Em pleno Estádio da Luz, um lateral nigeriano marcou o gol que carimbou o título nacional do FC Porto na temporada passada. Um lance emblemático que rompeu as fronteiras defensivas do rival histórico e poderia muito bem ter sido concluído por um lateral português de São João da Madeira.

Já ali, incomodado com o andar da carruagem, o Benfica resolveu buscar um treinador alemão para liderar um projeto audacioso. Fazer esquecer as cicatrizes deixadas - dentro e fora de campo - por um português da Amadora outrora tão importante no passado recente do clube.

Os encarnados rapidamente começaram por deixar para trás os principais adversários no arranque de 2022/23, entre outros motivos, muito por conta de um talento argentino, que, em menos de seis meses, ajudou a safar as contas com uma venda de 121 milhões de euros.

Sem o jovem sul-americano, sobrou para um norueguês a missão de manter o alto nível no meio-campo. Tem conseguido com distinção, especialmente por ter ao lado um português de origem angolana e outros de Santo Tirso, Forte da Casa, Porto e Olhão.

Mesmo com dez pontos a menos, o atual campeão FC Porto recusa jogar a toalha. Confia que o exigente e vitorioso treinador português de Coimbra vai dar a volta por cima com um goleador e ativista iraniano e dois lusos-brasileiros agora liderados também por um selecionador espanhol.

Não muito distante dos dragões há o surpreendente e bem estruturado SC Braga de um médio líbio arrojado e um atacante e capitão português de Almada - ambos seguros por um goleiro brasileiro com quase dez anos de casa. Uma instituição que, não menos importante, abriu as portas para ucranianos no início da guerra com a Rússia.

De longe, o Sporting deposita as fichas na Liga Europa, tendo derrubado um poderoso do país do Brexit, numa eliminatória onde brilharam dois defensores, um holandês e outro costa-marfinense, e um atacante português de Vidago. Todos muito bem comandados por um promissor treinador português de Vila Franca de Xira.

Feito por nativos e imigrantes para dar (comprar) e vender, o futebol português pode não ser o mais atraente e competitivo da Europa, mas seguramente é dos mais receptíveis e cosmopolitas, justamente como o próprio país em si, que, apesar de conviver com racismo e xenofobia, busca cada vez mais abrir as portas para todos.

Eu, como brasileiro, subscrevo as palavras do sábio cigano português Ricardo Quaresma: «O populismo racista apenas serve para virar homens contra homens em nome de uma ambição pelo poder que a história já provou ser um caminho de perdição para a humanidade».

* Bruno Andrade escreve a sua opinião em Português do Brasil