[artigo original publicado no dia 23 de novembro de 2017)

Por: Daniel Dantas

Domingo à tarde é uma rubrica do Maisfutebol, que olha para o futebol português para lá da liga e das primeiras páginas. Do Campeonato de Portugal aos Distritais, da Taça de Portugal aos campeonatos regionais, história de vida e futebol.

Sancidino Malam da Silva foi formado exclusivamente no Benfica. Nunca envergou a camisola do conjunto principal dos encarnados, mas foi no Seixal que se estreou como sénior. Apesar de alguma intermitência e de um trajeto algo atribulado, rubricou um contrato com o Arouca que lhe valeu a conquista de um objetivo: atuar no principal escalão do futebol português. Mas essa experiência acabou já no decorrer desta época e o luso-guineense encontra-se atualmente desempregado, a trabalhar para preparar o regresso às quatro linhas, numa encruzilhada aos 23 anos.

Aliciado por um projeto estável e pela possibilidade de disputar a Liga Europa, Sancidino desvinculou-se de uma duradoura relação com as águias e rumou ao sossego de Arouca na temporada 2015/2016. «Queria jogar numa liga superior e mais competitiva. Lá tinha oportunidade de disputar a I Liga e ter a experiência da Liga Europa», começou por contar.

«Estou a tentar fazer as coisas que não fiz»

O atleta foi, porém, escassamente utilizado pelos técnicos Lito Vidigal, Manuel Machado e Jorge Leitão, naquela que foi a primeira temporada ao serviço dos arouquenses. «Para ser sincero, neste momento não tenho condições para falar daquilo que se passou no Arouca. O que se passou lá ficou lá. Neste momento estou desempregado. Tenho a experiência do passado e estou a mudá-lo para que as coisas melhorem. Estou a tentar fazer as coisas que não fiz», afirmou.

O Arouca partiu para a última jornada da época transata como o mais desafogado entre os aflitos com as contas da manutenção. Contudo, uma sequência de resultados, entre os quais as vitórias de Moreirense e Tondela, sentenciou a descida de divisão do clube. «Nenhum jogador gosta de ter no currículo uma descida de divisão. Quando a equipa desceu fiquei muito triste, por mim, pelos meus colegas, pela direção e por toda a gente. Acho que não merecíamos descer de divisão. Agora estão a lutar para estarem no lugar que merecem e desejo toda a sorte do mundo para que atinjam o objetivo da subida», referiu.

No início da presente temporada, a 8 de setembro, após cumprir unicamente três encontros divididos entre a II Liga e a Taça da Liga, com Jorge Costa como timoneiro, Sancidino rescindiu amigavelmente o contrato com o Arouca e ficou sem clube. Ainda assim, reconhece que a passagem pelo emblema da Serra da Freita foi positiva. «Foi boa, a única experiência que tive fora de Lisboa. Tive a minha primeira experiência na I Liga. Não tive oportunidade de jogar a Liga Europa, mas estive perto. Não saí a mal do Arouca: acertamos tudo e foi só. Desejo ao Arouca muitas felicidades», admitiu.

«Sei que deveria estar lá em cima e não estou»

Apesar de o seu nome ter estado recorrentemente nas bocas do mundo, e nem sempre pelos melhores motivos, o extremo fez questão de clarificar a má reputação que possui: «Acredito que não tenho um nome muito famoso no futebol, mas as pessoas que conheço têm uma opinião totalmente diferente. Muita gente pensa que bebo, quando saio à noite. Quem me conhece sabe que não o faço, porque sou seguidor da religião da minha mãe, que é muçulmana. Também não fumo. Quem não me conhece diz até que durmo tarde e tenho um estilo de vida que não é adequado para um jogador. Houve muitas coisas que tenho evitado, que atrasaram a minha carreira, e, no futuro, não vão acontecer, seguramente. Sei que deveria estar lá em cima no futebol e não estou», esclareceu.

«Estou a trabalhar com o melhor personal trainer de Portugal, que colabora com jogadores da Seleção Nacional, e um dia, quando voltar, toda a gente vai saber disso. Sei que tenho qualidade, mas ter qualidade não chega. Tenho de mudar para chegar ao nível mais alto do mundo do futebol. As coisas que aconteceram no passado não podem voltar a acontecer no futuro», prosseguiu.

Sancidino garante que, nos dias correntes, é uma pessoa inteiramente diferente. «Desde que tenho as pessoas que estão a trabalhar comigo, estou empenhado nesse sentido. Sempre estive disponível, mas faltou-me o acompanhamento, algo que agora já tenho», sublinhou.

A rotina do jogador centra-se, fundamentalmente, no treino e descanso. Consequentemente, não lhe sobra qualquer tempo para distrações. «Treino de segunda a sexta-feira. Acordo de manhã, tomo o pequeno-almoço que me recomendam e vou treinar com o meu personal trainer, por volta das 11h/11h30. Depois, vou para casa, tomo banho, vejo as minhas séries preferidas e volto a descansar. Tento trabalhar ao máximo para também descansar ao máximo. Sem descanso não consigo fazer o trabalho que tenho vindo a fazer até agora. Tenho um nutricionista à parte, também, que fez um plano para gerir a minha alimentação durante o dia. À sexta-feira ou ao sábado vou, por vezes, jantar com os meus pais. Se tiver treino no dia seguinte, por volta da meia-noite ou uma da manhã tenho de estar em casa – é o máximo de tempo que posso estar na rua», contou.

Sem competir há vários meses, espera concretizar a promessa de voltar brevemente aos relvados ainda nesta época. O jogador quer fazê-lo, porém, no timing apropriado. «Como estou parado há cerca de três meses, julgo que não estou preparado para aceitar um novo desafio neste momento. No entanto, no final de novembro, já deverei estar. Quando eu e as pessoas que estão a trabalhar comigo sentirem que estou realmente preparado, vou abraçar um desafio e demonstrar que estou realmente focado. Quero provar que posso triunfar no futebol e que o que falam não é aquilo que parece.»

Sancidino diz que diversos emblemas nacionais e europeus manifestaram o interesse em contar com os seus serviços: «Tenho várias sondagens. Já fui informado de alguns clubes, tanto aqui em Portugal como no estrangeiro. Não quero fazer as coisas de forma precipitada.»

«Quero jogar, estar no campo e marcar golos. Sinto falta disso.»

Apesar de, neste momento, estar arredado das competições, não acusa qualquer frustração ou descontentamento por não estar no ativo. «Sinto-me bem. As pessoas podem até pensar 'ah, ele saiu e não recebeu propostas', mas isso é tudo mentira. Tive ofertas e ainda continuo a receber, mas, por enquanto, estou tranquilo. Não estou frustrado por ainda não estar a jogar. Claro que qualquer jogador quer estar a competir. Quero jogar, estar no campo e marcar golos. Sinto falta disso. Tudo leva tempo», disse.

À procura de uma rampa de lançamento para reencontrar a estrada do sucesso, reconhece que é merecedor dos grandes palcos do futebol. «O objetivo de todos os jogadores é chegar aos melhores clubes do mundo. Quando vejo colegas que jogaram comigo num patamar acima… Há uns anos, quando estava no Benfica, achava que poderia estar lá. Pela qualidade que tenho, creio que mereço estar lá. Ainda vou a tempo e, se fizer as coisas corretamente, chegarei lá no futuro, com certeza. Não posso estar a falar da boca para fora, se nada fizer dentro de campo. Quero fazer tudo passo a passo, até porque nunca sabemos o que pode acontecer amanhã», referiu.

Atuar com a camisola das quinas é, igualmente, um marco que pretende alcançar até ao fim da carreira. «Tenho visto a seleção, tanto nos sub-21 como na equipa A, e dá-me sempre aquela vontade de estar lá… No futuro quero trabalhar para estar presente», revelou.