A equipa equatoriana foi construída de raiz, depois do desconhecido argentino Gustavo Alfaro chegar para dar estabilidade depois das curtas - e não bem-sucedidas - estadias de Hernán Darío Gómez, Jorge Célico e Jordi Cruyff (que saiu sem ter orientado um único jogo).
A caminhada para o Qatar parecia longa quando Alfaro assumiu o comando, em 2020, mas descartou a velha guarda, incluindo jogadores como Antonio Valencia, Christian Noboa e Felipe Caicedo, para trazer jovens como Piero Hincapié, Moisés Caicedo ou Gonzalo Plata, entre outros.
«Foi tudo na base de cerrar os dentes para o desafio e imprimir a nossa marca no projeto, sem alterar a essência do futebol equatoriano, apresentando simultaneamente novos elementos e tentando reverter a dinâmica que resultou no falhanço para a qualificação do Mundial 2018», explicou à FIFA.
Alfaro não tem receio de mudar a tática, dependendo do adversário, mas o 4-4-2 é a sua formação mais comum, apesar de algumas aproximações ao 4-3-3. Na qualificação utilizou o 3-5-2, mas não repetiu desde então.
Depois da reestruturação de Alfaro, o Equador tornou-se a equipa sul-americana mais jovem a qualificar, com média de idades de aproximadamente 25 anos. Infelizmente alguns jogadores sofreram lesões graves, tal como Roberto Arboleda (São Paulo), que fez uma rotura de ligamentos no tornozelo, em junho, tal como Ayrton Preciado (Santos) e Joao Rojas (Monterrey).
O Equador qualificou-se para o torneio no quarto lugar da zona sul-americana, com dois pontos a mais do que o Peru, que, no play-off intercontinental, perdeu com a Austrália.
Nascido em Rafaela, Santa Fe, Argentina, deixou a carreira de jogador para trás em 1992, para que se pudesse focar nos treinos. 30 anos depois estará no Mundial com o Equador. Ganhou o afeto do povo pela forma como fala e representa a seleção, além da confiança que transmite aos jogadores.
Treinou vários clubes no seu país, como o Boca Juniors, tal como o Al Ahli, na Arábia Saudita. Assumiu a seleção a um mês antes do primeiro jogo de qualificação para o Mundial, no meio da pandemia. «Não foi fácil», admitiu.
Depois de se qualificarem para o Mundial, deixou um discurso entusiasmante: «O desafio era uma parede em branco, na qual podiam pendurar as fotografias a fazer história. Tinham de acreditar, e assim o fizeram. Acreditaram desde o primeiro dia e permaneceram juntos. Foram pacientes, perseverantes, mas também os caçadores desta utopia impossível. Ninguém acreditou em nós, mas hoje o Equador permanece no alto.»
Sem dúvida que a estrela da equipa é Moisés Caicedo – ou, como gosta de ser chamado, ‘Niño Moi’. A estrela do Brighton tornou-se indispensável para a seleção, dando o equilíbrio necessário à estrutura defensiva. Um médio box-to-box, que contribui para o ataque mas ajuda a linha defensiva, fazendo com que o seu treinador, Roberto De Zerbi, o considere «um dos melhores médios da Premier League», acrescentando que «Caicedo é um jogador de topo, com e sem bola». «Há muitos jogadores bons com a bola, mas sem ela, em espaços defensivos, não são tão bons. Com Caicedo não consigo ver nada que não seja a um nível de topo», acrescentou.
Ainda assim, não é a típica estrela. Não vai marcar um pontapé de bicicleta do meio-campo ou deslumbrar adversários com os seus dribles, mas o seu passe eficaz, grande posicionamento e leitura e inteligência de jogo podem ser importantíssimos para as tentativas do Equador em progredir na competição.
Há um jogador que não brilha sempre no jogo – às vezes nem no banco –, mas é imensamente valorizado pelo que faz dentro e fora do campo. Falamos de Ángel Mena, um dos mais experientes da tricolor, cuja inteligência permite à equipa jogar o futebol rápido que o treinador prefere. Canhoto, tem uma grande visão de jogo e um potente remate. Agora com 34 anos, joga nos mexicanos do Club León desde 2019.
Nenhum jogador da seleção equatoriana, membro da equipa técnica ou direção da FEF falaram dos problemas de diretos humanos no Qatar, antes do torneio. E não se irão envolver durante a estadia da equipa no país, também. No futebol equatoriano não existe problema em aceitar as condições culturais existentes no Qatar, e a equipa não participará em qualquer campanha, como a de utilizar uma braçadeira de capitão com as cores do arco-íris. Não houve qualquer comunicado da FEF sobre a posição da tricolor, mas parece claro que os jogadores não se irão envolver no debate.
O hino nacional do Equador, ‘Salve, Oh Patria’, surgiu da mente e talento do poeta Ambateño, Juan León Mera Martínez (1832-1894), e do músico francês Antonio Neumane Marno (1818-1871). Houve algumas mudanças e modificações até ser designado o hino nacional, a 23 de novembro de 1948, pela administração de Galo Plaza Lasso. Faz referência à revolta inicial contra Espanha, a 10 de agosto de 1809, e a subsequente guerra de Indepedência.
É justo dizer que o Equador não teve uma abundância de heróis de culto, mas um jogador que provavelmente merece essa distinção será Iván Kaviedes, o primeiro jogador equatoriano que se mudou para a Europa, e que teve um papel enorme na qualificação para o Mundial 2002, na Coreia do Sul e Japão, ao marcar o golo do empate frente ao Uruguai. Ao nível de clubes, um dos seus destaques foi um pontapé de bicicleta apontado ao Barcelona. O seu registo disciplinar nem sempre foi o melhor e, desde a retirada, admitiu que por vezes deixava-se levar por mulheres – e isso fê-lo perder foco na carreira.
Textos de Stéffano Dueñas, que escreve para o 'Expresso'.