A França parte para o torneio como campeã em título, e com aquele que seria, numa perspetiva inicial, o grupo com maior profundidade de talento por onde escolher.
Didier Deschamps parece optar pela continuidade tática, aderindo ao mesmo 3x4x1x2 que usou no Europeu do último verão, mesmo que a continuidade não seja possível em termos de jogadores.
Os jogos deste ano têm sido decididamente menos impressionantes, com apenas uma vitória nos últimos seis encontros competitivos. A descida de divisão na Liga das Nações foi evitada, mas esta equipa dificilmente está na nota desejada antes do torneio.
Algumas ausências chave podem, contudo, estragar a missão pelo segundo torneio consecutivo. As perdas de Paul Pogba e N’Golo Kanté já faziam com que o meio-campo tivesse de ser completamente mudado em relação ao Europeu. Aurélien Tchouaméni, do Real Madrid, deve fazer parceria com Mattéo Guendouzi e Adrien Rabiot, ou com o seu antigo colega no Mónaco, Youssouf Fofana. Fofana e Guendouzi são as opções mais progressivas, mas Rabiot pode ter vantagem pela sua experiência, mesmo que Deschamps tenha dado confiança aos seus jogadores mais jovens depois da vitória frente à Áustria: «A partir do momento em que convoco jogadores é porque confio neles. Se são escolhidos têm tudo para jogar ao mais alto nível.»
Hugo Lloris, por outro lado, tem 35 anos, mas ainda é um profissional de topo, e deve tornar-se no recordista de presenças pela França, desde que cheguem aos oitavos de final. Na defesa, Kimpembe teve de ser riscado por lesão, e a condição física de Lucas Hernández também levanta dúvidas, o que pode abrir espaço para Benoît Badiashile.
O ataque também não escapou à praga de lesões. Primeiro foi Nkunku a abandonar o estágio por lesão, após um lance aparatoso com Camavinga, e depois surgiu a baixa mais importante, na véspera do arranque do torneio: Karim Benzema não estava em condições de competir.
Mais peso nos ombros de Mbappé?
Ciente do choque de egos e escândalos que envolveram plantéis anteriores, Didier Deschamps colocou sempre a harmonia como prioridade, no momento da convocatória. Apesar do seu estilo pragmático ser descrito como pouco sofisticado, pela imprensa francesa, essa estratégia tem resultado. A jornada da França rumo ao Qatar como campeã mundiais em título, bem como da Liga das Nações, merece bem mais crédito do que tem recebido. Contudo, depois de uma década no cargo, e com o seu contrato a expirar após o torneio, o seu futuro continua incerto, com Zinedine Zidane a posicionar-se para assumir o lugar.
Já não sendo o adolescente sorridente que eletrizou o último Mundial, o torneio de Kylian Mbappé pode ser ainda caracterizado por problemas fora dos relvados. Com o seu sentido de autoimportância a crescer, Mbappé já quererá supostamente sair do PSG - meses depois de assinar um novo contrato -, supostamente infeliz por não ver a equipa jogar à sua maneira. Para além disso, as recentes alegações de Mathias Pogba, de que o seu irmão Paul tentou 'amaldiçoar' Mbappé através de um bruxo, podem dividir o grupo. Refira-se, ainda assim, que os últimos 18 meses mostraram Mbappé a crescer como jogador também, acrescentando uma autoridade imponente às suas exibições, com 39 golos e 26 assistências em 46 jogos, na época passada.
Com muito foco em Karim Benzema e Kylian Mbappé, Antoine Griezmann caiu para plano secundário, nos últimos tempos. Para além disso, a sua forma inconsistente nos clubes, desde que se juntou ao Barcelona, em 2019, eclipsou a sua contínua excelência e importância na seleção francesa. Filho do estilo 'Cholista' do Atlético de Madrid, Griezmann reúne os ideais estóicos de Deschamps, permanecendo como um dos favoritos do treinador. Será um elo fundamental entre o meio-campo e o ataque, depois de seis golos pouco apreciados na fase de qualificação, importantes para uma França em dificuldades.
A França juntou-se a muitos dos países da UEFA, com os seus capitães a usarem a braçadeira arco-íris em apoio à comunidade LGBTQ+, mas um passo mais estrito é a abolição das 'fan zones' durante o torneio. Tradicionalmente, os jogos da França costumam ser transmitidos em ecrãs gigantes por todo o país, mas os presidentes de câmaras, de Paris a Estrasburgo, estão contra essa ideia, com receio que normalize o torneio. Mas enquanto a federação francesa diz que o torneio «trouxe progresso ao Qatar», e contribuiu com um fundo de compensação para os trabalhadores, os jogadores permanecem silenciosos, ao contrário de Toni Kroos ou Leon Goretzka, que criticaram a organização.
Um antigo (o mais antigo?) exemplo de hino ao estilo «marcha europeia». «A Marselhesa» está entre os hinos mais reconhecidos do mundo. Composto em 1792 por Claude Joseph Rouget de Lisle, em Estrasburgo, as suas letras foram encorajamento para os soldados que marcharam de Marselha a Paris, em apoio à defesa da capital, e tornaram-se hino em 1795. Banido sob Napoleão, foi reposto permanentemente no fim do século XIX.
Com 13 golos só no Mundial de 1958, Just Fontaine marcou 30 tentos em apenas 21 internacionalizações pela França, antes da sua retirada precoce, por lesão, em 1962, com apenas 29 anos. O rápido Fontaine juntou-se ao lendário Reims de Albert Battuex em 1956, vindo do Nice. Aí formou parceria com outro dos melhores de sempre, Raymond Kopa. Fontaine ajudou o Reims a chegar à final da Taça dos Campeões Europeus de 1960 e tornou-se elemento-chave para o «jeu à la rémoise», hoje conhecido como «futebol champanhe», a ideia central do futebol em França.
Textos de Adam White e Eric Devin, que escrevem para o Get French Football News.