* POR ANDRÉ CRUZ
Foi há 19 anos que nasceu o Benfica Campus. O centro de treinos dos encarnados foi inaugurado a 22 de setembro de 2006 e significou uma mudança na política do clube quanto à aposta na formação. João Félix, Rúben Dias ou João Neves são alguns dos nomes que renderam tanto desportivamente como financeiramente, mas há outros que fizeram apenas um jogo e caíram no esquecimento: casos de Branimir Kalaica ou Clésio Baúque, por exemplo. Existem, ainda, histórias de quem teve de sair do clube para anos mais tarde se estrear na equipa principal e algumas promessas que só mostraram potencial no estrangeiro. E o primeiro produto «made in Seixal»!? Ainda se lembra? Foi Miguel Vítor. No total, foram 66* os jogadores que se estrearam na equipa principal, mas será que os encarnados estão a desvalorizar a aposta na formação nos anos recentes?
*apenas contabilizados jogadores com, pelo menos, uma época de sub-19
JOSÉ ANTONIO CAMACHO: 3 JOGADORES
Miguel Vítor, Romeu Ribeiro e Yu Dabao.
JORGE JESUS: 16
Roderick, Luís Martins, David Simão, Nelson Oliveira, André Gomes, Lindelof, Bernardo, Cancelo, Hélder Costa, Ivan Cavaleiro, João Teixeira, Gonçalo Guedes, João Ferreira, Tiago Araújo, Paulo Bernardo e Tomás Araújo.
RUI VITÓRIA: 17
Ederson, Nuno Santos, Clésio, Renato Sanches, André Horta, José Gomes, Pedro Pereira, Kalaica, Yuri Ribeiro, Rúben Dias, Bruno Varela, João Carvalho, Diogo Gonçalves, Gedson Fernandes, João Félix, Alfa Semedo e Jota.
BRUNO LAGE: 17
Ferro, Florentino, Morato, Tiago Dantas, Nuno Tavares, Tomás Tavares, Zlobin, David Tavares, Gerson Sousa, Bajrami, Leandro Santos, Nuno Félix, Diogo Prioste, João Veloso, Hugo Félix, André Gomes e Joshua Wynder.
NELSON VERÍSSIMO: 6
Gonçalo Ramos, Tiago Gouveia, Henrique Araújo, Diego Moreira, Sandro Cruz e Martim Neto.
ROGER SCHMIDT: 7
Cher Ndour, João Neves, António Silva, Samuel Soares, Gustavo Varela, Diogo Spencer e João Rego.
2007/08
Miguel Vítor: foi o primeiro «made in Seixal» a estrear-se. Lançado por Jose Antonio Camacho a 25 de agosto de 2007, como titular, num empate a zero na Luz diante do V. Guimarães. O central, internacional por Israel, fez quatro jogos na primeira metade da época, antes de seguir por empréstimo para o Desp. Aves. Na temporada seguinte, fez 23 jogos pelo Benfica – o máximo nos encarnados. No total, foram 45 partidas ao serviço da equipa principal do Benfica, com 3135 minutos, distribuídos por cinco épocas.
Romeu Ribeiro: 6 jogos.
Yu Dabao: 3 jogos.
2009/10
Roderick Miranda: mais de dois anos depois das estreias de Romeu Ribeiro e Yu Dabao (26 de setembro de 2007), voltou a haver um produto do Seixal com minutos. Roderick foi totalista diante do AEK para a Liga Europa (vitória por 2-1 na Luz), a 17 de dezembro de 2009. Seguiu-se apenas mais um jogo nessa época e o central nunca se afirmou na equipa.
2011/12
Novamente um interregno de quase dois anos, até que Nélson Oliveira e David Simão jogaram pela primeira vez na equipa principal. O avançado jogou 45 minutos e o médio participou em 56, num jogo da Taça com o Portimonense. David Simão já tinha rodado por empréstimo noutros clubes antes da estreia na equipa A do Benfica.
Já no início de novembro, Jesus lançou Luís Martins a titular numa partida da Champions, com o Basileia.
Dos três, Nélson Oliveira foi quem teve mais sucesso.
David Simão: 2 jogos.
Luís Martins: 5 jogos.
Nélson Oliveira: 22 jogos.
2012/13
Seguiram-se nomes com mais influência na equipa. Em outubro de 2012, André Gomes fez o primeiro jogo na equipa principal e até marcou na estreia, diante do Freamunde. O médio totalizou 18 partidas nessa temporada e ainda fez 23 na seguinte.
2013/14
O Benfica tinha sido campeão de juniores na temporada anterior e havia vários jovens à porta da equipa principal. Bernardo Silva foi o primeiro a estrear-se, em outubro de 2013, num encontro da Taça com o Cinfães. Nesse mesmo jogo, também Victor Lindelof e Ivan Cavaleiro se estrearam pelos encarnados, pelas mãos de Jorge Jesus. Bernardo só jogou dez minutos, enquanto os outros dois foram titulares.
Ainda nessa época, João Cancelo e Hélder Costa receberam a primeira oportunidade na equipa A, em janeiro de 2014, na Taça da Liga, com o Gil Vicente.
Foi a época em que os miúdos foram rotulados com um preço de 15 milhões de euros: aconteceu a Bernardo e a Cancelo.
Bernardo Silva: 3 jogos.
Hélder Costa: 1 jogo.
Ivan Cavaleiro: 20 jogos.
João Cancelo: 2 jogos.
Victor Lindelof: 2 jogos.
2014/15
Gonçalo Guedes e João Teixeira foram os últimos jogadores a serem estreados na equipa principal do Benfica na primeira passagem de Jorge Jesus pelas águias. O extremo foi lançado em outubro de 2012, enquanto o médio surgiu na equipa A em dezembro. Guedes viria a ter mais sucesso nas épocas seguintes, antes da transferência para o PSG. João Teixeira voltou a ter outra oportunidade na temporada seguinte, mas acabou por ser emprestado.
Gonçalo Guedes: 9 jogos.
João Teixeira: 1 jogo.
2015/16
Com a chegada de Rui Vitória ao Benfica, perspetivava-se uma mudança de paradigma com a aposta reforçada na formação. E assim aconteceu. O número de jogadores formados no Seixal com oportunidades na equipa principal subiu, mas foi na quantidade de jogos que residiu a principal diferença.
Ainda assim os dois primeiros miúdos lançados por Vitória nos encarnados não tiveram muito sucesso na equipa. Nuno Santos foi logo o primeiro e seguiu-se Clésio Baúque. O mesmo não se pode dizer de Renato Sanches, que se estreou em outubro de 2015 e não só agarrou um lugar a titular como foi figura no Europeu dessa época e ainda saltou para o Bayern.
Outro nome de sucesso indiscutível é o de Ederson. Voltou nesse ano ao clube e aproveitou a lesão de Júlio César para se estrear, logo em Alvalade, no célebre dérbi do falhanço de Bryan Ruiz. A partir daí, foi dono e senhor da baliza encarnada – e reforçou o estatuto na época seguinte.
Clésio Baúque: 1 jogo.
Ederson: 18 jogos.
Nuno Santos: 2 jogos.
Renato Sanches: 35 jogos.
2016/17
A segunda temporada de Rui Vitória no Benfica teve menor percentagem de sucesso no que diz respeito à aposta nos produtos do Seixal. Com 16 jogos, André Horta foi o que mais se destacou entre cinco atletas que se estrearam na equipa principal – ele que saiu da formação ainda sub-17 e tinha voltado à Luz.
André Horta: 16 jogos.
Branimir Kalaica: 1 jogo.
Pedro Pereira: 1 jogo.
Yuri Ribeiro: 2 jogos.
Zé Gomes: 5 jogos
2017/18
Um dos grandes problemas do Benfica na célebre época do pentacampeonato falhado esteve na baliza. Sem Ederson nem Júlio César, Bruno Varela foi o dono da baliza, em época de estreia na equipa principal. O cabo-verdiano tinha vindo do V. Setúbal e, antes, esteve cedido ao Valladolid. Fez 25 jogos, mas nunca foi indiscutível e até foi um dos mais criticados.
Esta temporada, porém, traz um dos melhores exemplos do Seixal. Aos 21 anos e já depois de duas épocas de equipa B, Rúben Dias estreia-se em setembro de 2017 no Bessa, dadas as ausências de Jardel e Lisandro López. Seguiram-se mais 29 partidas nessa época e mais de uma centena nas outras duas temporadas seguintes, antes da mudança para o Manchester City.
Bruno Varela: 25 jogos.
Diogo Gonçalves: 13 jogos.
João Carvalho: 10 jogos.
Rúben Dias: 30 jogos.
2018/19
A reconquista do campeonato nacional deu-se com a entrada de Bruno Lage no comando da equipa e uma segunda volta que fica na memória. Ainda assim, nomes como Gedson, João Félix ou Jota já tinham sido lançados por Rui Vitória. Ferro e Florentino, no entanto, foram estreados por Lage e revelaram-se fulcrais na conquista do título.
Nesta temporada, Gedson foi o estreante com mais jogos (46), seguindo-se Félix (43). Ferro teve mais preponderância na época seguinte.
O grande nome da temporada, ainda assim, foi João Félix, que ainda detém o estatuto de maior venda do clube encarnado.
Alfa Semedo: 16 jogos.
Ferro: 18 jogos.
Florentino: 14 jogos.
Gedson: 46 jogos.
João Félix: 43 jogos.
Jota: seis jogos.
2019/20
Apesar do bom arranque de temporada, o Benfica falhou a conquista do bicampeonato em 2019/20 e Bruno Lage foi substituído por Nélson Veríssimo a meio da época. Lage estreou vários jovens nesta temporada, embora nenhum deles conseguisse ter o sucesso de João Félix, nem lá perto.
Entre os estreantes, o maior destaque até vai para Gonçalo Ramos, que se estreou sob o comando de Veríssimo e bisou no único jogo que fez. Depois, seguiram-se épocas com mais de 40 jogos na equipa principal.
David Tavares: 2 jogos.
Gonçalo Ramos: 1 jogo.
Ivan Zlobin: 7 jogos.
Morato: 1 jogo.
Nuno Tavares: 16 jogos.
Tiago Dantas: 1 jogo.
Tomás Tavares: 26 jogos.
2020/21
O regresso de Jorge Jesus foi marcado por um forte investimento no mercado de verão e pouca aposta na prata da casa. João Ferreira e Tiago Araújo foram os únicos com o rótulo «made in Seixal» lançados por Jesus e nenhum teve um papel relevante na equipa.
João Ferreira: 5 jogos.
Tiago Araújo: 1 jogo.
2021/22
Jorge Jesus continuou no Benfica e voltou a demonstrar pouca confiança nos jovens. Ainda assim, Paulo Bernardo até nem tem razão de queixa: fez a estreia na equipa principal e acumulou 24 jogos no total. Antes de ser despedido, Jesus ainda deu oportunidade a Tomás Araújo, que somou quatro partidas nessa época, antes do empréstimo ao Gil Vicente.
Já com Nélson Veríssimo na equipa principal, alguns jovens que venceram a Youth League tiveram um prémio e fizeram a estreia na Liga.
Diego Moreira: 1 jogo.
Sandro Cruz: 2 jogos.
Henrique Araújo: 6 jogos.
Martim Neto: 1 jogo.
Paulo Bernardo: 24 jogos.
Tiago Gouveia: 2 jogos.
Tomás Araújo: 4 jogos.
2022/23
Houve duas grandes apostas de Roger Schmidt no Benfica: António Silva e João Neves. O primeiro aproveitou a onda de lesões na defesa e, depois de uma pré-época em que encantou, foi titular indiscutível ao lado de Otamendi, contribuindo para o título de campeão. Já Neves, ainda passou por juniores, sub-23 e equipa B, antes da estreia na equipa principal. Ao todo, fez duas dezenas de jogos, sobretudo após a saída de Enzo Fernández. A época de afirmação veio a seguir, com 55 partidas e a transferência para o PSG.
António Silva: 44 jogos.
Cher Ndour: 1 jogo.
João Neves: 20 jogos.
Samuel Soares: 1 jogo.
2023/24
Roger Schmidt deu continuidade às apostas que tinha feito na época anterior, mas, em 2023/24, foi comedido na visão sobre o Seixal. Spencer, João Rego e Gustavo Varela estrearam-se, mas só fizeram um jogo.
Diogo Spencer: 1 jogo.
Gustavo Varela: 1 jogo.
João Rego: 1 jogo.
2024/25
Bruno Lage regressou ao Benfica logo no arranque da temporada 2024/25 e estreou vários miúdos. De resto, esta foi a época em que mais jogadores «made in Seixal» se estraram pela equipa principal – nove. No entanto, nenhum deles teve um papel relevante na equipa e quatro já saíram para outros clubes. O mais «sortudo» foi Bajrami, que ainda alinhou em seis partidas.
André Gomes: 1 jogo.
Bajrami: 6 jogos.
Diogo Prioste: 1 jogo.
Gerson Sousa: 1 jogo.
Hugo Félix: 1 jogo.
João Veloso: 2 jogos.
Joshua Wynder: 1 jogo.
Leandro Santos: 5 jogos.
Nuno Félix: 3 jogos.
João Félix continua no topo das maiores vendas «made in Seixal», com Gonçalo Ramos e João Neves, ambos para o PSG, a serem dos maiores e mais recentes encaixes de produtos da formação encarnada. Rui Vitória, Bruno Lage e Roger Schmidt foram os treinadores com quem os jogadores do top-10 de vendas mais jogaram.
João Félix – Atlético de Madrid: 126 milhões de euros (ME)
- Treinador com quem fez mais jogos: Bruno Lage, 29.
2. Rúben Dias – Manchester City: 68 ME (mais 3,6 ME em variáveis)
- Treinador com quem fez mais jogos: Bruno Lage: 70.
3. Gonçalo Ramos – PSG: 65 ME (mais 15 ME em variáveis)
- Treinador com quem fez mais jogos: Roger Schmidt: 47
4. João Neves – PSG: 59,921 ME (mais 9,987 ME em variáveis)
- Treinador com quem fez mais jogos: Roger Schmidt: 55.
5. Ederson – Manchester City: 40 ME
- Treinador com quem fez mais jogos: Rui Vitória: 58.
6. Lindelöf – Manchester United: 35 ME (mais 10ME em variáveis)
- Treinador com quem fez mais jogos: Rui Vitória: 70.
7. Renato Sanches – Bayern Munique: 35 ME (mais 10 ME em variáveis)
- Treinador com quem fez mais jogos: Rui Vitória: 35.
8. Gonçalo Guedes – PSG: 30 ME (mais 7ME em variáveis)
- Treinador com quem fez mais jogos: Rui Vitória: 59.
9. Gedson Fernandes – Besiktas: 20,5 ME**
- Treinador com quem fez mais jogos: Bruno Lage, 32.
10. Bernardo Silva – Mónaco: 15.75 ME
- Treinador com quem fez mais jogos: Jorge Jesus: 3.
NOTA: valores que incluem comissões/encargos com serviços de intermediação/custos financeiros associados às operações de transferência (como no caso dos 6ME do negócio por João Félix, que por isso valeu 120ME ao Benfica). Valores em variáveis e mecanismo de solidariedade entretanto ganhos pelo Benfica não estão exatamente apurados, desconhecendo-se em vários casos as variáveis que estavam em questão.
**4,5 ME pelo empréstimo ao Tottenham, mais 6ME da venda ao Besiktas em 2022, mais 10ME do Besiktas pelos restantes 50 por cento do passe este ano, antes de rumar ao Spartak.
A última época foi aquela em que o Benfica apostou num maior número de jogadores, mas sem que qualquer um tivesse preponderância na equipa. De resto, desde as apostas em António Silva e João Neves, ainda com Roger Schmidt, que o Benfica não tem conseguido subir à equipa principal um nome que agarre um lugar no onze.
Financeiramente, o panorama é o mesmo. João Neves rendeu 65 milhões de euros aos cofres das águias e, ao dia de hoje, apenas António Silva ou Tomás Araújo são «garantia» de alguns milhões numa eventual transferência. Mesmo em épocas em que a aposta na formação era praticamente nula, houve grandes lucros com transferências (Bernardo Silva e João Cancelo, por exemplo). Desde o «aparecimento» de Neves e Silva na equipa principal, há cerca de três anos, já se estrearam 12 (!) jovens, nenhum com perspetiva de rendimento desportivo ou retorno financeiro assinalável a curto-médio prazo.
«Tenho uma receita para ganhar a Liga dos Campeões. (...) Criando um mecanismo de aumento e potenciação do long term player development, que já existe no Benfica, afinado para este tipo de jogadores com potencial elevado, colocando-os noutro tipo de contexto, que poderá pôr em causa alguns resultados desportivos, admito, mas que os prepara de outra forma para conseguirem chegar à equipa A no patamar desejado. Depois seria necessário introduzir algumas alterações metodológicas, sempre com um treinador assente neste tipo de crença e obviamente com a capacidade económica para reter alguns anos estes jogadores.»
Estas são palavras de Rodrigo Magalhães, antigo diretor técnico da formação do Benfica, em entrevista ao Maisfutebol. Os encarnados vivem um período conturbado e que pode interferir no desenvolvimento dos jovens. A necessidade de vencer em ano de eleições e a mudança no projeto com a entrada de Mourinho projeta um novo capítulo na aposta da formação. Na Vila das Aves, o Benfica teve seis jogadores da formação na ficha de jogo. Só António Silva foi titular, mas, por exemplo, Rego somou os primeiros minutos da época. Ainda persistem dúvidas quanto ao plano que o novo treinador e o clube têm para o resto da época, mas, salvo uma rara «ascensão meteórica», ainda não será em 2025/26 que os encarnados vão ver nascer um novo João Neves.
A equipa B sofreu uma renovação completa esta temporada e há vários jovens com futuro promissor - Gonçalo Moreira, Tiago Freitas, Francisco Silva, Francisco Neto, Daniel Banjaqui e Rafael Quintas são alguns nomes que em breve podem ser chamados à equipa principal.
Este é um dos desafios para Mourinho. O Benfica, desde 2011/12, nunca passou uma temporada sem estrear um jovem na equipa principal. Estará o «special one» disposto a apostar verdadeiramente na prata do Seixal?