por exemeplo, a seleção norte-americana fecha toda a informação em estágio e ficam completamente em laboratório», conta a especialista, acrescentando: «Estes atletas chegam ao que chegam depois de lidarem com a adversidade. Há atletas que não olham para os jornais, mas, por outro lado, há quem vá buscar força nas notícias. De qualquer forma, normalmente lidam muitissimo bem com o erro e consideram que essas situações são fonte de aprendizagem».

No caso dos guarda-redes, há um trabalho específico a ser feito, dados os longos períodos de tempo em que não têm intervenção direta no jogo. «Os guarda-redes têm de trabalhar a sua concentração, auto-regulação em períodos de jogo. Têm determinadas caraterísticas, pelo que é muito importante que a auto-concentração seja muito bem trabalhada», explica Ana Ramires.

Recorde o golo de Rui Patrício com Israel, que custou o empate à Seleção: