O termo “Neymardependência” tem sido muito usado pela imprensa brasileira na última década e em particular depois das eliminações nos últimos Mundiais. Mas a emergência de uma nova geração de avançados tem ajudado a fazer esquecer a expressão. Agora, Tite tem uma nova vaga de jovens avançados talentosos.
«Na Copa América de 2019 não tínhamos Antony, Raphinha; o Vini ainda se estava a adaptar ao Real Madrid e o Gabriel Martinelli só estava a treinar connosco», disse Tite em outubro. «Agora esta geração chegou, e UAU! Foi a evolução destes jogadores que nos permitiu jogar com cinco atacantes ao mesmo tempo.»
No início do ano passado, por exemplo, Tite não estava atento a Raphinha, mas a sua equipa de observação alertou-o para o então extremo do Leeds que se prepara para para ser titular no Qatar. Além disso, jogadores como Richarlison e Lucas Paquetá estão prontos para o seu primeiro Mundial, e é claro que Tite tem muitas opções.
Havendo um ar de juventude no ataque, a defesa traz experiência e segurança. Na baliza há Allison a jogar o seu segundo Mundial como titular e, na defesa, Thiago Silva pode-se tornar no jogador de campo mais velho pelo Brasil num Mundial. A âncora do meio-campo é Casemiro, que apareceu tarde e já com 30 anos, mas já conta com mais de 60 internacionalizações. A importância dele para os «canarinhos» não pode ser ignorada e é relevante lembrar que foram eliminados no Mundial 2018 pela Bélgica quando o médio estava castigado.
Neymar ainda lá está – obviamente – e é a estrela indiscutível da equipa, mas a diferença desta vez é que as luzes da ribalta não serão todas nele. A divisão de responsabilidades pode ajudar o Brasil na busca do hexa.
Tite foi contratado como bombeiro em 2016, quando o Brasil estava num impensável sexto lugar na qualificação sul-americana para o Rússia 2018. Sete vitórias consecutivas depois, foram o primeiro país a qualificar-se para a competição. «Toda a minha carreira estava dependente daquela oportunidade», disse numa entrevista recente. O técnico de 61 anos esperou muito tempo por essa chance, sendo treinador desde o início dos anos 90 (e do Corinthians por três vezes). Desta vez o treinador calmo e profissional entra no Mundial com mais experiência e tempo para trabalhar com os jogadores. Espera ir mais longe do que em 2018. «O processo dá-nos segurança e confiança», diz, mas acrescenta, «mas se isso fará de nós campeões, é outra história.»
Será o terceiro Mundial para Neymar e tem assuntos inacabados no maior dos palcos. No Mundial em casa lesionou-se frente à Colômbia e falhou a humilhante goleada frente à Alemanha por 7-1. E na Rússia, há quatro anos, jogou bem, mas as suas prestações foram ofuscadas por vídeos dele a rebolar no relvado depois de sofrer faltas. Fez dele uma piada. Parece que o avançado do PSG cresceu desde aí e está faminto por poder mostrar que é, no relvado, o líder desta geração. A não ser que mude de ideias este será o seu último Mundial.
Jogar com a camisola 9 pelo Brasil no Mundial carrega muita expectativa. Há 20 anos, na Coreia e Japão, Ronaldo foi o melhor marcador do Mundial, incluindo um bis na final contra a Alemanha. Desde aí o Brasil não ganhou a competição. Nos últimos Mundiais, o número 9 falhou em corresponder às expectativas (Fred em 2014 e Gabriel Jesus em 2018), mas desta vez há esperança que Richarlison possa estar à altura. Os sinais são positivos para o jogador do Tottenham, que apelidam de «Pombo», e que é o segundo melhor marcador do plantel, apenas atrás de Neymar.
É raro para os jogadores brasileiros falarem de assuntos extrafutebol, especialmente questões políticas. Não marcaram uma posição sobre os problemas no Qatar. A CBF organiza campanhas para combater o racismo e homofobia no Brasil, mas não fez nenhum comunicado oficial em relação ao país anfitrião do Mundial.
Quase um século separa a música e as letras do hino nacional. Por volta de 1830, quando o Brasil ainda não era uma república, o músico Francisco Manuel da Silva compôs a vibrante e triunfante melodia, mas a letra só foi escrita em 1909, quando os versos de Duque Estrada venceram uma competição e a letra foi adicionadas. Tornou-se oficial em 1922 – ano centenário da independência do Brasil. O hino celebra um país de «pessoas heroicas» e uma nação «gigante por natureza», glorificando as suas virtudes naturais.
Quando Pelé se lesionou no segundo jogo do Mundial 1962 no Chile, o homem que ficou conhecido por «o anjo das pernas tortas» assumiu a batuta e levou o Brasil ao seu segundo Mundial. Garrincha, extremo do Botafogo, era a síntese do estilo brasileiro de jogar futebol. Tinha uma abundância de talento e não tinha preocupações, adorava driblar e era, no fundo, uma festa dentro de campo. O Brasil nunca perdeu quando ele e Pelé jogaram juntos. No Mundial 1962 foi o melhor jogador da prova, marcando quatro golos. Infelizmente, as coisas não foram fáceis para ele fora dos relvados, onde teve problemas com o alcoolismo durante a vida adulta. Morreu devido a problemas no fígado aos 49 anos.
Textos de João Pedro Fonseca e Tatiana Furtado que escrevem para O Globo.